Em 1900, Calouste Gulbenkian tinha 31 anos: estava, portanto, na flor da sua vida adulta de colecionador. Esta foi uma época de transição nos movimentos artísticos. Os naturalistas franceses, dos quais era apreciador e colecionador, tinham começado uns anos antes a perder o domínio no meio artístico para os chamados impressionistas.

O gosto de Gulbenkian acompanhava as mais recentes tendências internacionais. Aconselhado pelo conceituadíssimo historiador de arte britânico Kenneth Clark, que entrou no seu círculo próximo no início deste século, o colecionador esteve para adquirir uma das grandes obras de Paul Gaugin, “Ia Orana Maria (Ave Maria)”, hoje parte do acervo do Metropolitan Museum of Art de Nova Iorque.

Édouard Manet, As Bolas de Sabão. França, 1867. Óleo sobre tela. Museu Calouste Gulbenkian. Foto: Catarina Gomes Ferreira

Não adquiriu essa obra, mas adquiriu outras igualmente emblemáticas do final do século XIX, como “O Rapaz das Cerejas” e “As Bolas de Sabão”, de Édouard Manet, por muitos considerado o pai do Modernismo na pintura, e que marcou indubitavelmente esta época de transição para o impressionismo.

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Outro importante artista deste tempo, que recusava a ligação ao movimento impressionista, é Edgar Degas. Em 1919, Calouste Gulbenkian adquiriu a sua obra “Retrato de Henri Michel-Lévy”, produzida em c. 1878. Trata-se de um retrato de um pintor no seu ateliê, trazendo, portanto, a pintura para dentro da pintura. Uma obra com o seu quê de inquietante, devido ao enquadramento e perspetiva escolhidos, com o pintor descentrado, ao mesmo tempo vulnerável e desafiante.

De Monet, o mais célebre dos impressionistas, Gulbenkian adquiriu a tela  “O Degelo em 1925, ainda durante o período de vida do mestre francês. “O Degelo” faz parte de uma série de obras em que Monet pintou o rio Sena gelado, na região de Vétheuil, arredores de Paris, no inverno de 1880. Esta é uma de várias séries em que Monet se debruçou sobre a efemeridade e a transitoriedade da paisagem, constantemente mutável, neste caso pelos diferentes momentos de luz e pelo desagregar dos pedaços de gelo e dos reflexos por eles criados.

Claude Monet, O Degelo. França, 1880. Óleo sobre tela. Museu Calouste Gulbenkian. Foto: Catarina Gomes Ferreira

A mulher de Monet é a personagem central de outra das obras impressionistas da coleção, o “Retrato de Camille Monet”, de Pierre-Auguste Renoir, que a pintou por mais que uma vez na década de 1870. Aqui, estamos perante um registo intimista, de modernidade, onde se destacam as referências contemporâneas – a leitura do Le Figaro, jornal fundado na primeira metade do século (1826), e o japonismo, muito em voga na época, evocado na chávena de chá junto a Camille.

Ainda nesta época, Gulbenkian também revelou um interesse especial pela obra de outro artista francês, mas da escultura: Auguste Rodin. Em 1910, o colecionador comprou ao artista a obra “Cabeça de Legros”, um retrato de Alphonse Legros, pintor, escultor e medalhista que, curiosamente, também retratou Rodin. Neste caso, tratou-se de uma encomenda direta. O artista e o colecionador trocaram correspondência e numa carta de Rodin para Gulbenkian, conservada nos Arquivos da Fundação Calouste Gulbenkian, este afirma que teria prazer em recebê-lo na Rue de Varenne, onde hoje se localiza o Museu Rodin. Desconhece-se, porém, se esse encontro chegou a acontecer.

Auguste Rodin, Cabeça de Legros. França, 1910. Bronze. Museu Calouste Gulbenkian. Foto: Catarina Gomes Ferreira