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Cláudia Pascoal. “Não sou a miúda que quer aparecer na televisão. Quero mudar essa ideia”

O primeiro álbum de Cláudia Pascoal está aí para ser ouvido. Um disco que é “um unicórnio”, que no fim se transforma numa coisa adulta. "É espremer isto, agora. Estou no início", diz em entrevista.

Em tempos de pandemia, o que precisamos mais é de pensamentos positivos, de gente que saiba encher a sala com um sorriso ou que, pelo menos, se lembre de contar uma piada. Cláudia Pascoal, de cabelo azul, ar despachado, chega um bocadinho atrasada à entrevista. A conversa aconteceu alguns dias antes da data do lançamento do seu primeiro projeto a solo, com o título !. Deixa-se, por agora, uma tour na gaveta, um concerto “todo pensado” pela cantora, e abre-se espaço para uma nova realidade, toda atrás de um ecrã.

Com este novo trabalho, que contou com Samuel Úria, Nuno Markl ou Tiago Bettencourt no barco, resolve-se também uma parte do seu passado, especialmente o da sua participação na Eurovisão. Há dois anos, Cláudia Pascoal, ao lado de Isaura, com o tema “O Jardim”, ficou em último lugar. Depois de uma espécie de exílio, em São Pedro da Cova, Gondomar, de onde é natural, veio a busca por uma nova identidade que se livrasse daquela velha ideia dos músicos com a estampa dos concursos de televisão, por onde a artista começou. Sempre com humor, nem que fosse para se defender de fases mais negativas.

Agora, é a vez de arriscar sozinha, escrevendo metade de um álbum, em português e com o ukelele — sua imagem de marca — mais escondido, ainda que presente. Se nada disto resultar, pode sempre virar-se para os três cursos que tirou. Porque Cláudia Pascoal, apesar de confessar que dá sempre 100% do que tem, pode mudar de gostos de um dia para o outro. Ou de querer exclamar outra coisa qualquer na vida.

[“Viver”, com Samuel Úria:]

Este está prestes a sair e tem no título um ponto de exclamação. É uma exclamação de quê?
De mim mesma. Eu e a minha equipa ponderámos muito sobre qual seria o nome do álbum, e chegámos à conclusão de que a exclamação mostrava tudo isso, um reflexo do que eu sou.

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E como é que definirias o que és? É que o público conhece a Cláudia dos concursos de televisão, da participação no festival da Eurovisão…
Sempre fui um reflexo de outra coisa, associada a uma música que não foi feita por mim, como a da Isaura, ou de um programa televisivo. Quis fazer um trabalho meu, com muitas pessoas envolvidas que adoro, com aquilo que eu gosto e com o que quero comunicar com as pessoas.

Mas qual é mesmo a identidade?
Não há palavras, é um ponto de exclamação.

A capa do álbum de estreia de Cláudia Pascoal

Mas isso pode ser um grito de revolta, pode ser raiva, alegria…
Agora fiquei a pensar… Descomplicar uma coisa muito séria representada de uma forma bem humorística. Para marcar um antes e um depois. Uma Cláudia Pascoal com cabelo cor de rosa e agora uma Cláudia Pascoal com cabelo azul.

A mudança de cor do cabelo é também para encerrar fases?
É o que me apetece, não penso muito. Penso muito sobre o que publico nas redes sociais, mas o cabelo tento não controlar, ele controla-me. Gosto muito de mim, mas canso-me imenso da minha imagem e não vou fazer piercings porque não gosto. Tatuagens faço de vez em quando, porque a minha mãe não me deixa muito… Se pintar o cabelo em dias que estou mais em baixo, fico mais contente.

É um mecanismo de defesa.
Há quem compre roupa, quem tenha a tara das sapatilhas… aqui diz-se ténis… A minha é mudar de visual.

Vamos ao álbum. Em certas partes do disco, lembrei-me um pouco de canções dos Clã. Principalmente na “Viver”, com o Samuel Úria. Quem te serve de referência? Além de teres trabalhado com ele e com o Tiago Bettencourt…
Ouvia todos os álbuns do David Fonseca, do Tiago Bettencourt da Joana Espadinha, foram uma referência gigante. Se eu me queria inspirar, porque não convidar estas pessoas? Por acaso não convidei a Manuela Azevedo, mas fica para um próximo álbum…

Sempre me defendi com humor. Antes disto tudo da música, do “The Voice” e do Festival da Canção, escrevia conteúdos de humor para outras pessoas, trabalhei no "Curto Circuito", sempre me defendi dessa forma. É uma forma diferente de interpretar a música, mais descontraída e não tão séria.

Como é que os outros artistas olham para ti? Sentiste algum tipo de discriminação, pressão ou dúvida, por seres “um produto” da televisão?
Completamente. Ainda por cima aproximo-me muito do género do indie, que é um nicho. Sempre me viram com aquele olhar da miúda que quer aparecer na televisão e estou a tentar contrariar essa ideia. Não sou essa miúda. Mas acho que já me ouvem de maneira diferente, é normal. E com um trabalho diferente, as pessoas veem-te de forma diferente. Espero que vejam agora.

E nesta mudança, qual foi o feedback do público? As pessoas estranham ou gostam?
Não sei se dizem mal de mim, mas das mensagens, tenho recebido coisas muito boas. O Nuno Markl, que também entrou no álbum, e o Miguel Araújo têm feito posts sistemáticos sobre o disco. E depois recebi também feedback de outros artistas como o Bruno Pernadas e o Afonso Cabral… fico mesmo muito contente que pessoas que admiro agora admirem o meu trabalho.

Ainda bem que falaste no Nuno Markl, porque há temas que têm uma carga humorística, como o “Esta Música Só Tem Um Acorde”. Porque é que decidiste também incluir isso no álbum? Não era um risco? Poderiam achar que era algo mais a gozar, menos profissional…
Queria ter um lado humorístico, primeiro porque existe pouco em Portugal e é algo com que me identifico muito. O primeiro álbum da Clarice Falcão tem também muito humor, um anexo cómico e por isso é que gostei tanto. E gosto de brincar com coisas sérias. O Markl mandou-me uma mensagem no outro dia a dizer que tinha ouvido o álbum e que se parecia com um ser mítico, um unicórnio, que no fim se torna numa pessoa crescida e adulta. Quanto mais para o fim mais maduro fica. Não é só parvo…

Essa atração pelo humor vem de onde? Infância, amigos, ou porque gostas muito de ver séries de comédia?
Sempre me defendi com humor. Antes disto tudo da música, do “The Voice” e do Festival da Canção, escrevia conteúdos de humor para outras pessoas, trabalhei no “Curto Circuito”, sempre me defendi dessa forma. É uma forma diferente de interpretar a música, mais descontraída e não tão séria.

“Tive muita atenção à minha volta como consequência da vitória do Salvador Sobral, porque deram uma nova importância ao festival. Estava tudo muito atento a mim, mas entretanto está-se a tornar cada vez mais distante. Ou então fui eu que me desliguei”

Já o disseste antes: espremes o máximo e depois fartas-te e mudas. Até porque já fizeste muitas outras coisas. Achas que isso vai acontecer com a música?
Agora não me vejo a fazer outra coisa, estou a 100%, ainda não me fartei. Se me perguntassem há 5 anos, quando estava a fazer televisão na SIC Radical, se me imaginava a fazer outra coisa, dizia-te que não. É espremer isto, agora. Estou no início

O lançamento do disco foi adiado, está tudo parado, concertos cancelados. Como é que olhas para isto?
No meu caso, sim. Ia anunciar uma tour, mas não vai acontecer, tem de ser assim. É para um bem comum. Fiquei triste, porque já tinha tudo alinhado e estava super entusiasmado porque tenho um concerto pronto. Mas sei que é temporário. Acho que ainda vai ser melhor porque tenho mais tempo para me preparar.

És tu que tens todas as tuas ideias para os concertos?
Sim, depois tenho de convencer a editora a alinhar em todas as ideias. Não são excêntricas. Posso dizer que o concerto vai ter muito apoio visual e ter alguns amigos imaginários a acompanhar.

Esse aspeto visual também está presente nos videoclipes que já foram lançados, principalmente no “Espalha Brasas”. Foste buscar que referências visuais onde?
Disse à Joana, a realizadora, que queria mulheres com uma imagem forte, super estética. A minha ideia até era exagerar mais nos zooms, como nos anos 80. Depois queria criar cenários muito tipo Solange, Rosalia, algo impactante. Podia até não estar nada a acontecer, mas o aspeto visual seria o mais importante.

[o vídeo de “Espalha Brasas”:]

E agora, vais mesmo largar o ukulele? A nível da imagem…
Não!  O álbum tem imenso ukulele.

Sim, há até aquela tal canção só com um acorde…
Não sei como consegui alinhar essa música e metê-la no álbum. Mas nunca vou querer largar o ukulele, é o instrumento que sei tocar… mais ou menos… Mas agora é muito comum, por exemplo acho que a Bárbara Tinoco também usa. Aquela ideia muito fofinha, muito acústica, e há algumas músicas em que tento que quase não se note, desconstruindo essa imagem. No álbum tem uma presença igual a dos outros instrumentos.

Antes deste álbum, tiveste aquele resultado negativo na Eurovisão, ficando em último lugar. O que te passou pela cabeça no dia a seguir?
Pesou-me, senti que estava a desiludir muita gente. Mas depois pensei: olha, cheguei aqui, muitos não conseguiram. Depois impingiram-me a ideia de criar um álbum, por isso comecei logo a pensar noutras coisas.

Mas a Eurovisão tem peso na carreira?
Tive muita atenção à minha volta como consequência da vitória do Salvador Sobral, porque deram uma nova importância ao festival. Estava tudo muito atento a mim, mas entretanto está-se a tornar cada vez mais distante. Ou então fui eu que me desliguei.

Mas desligaste-te porque tiveste um mau resultado?
Não, são fases. Foi uma fase boa, divertida, mas que terminou.

E agora tivemos a Elisa a vencer [o festival Eurovisão foi, entretanto, cancelado, depois desta entrevista]…
Fiquei muito feliz,  sou muito amiga dela. Não estava à espera que ganhasse. Conhecemo-nos nos Ídolos em que eu levei o ukulele. Nem me lembrava que tinha sido aí, a Elisa é que me disse.

Deste-lhe algum conselho?
Não leves saltos, vai de calças. E diverte-te. Ela é muito consciente do que faz, passou por muita luta, sabe muito bem o que vai receber.

"O 'The Voice' por exemplo foi bom, cansativo, mas saudável. Acho que esse tipo de programas ainda faz sentido, é uma montra incrível para mostrar novos talentos. A montra que se cria na televisão ainda é gigante, mas a carreira musical agora não depende só da televisão."

Tens três cursos, ourivesaria, artes plásticas e mestrado em realização e produção audiovisual. Porquê?
Sempre gostei muito de estudar, mas não era a típica nerd. Tinha o objetivo de tirar o mestrado, mas nunca tive a ideia de estudar durante muitos anos a mesma coisa. Apesar dos cursos serem diferentes, são da área artística.

E ainda os usas?
Ourivesaria nem tanto, vou polindo peças que me pedem, mas só isso. Mas artes plásticas e cinema, claro que sim, têm um grande peso. Sou eu que faço os meus próprios conteúdos nas redes sociais, por exemplo.

Então estes três cursos foram tirados em Gondomar?
Não! Primeiro, na Escola Artística de Soares dos Reis, depois Caldas das Rainha e finalmente fui para o Porto. Andei a saltar, completamente.

E a infância? Aos 15 anos já tocavas guitarra. A cena musical vem de família?
A minha família é epicamente talentosa, todos cantam muito bem e sempre me atraiu essa ideia de trazer músicas para todos cantarem comigo.

Mas cantam profissionalmente?
Não, não, são talentosos em casa. Só tinha um primo que tocava guitarra e resolvi aprender para encher mais as festas de família. E foi-se desenrolando naturalmente, fui-me aproximando de músicos, criámos projetos, tocámos na rua.

Quando é que percebeste que sabias cantar?
Acho que não sei cantar, sou é minimamente afinada. Mas percebi quando fazia conteúdos audiovisuais, como sketches, que tinham essa componente musical. Dei conta desse interesse de criar, não só de cantar.

[“Ter e não Ter”:]

E eis que chega o salto para os concursos televisivos.
Sempre me fascinou imenso como é que conseguem, com tantas e tantas horas gravadas, fazer um programa de 15 minutos. Quis ver no que é que dava, que oportunidades traziam, mas como na altura estava a fazer produção, interessou-me ir estudar o meio.

Quando falei aqui com o Diogo Piçarra, ele disse-me que se sentia orgulhoso desse seu percurso televisivo, mas que ainda sentia algum preconceito vindo de algumas pessoas. Arrependeste-te de ter começado aí?
Não, de todo. As pessoas têm de selecionar o que querem retirar daquela experiência, eu retirei o melhor: cresci imenso, foi uma escola gigante em saber estar e comunicar, fiz amigos. Sei que olham de lado e dizem “olha, lá vem a miúda da televisão”,  mas, na verdade, só me trouxe coisas boas. É outra escola.

E ainda fazem sentido?
Nem todos. O “The Voice” por exemplo foi bom, cansativo, mas saudável. Acho que esse tipo de programas ainda faz sentido, é uma montra incrível para mostrar novos talentos. A Bárbara Tinoco, não passou, mas está onde está. A montra que se cria na televisão ainda é gigante, mas a carreira musical agora não depende só da televisão.

A partir do final da Eurovisão até este álbum, estiveste sempre só focada nestas canções?
Sim, dois anos. Houve intervalos, atenção, eu depois do festival tirei umas férias longas para descansar a minha cabeça. Escrevia coisas mas não fui para estúdio.

E daí saiu algo para o “!”?
Sim, completamente.  Três das músicas foram escritas logo a seguir à Eurovisão. O “Ter ou Não Ter” transmite muito a minha experiência nesse festival. Quando percebi que era o Tiago Bettencourt  que me entendia completamente, aí sim, foi um exercício de ir todos os dias para estúdio, não gravar, mas explorar novos sons, as texturas, etc.

E como é que foi escrever metade de um álbum?
Penso na cena e “vomito” a música. Escrevo muito a partir do que sinto. Quando estou com muita raiva, vou para um lado muito humorístico. A “Quase Dança” que tem um rancho, estava muito chateada, tinha acabado uma relação nesse dia.

“Finalizei o álbum, era uma realidade distante há dois anos. Se não for uma bomba gigante também não me faz confusão porque sei que já provei que sou uma artista diferente. Isso tranquiliza-me. Se a música não resultar, tudo bem, tenho três cursos”

É outro mecanismo de defesa, tal como o cabelo, então?
Sim, todas as canções têm um feeling meio negativo, mas é terapêutico. Depois dou por mim e já nem estou a pensar no que me aconteceu de mal.

Para uma pessoa aparentemente tão feliz, porquê fazer canções sobretudo tristes?
Não consigo inventar histórias, tem de ser algo que me aconteceu, no momento, e acabou, não há hipótese, para mim. Tem de ser imediatamente.

E a decisão de cantar em português?
Foi muito por causa do “Jardim”. Sempre achei que cantava muito mal em português, que acontece muito aos artistas, pensamos que a voz fica estranha. Sentia que a modelação era completamente diferente, só que comecei a gostar com essa canção. Fui tendo mais atenção aos artistas portugueses, a ouvir muitos álbuns portugueses. E não é nada difícil cantar em português, é só habituarmo-nos. E acho que Portugal está mais adepto de ouvir músicas na sua língua.

És natural de São Pedro da Cova. As pessoas recebem-te como?
Super normal, é como se nada tivesse acontecido. Na verdade, só existe um sítio onde me veem todos da mesma forma: São Pedro da Cova. Lá ainda continuo a ser a Rafaela. Sim, o meu segundo nome é Rafaela, odeio de morte, mas é assim.

Eu sou José Carlos.
Pois… não tenho tratamento especial lá, é ótimo. Voltar à normalidade. Passei lá muito tempo depois da Eurovisão. Agora também me podiam pagar um café, mas pronto.

Por estares agora a dar os primeiros passos a solo, pensas que isto pode correr tudo muito mal? Ou é o que for?
Na verdade, não tenho muitas inseguranças. Não sei se foi da pancada que levei da Eurovisão, mas a verdade é que fiquei altamente positiva em tudo o que faço. Para mim já correu bem, finalizei o álbum, era uma realidade distante há dois anos. Se não for uma bomba gigante também não me faz confusão porque sei que já provei que sou uma artista diferente. Isso tranquiliza-me. Se a música não resultar, tudo bem, tenho três cursos.

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