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Isabel Santiago Henriques / CDS

Isabel Santiago Henriques / CDS

Assunção Cristas. Como se constrói uma líder?

Não se transforma uma deputada ou mesmo uma ex-ministra em líder do CDS-PP do dia para a noite. É preciso uma estratégia e Cristas sabe disso. A nova presidente até já foi ao programa da Júlia.

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O cabelo está aprumado, mas não excessivamente armado. A maquilhagem realça os olhos, mas não é demasiado tentadora. A roupa é elegante e discreta, mas os sapatos pretos, de salto stiletto a rondar os dez centímetros, somam um detalhe ligeiramente provocador. É Assunção Cristas, nos Passos Perdidos da Assembleia da República, em pleno processo de construção da sua imagem como líder. Em dois meses de liderança, a nova presidente do CDS-PP está a atacar as ameaças e a limar as arestas da sua personalidade: criticavam-na por ser autoritária e Cristas esforça-se por ouvir; diziam que não tinha ideias e tem marcado a agenda; é nova no partido e por isso tem procurado aproximar-se do aparelho e do CDS profundo.

Se houve consequências da nova fórmula política de Governo apoiado pela esquerda, esses efeitos colaterais fizeram-se sentir no CDS. Faz esta terça-feira seis meses que a “geringonça” está a funcionar. Por ironia, isso deu uma nova liderança aos democratas-cristãos. Uma sucessora de Paulo Portas não é Paulo Portas. Portanto, a tarefa de Cristas para se construir como líder não é fácil.

Transformar uma militante apenas com nove anos de casa no partido em presidente dos democratas-cristãos obriga Assunção Cristas a ter uma estratégia de poder. Sobretudo num CDS que se habituou a respeitar o mesmo líder, Paulo Portas, durante 16 anos. Não basta impressionar os pares no Parlamento: é também preciso ganhar as distritais e convencê-las de que na sua liderança o partido vai crescer; e manter e conquistar eleitorado.

Assunção Cristas sabe disso. Como é metódica e organizada, tem um plano de ataque aos pontos fundamentais. São quatro os principais desafios da sua liderança. Primeiro, há que agarrar internamente o partido. Segundo, é preciso aproximar o CDS do terreno, em busca de mais militantes e de mais votos. Terceiro: resolver o peso do passado – o CDS participou num Governo que marcou quatro anos de forte austeridade. Em quarto lugar, tem de afirmar a autonomia do partido face ao PSD.

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Assunção Cristas sabia que não era a mesma coisa estar com os militantes antes, ou depois de ter sido eleita. Era preciso cumprimentá-los já com a nova capa vestida, mostrar-se ao mesmo tempo próxima e no controlo do poder.

Quando Assunção Cristas anunciou, logo no congresso de março, que a elegeu como presidente, a criação do Dia do Distrito – uma iniciativa para aproximar a líder do partido aos militantes de base e à sociedade civil — não foi por acaso. Ainda enquanto candidata à liderança dos populares, Cristas até já tinha percorrido Portugal de Norte a Sul. Mas sabia que não era a mesma coisa estar com os militantes antes, ou depois de ter sido eleita. Era preciso cumprimentá-los já com a nova capa vestida, mostrar-se ao mesmo tempo próxima e no controlo do poder.

Foi em Braga que se ouviram as únicas vozes de militantes fora de tom. Logo a seguir à eleição da nova líder, Altino Bessa, o presidente da distrital, acusou Cristas de o ter feito sentir-se “terrorista” no próprio partido e de ter “intimidado” os subscritores da única lista alternativa à sua no congresso de Gondomar. Essa lista era encabeçada por Filipe Lobo D’Ávila e, desse grupo — depois de Cristas estar ao comando do partido –, já se demitiram Fernando Camelo, da comissão política da concelhia de Ovar e Miguel Vida, da comissão política da concelhia de Águeda.

“Altino ficou zangado por não ter sido escolhido por Paulo Portas para deputado”, revela um militante ao Observador. “Ficou tão desiludido que houve uma altura em que chegou a pensar lançar Cristas contra Portas", garante.

“Altino ficou zangado por não ter sido escolhido por Paulo Portas para deputado”, revela um dirigente ao Observador. Altino Bessa terá procurado um compromisso por parte de Cristas de que daria à estrutura o poder de escolher os deputados que concorreriam pelo distrito, mas a futura líder não se comprometeu. Daí que tivessem ficado de costas voltadas.

Assim que foi eleita, por alguma razão Cristas fez questão de ir a Braga. “Tivemos uma belíssima jornada de visitas com um jantar enorme, com 600 pessoas, todos nós dirigentes nacionais e distritais e concelhios estivemos presentes. As coisas estão a correr muito bem”, assegura Assunção ao Observador. Nada como encarar os problemas de frente, “ir a Braga pode ter sido estratégia para arrumar o assunto”, reconhece um militante.

Mas a visita não chegou para sanar o problema. “A discussão continua por fazer”, assume Altino Bessa, ao Observador. O presidente da distrital de Braga garante que, não tendo sido Nuno Melo a suceder a Paulo Portas, apoia Assunção Cristas. Contudo, continua a discordar da política interna do partido no que toca às escolhas para as listas em cada distrito.

Argumentos ao extremo

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No diferendo com Altino Bessa sobre o poder das distritais na escolha dos nomes para as listas de candidatos à Assembleia da República, Cristas levou o argumento ao extremo: “Dizia que como não tinha distrito, porque nasceu em Luanda, não teria lugar nas listas. Mas isso não era verdade, podia sempre ser escolhida pela direção nacional”, conta o militante ao Observador.

A proposta da tal lista alternativa — que Bessa nega que fosse de oposição e que assegura que era apenas um contributo para o debate — era que os órgãos nacionais pudessem escolher o cabeça de lista e metade do número de eleitos, com referência às eleições anteriores. O resto dos lugares seriam decisões das distritais.

Primeiro, Cristas tentou rebater o argumento. Mas depois, empurrou com a barriga: “Queríamos que houvesse uma clarificação, mas ela disse que não era o momento para discutir o assunto. Disse que seria discutido num Conselho Nacional que achasse oportuno.

Não é só Paulo Portas que usava chapéus. Assunção Cristas posa com um chapéu oferecido pela concelhia local, na entrada no Museu da Chapelaria, S. João da Madeira.

Isabel Santiago Henriques

Becas pela estrada fora

Quando prometeu estar mais próxima de todos, sejam as bases do partido ou os eleitores, Cristas — ou Becas, para a família — estava a falar a sério. Além de Braga, fez mais dois Dias do Distrito (Santarém e Aveiro). Mas em visitas a instituições, empresas, feiras, creches já percorreu o país praticamente de Norte a Sul.

“É impressionante a disponibilidade que tem tido para ir às estruturas. Vai a tudo para onde a convidam, qualquer tomada de posse que haja, ela vai”, garante um militante tido como crítico, ao Observador.

O seu Facebook dá conta das voltas que já deu. Em menos de dois meses foi duas vezes aos Açores, esteve em Braga, Guarda, Alcochete, Bicesse, Beja, Pombal, Marco de Canaveses, Santarém, Almada. No último fim de semana passou por Oliveira de Azeméis, no terceiro Dia do Distrito. Contando só as deslocações para ir e voltar a Lisboa, Cristas já viajou 9.297,5 quilómetros.

Às viagens somam-se as presenças nos meios de comunicação social. O objetivo é abranger o maior número de eleitorado possível, diversificando estratos sociais. Fala também para mulheres, desempregadas, reformadas e domésticas, sobretudo. Pode ser um novo nicho de mercado eleitoral à imagem do que fazia Paulo Portas. Quando estava a concorrer à liderança do partido, aceitou os convites da Máxima e da Nova Gente para participar em reportagens. A ideia foi reforçar a sua candidatura.

Mas também foi onde não é comum ver líderes partidários. Na semana passada, esteve no programa da Júlia Pinheiro, Queridas Manhãs, na SIC, a falar de Natalidade. Cristas e Júlia são amigas, Júlia já lhe tinha falado da hipótese de ir ao programa e a líder aproveitou o tema da Natalidade para criar a oportunidade. Terminou o dia no 360º, um programa de informação da RTP.


Assunção Cristas fez questão de divulgar na sua página de Facebook que esteve no programa Queridas Manhãs, da Júlia Pinheiro, na SIC.

A presença nas redes sociais também é vista como obrigatória e aí a estratégia é ser rápida na reação. Quando o debate da Natalidade não lhe correu como previsto, com a esquerda a chumbar todas as propostas, Cristas aproveitou as imagens inicialmente criadas para lançar o assunto e transformou-as num protesto nas redes sociais.

Neste ponto da estratégia, a sua capacidade de organização sobressai. Conta um colaborador: “A Assunção já me queria passar a agenda toda até ao debate do Estado da Nação. Respondi-lhe: ‘É melhor pensar uma semana de cada vez’.” Fazer a vontade à líder implicava acertar agendas até ao verão, quando termina a legislatura, antes de o Parlamento fechar para férias.

Cristas gosta de aproveitar bem as manhãs. Ao contrário do que acontecia com Paulo Portas, agora há mais iniciativas marcadas para cedo. Por exemplo, a reunião do Conselho Nacional do CDS foi marcada para as 9 horas, na Meda, distrito de Guarda, em meados de abril.

As reuniões do grupo acontecem de duas em duas semanas, intercaladas com as da Comissão Executiva, que também têm uma periodicidade de 15 em 15 dias. “Com hora de início e de fim, escrupulosamente cumpridas”, conta Nuno Magalhães.

As reuniões de trabalho são curtas e focadas — “não mais de duas horas e sem noitadas”, diz o mesmo colaborador. “Passou a haver reuniões com periodicidade predeterminada”, conta o líder da bancada parlamentar, Nuno Magalhães. As reuniões do grupo acontecem de duas em duas semanas, intercaladas com as da Comissão Executiva, que também têm uma periodicidade de 15 em 15 dias. “Com hora de início e de fim, escrupulosamente cumpridas”, diz Nuno Magalhães. Já a Comissão Política Nacional reúne-se uma vez por mês.

Não era assim no tempo de Paulo Portas. Não havia encontros com periodicidade rígida, “o Paulo fazia conforme lhe convinha”, garante outro dirigente. Para que os tempos sejam cumpridos, Cristas leva as reuniões preparadas. “Nota-se um estilo da academia”, diz Diogo Feio.

E ouve mais do que fala: “Enquanto Paulo Portas começava as reuniões com uma intervenção de fundo, às vezes de uma hora, onde anunciava o caminho que entendia que o partido deveria seguir, Cristas tem uma primeira intervenção muito curta”, conta outro democrata-cristão ao Observador.

Além disso, o próprio número de reuniões foi reduzido. Ou seja, em vez de fazer longos encontros, prefere as trocas de email ou os telefonemas. “Como tem uma vida disciplinada, procura reduzir as reuniões para tratar de dossiers. Delega muito, isso é muito interessante”, acrescenta o mesmo centrista.

Havia quem achasse Cristas demasiado “autoritária”. E este era um ponto da sua imagem que era preciso limar. Por enquanto, a líder tem provado exatamente o contrário: a filosofia é dar “maior autonomia de intervenção”, diz Diogo Feio.

Outro militante ajuda a explicar este “interesse”. Havia quem achasse Cristas demasiado “autoritária”. E este era um ponto da sua imagem que era preciso limar. Por enquanto, a líder tem tentado provar o contrário: a filosofia é dar “maior autonomia de intervenção”, diz Diogo Feio, o coordenador do gabinete de estudos do partido.

Favoritos do telemóvel

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Adolfo Mesquita Nunes, Cecília Meireles, Nuno Magalhães, Telmo Correia, Manuel Castelo Branco e Miguel Morais Leitão fazem parte do núcleo duro que a aconselha. Pedro Salgueiro, o assessor de imprensa, é frequentemente o primeiro telefonema de trabalho do dia. Mas nenhum está na lista de favoritos do telemóvel, garante Cristas ao Observador. Tem a resposta pronta: “O favorito é o meu marido”, diz, bem-disposta.

“Pensou nas pessoas de acordo com as suas competências e a partir daí é capaz de delegar. Tenho sentido uma grande autonomia no trabalho que o gabinete de estudos está a fazer”, garante.

A abertura para aceitar as ideias dos outros nota-se também nos discursos. São escritos por si, mas deixados em aberto. Cristas lê os textos aos mais próximos, ou envia-os por email, consoante a disponibilidade, e aceita contributos, garante um colaborador.

Outro militante conta ao Observador que tem tido até exemplos de que Cristas é capaz de reconhecer os seus erros. “Por exemplo, uma vez enviaram-lhe um sms com críticas e a primeira reação foi dura, sem dar o braço a torcer. Mas mais tarde acabou por enviar outro sms a reconhecer que talvez pudesse ter estado melhor”, revela a mesma fonte, sem querer acrescentar muitos detalhes.

"O Adolfo [Mesquita Nunes] já mostrou que gosta muito de política e alguém lhe está a dar muito espaço. Está muito disponível para preencher o espaço que a Assunção deixa em aberto. Em demasia, mais lá para a frente, pode vir a ser um problema”, diz um militante.

Mas “cuidado”, alerta o mesmo centrista. Delegar muito, “para alguém que queira arrancar e pegar em tudo, é um risco” avisa. “O Adolfo [Mesquita Nunes] já mostrou que gosta muito de política e ela está a dar-lhe muito espaço. Está muito disponível para preencher o espaço que a Assunção deixa em aberto. Em demasia, mais lá para a frente, pode vir a ser um problema”, antecipa.

Pernas de equilibrista

É com pernas de equilibrista que Assunção Cristas tem projetado o CDS. Se quer algum dia voltar ao poder, o partido tem de avançar. Precisa de num novo ciclo, depois dos quatro anos de governação coligado com PSD, em que aplicou o programa de resgate da troika, marcado por medidas de austeridade duríssimas, como o corte de salários e de pensões.

A mudança na liderança ajuda a fazer esse caminho, mas Cristas não deixa de estar limitada pelas decisões do partido no passado recente. É por isso que a líder tem feito a travessia a caminhar sobre o arame: “Tem de estar atenta. O equilíbrio tem sido saber renovar, sem beliscar o passado. Se se levanta alguma ponta do passado contra ela isso pode ser um problema”, avisa um dirigente.

A dificuldade pode ser tanto interna, como externa. Na imagem que passa para fora, o debate sobre a Natalidade foi um bom exemplo de como a linha é frágil: Cristas foi ao Parlamento propor medidas “amigas das famílias”, mas levou como resposta dos partidos da esquerda os cortes de salários e prestações sociais que apoiou enquanto membro do Governo de Passos Coelho.

A nível interno, a sombra de Paulo Portas pode prejudicar a sua liderança. “Já ninguém fala de Paulo Portas e isso é bom sinal. Mas se a presença dele no Parlamento se prolongar, isso pode ser cada vez mais desconfortável. Portas tem sobre algumas matérias uma convicção muito forte”, explica o mesmo democrata-cristão.

A escolha dos temas tem de ser “pragmática”, garante um militante. “Nisso é como Paulo Portas: quando convém puxam por um tema, quando não convém puxam por outro”, assume.

Houve quem não tivesse gostado, por exemplo, de ver Cristas alinhar com o ex-líder na gestão do caso de Angola e Luaty Beirão. O CDS chumbou, ao lado do PCP e do PSD, o voto de condenação a Angola pelas penas aplicadas aos ativistas políticos. No seu último discurso como líder do CDS, Paulo Portas tinha pedido que se evitasse “a tendência para a judicialização da relação entre Portugal e Angola” e tinha avisado que “esse seria um caminho sem retorno”.

O mesmo no caso do Governador do Banco de Portugal. Na véspera do congresso, a 12 de março, Paulo Portas pôs em causa a continuidade de Carlos Costa no cargo. No dia seguinte, o dia em que foi eleita presidente do CDS, Cristas desafiou o PS a rever a Constituição para mudar a forma de designar o governador.

Por tudo isto, tem de ser pragmática na escolha dos temas. “Nisso é como Paulo Portas: quando convém puxam por um tema, quando não convém puxam por outro”, diz um dirigente. Neste caso, convém ao partido lançar assuntos “que se distanciem da troika”, nota ainda o mesmo democrata-cristão.

Assunção Cristas, a retocar a maquilhagem, a caminho do encontro do Conselho Nacional do CDS, na Meda, Guarda.

CDS

A líder arrancou com o tema da Constituição e depois passou para o Programa de Estabilidade. Mas aqui focou-se sobretudo no facto de o Governo, juntamente com o PS, BE e PCP, se terem esquivado a uma votação do documento no Parlamento. É certo que o CDS criticou o “otimismo das previsões”, acusou o Executivo de ter uma estratégia “arriscada” e de “esconder” o Plano B, com medidas adicionais de austeridade.

Mas o que marcou a agenda do CDS, e o ponto em que o partido mais se empenhou, foi a questão política da falta de compromisso por parte das esquerdas no Programa de Estabilidade. Não foram as metas, nem os valores do ajustamento estrutural, ou as projeções de dívida pública, que são, afinal de contas, os pontos fundamentais do documento.

A este tema seguiu-se a Natalidade e na calha está a Segurança Social e a Educação. “Estas eram áreas em que o CDS tinha propostas, mas às quais não dava tanta atenção”, reconhece outro militante. O mesmo se passa com as questões de Ambiente e Cultura, que não eram território natural do partido. Cristas não terá — nem lhe convém neste momento ter –, tanta afinidade com aquelas que eram áreas muito ligadas à imagem de Paulo Portas, como por exemplo a Segurança ou a Administração Interna (que eram bandeiras sobretudo quando estava na oposição).

"Raúl de Almeida ficou zangado. Há esse núcleo que está contra ela”, diz o mesmo democrata-cristão.

Além de se esforçar por evitar a sombra de Portas, Cristas também tem de desatar nós do passado. Em Aveiro, Raúl de Almeida e os seus simpatizantes são um deles. “Havia uma disputa para a entrada na lista de deputados, que já vinha do tempo de Paulo Portas, entre o Raúl de Almeida, e a Teresa Anjinho”, aponta um crítico da nova líder. “Para evitar problemas, Portas escolheu os dois, mas Cristas agora puxou a Teresa Anjinho para a Comissão Executiva, por isso tomou partido”, acrescenta.

Raúl de Almeida demitiu-se da vice-presidência da distrital de Aveiro, por “total divergência política com o presidente [da distrital], Jorge Pato”, conforme explicou, a 12 de abril. “Raúl de Almeida ficou zangado. Há esse núcleo que está contra ela”, diz o mesmo democrata-cristão.

Ao Observador, Raúl de Almeida reconhece a divergência no que toca ao método da escolha das listas. O militante apoia a tal proposta da lista alternativa, encabeçada por Filipe Lobo D’Ávila e defende que a nova líder se está a afirmar melhor externamente, do que internamente.

No partido, as críticas de Raúl de Almeida tornam óbvio que a sua afirmação como líder ainda não é plena: “Nota-se que ela ainda não conhece o aparelho muito bem. Fez escolhas que representavam o pior do ‘portismo’ dos últimos tempos”, defende, referindo-se à manutenção do poder da secretaria-geral em Lisboa.

Assunção Cristas a ligar para casa, entre dois compromissos, na Biblioteca Municipal de Sever do Vouga.

Isabel Santiago Henriques / CDS

Mas apresentar temas novos tem ainda outra vantagem para Cristas agarrar o partido. É que também havia quem achasse que a nova líder “não tinha ideias”, assume outro democrata-cristão. Ao apresentar propostas, Cristas mostra que tem sugestões e alternativas, reforçando a sua imagem para dentro e para fora.

“O que pretendo é que o CDS e eu enquanto rosto cimeiro do CDS, façamos sempre uma oposição firme e acutilante quando ela deve ser, denunciando o que está mal, e ao mesmo tempo construtiva”, diz Assunção Cristas, ao Observador.

Ser “acutilante” tem ainda outro efeito, é que evita os perigos de uma imagem demasiado maternal, tendo em conta que tem quatro filhos e que foi, enquanto ministra da Agricultura, do Mar, do Ambiente e do Ordenamento do Território, a primeira governante portuguesa grávida. “Tem um ar maternal porque é mãe, mas não tem uma oposição delicodoce”, defende um alto dirigente do CDS muito próximo da líder.

Assunção Cristas, a trabalhar no carro.

CDS

Amigos, amigos… votos à parte

É último passo da estratégia da nova presidente do CDS-PP. Assunção Cristas sabe que não será uma verdadeira líder se não conseguir autonomizar o seu partido do PSD. “Neste momento o que temos são dois partidos que precisam de se afirmar para depois poderem voltar a governar em conjunto”, assume em declarações ao Observador.

E como é que isso se consegue? “É difícil, porque há uma relação inapagável”, reconhece um deputado centrista. A colaboração entre bancadas parlamentares ainda funciona, conforme descreve o porta-voz do CDS, João Almeida, ao Observador: “Continuamos a falar, a conversar, até pelas relações que se criaram. Há uma proximidade que não havia, ficou muito mais intensa do que a experiência de 2002.” O deputado refere-se à experiência do XV Governo, liderado pelo PSD de Durão Barroso, no qual Paulo Portas foi ministro de Estado e da Defesa e Celeste Cardona esteve à frente da pasta da Justiça.

Qual é a estratégia para se autonomizar do PSD? "Antecipar-se, só assim é possível diferenciarmo-nos do PSD, sem ser por contraste”, revela um centrista. “Essa é a única forma de, sem hostilizar, marcarmos a agenda e ganharmos o nosso próprio espaço”, explica.

Mas se há um caminho e Cristas já está a tentar percorrê-lo. “Antecipar-se. Só assim é possível diferenciarmo-nos do PSD, sem ser por contraste”, revela o mesmo centrista. “Essa é a única forma de, sem hostilizar, marcarmos a agenda e ganharmos o nosso próprio espaço”, explica. “Não vamos hostilizar o PSD, mas queremos crescer à direita”, diz um colaborador.

O debate da Natalidade e Demografia, que decorreu a 5 de maio na Assembleia da República, foi um bom exemplo da estratégia de Cristas. Primeiro, aproveitou para se colocar ao lado do Presidente da República — um movimento que o líder do PSD, Pedro Passos Coelho, tem mais dificuldade em fazer — e garantiu que ia à procura de consensos. E depois antecipou-se ao PSD.

Os sociais-democratas acusaram o toque. O debate resultou de um agendamento potestativo dos centristas e havia 25 propostas do partido em votação. Cristas fez questão de abrir o debate: lembrou que foi a responsável por um estudo para o partido em 2007 e defendeu que o tema sempre fez parte das preocupações do CDS. O PSD, por seu lado, não tinha apresentado qualquer proposta.

Mas Teresa Morais, deputada do PSD e ex-secretária de Estado para a Igualdade, com a autoridade do palanque, declarou: “Na oposição contribuiremos para esse debate com o desassombro de quem soube colocar o tema no centro do debate político.”

Mais tarde, Teresa Morais viria até a dirigir um reparo à deputada bloquista Isabel Pires: “Não gostamos de ser tratados como ‘a direita’. Se nos tratar genericamente assim, teremos de vos tratar como a extrema-esquerda.” Cristas parecia incrédula com as palavras da social-democrata, sua companheira de campanha, pois Teresa Morais foi cabeça de lista por Leiria — a mesma que a então ministra da Agricultura integrava nas últimas legislativas. Vai ter de se habituar. A verdadeira concorrência do CDS não estará nas bancadas da esquerda, mas ali bem juntinho, nas do PSD.

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