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Rolf Schrömgens, cofundador da Trivago
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Rolf Schrömgens, cofundador da Trivago

MICHAEL M. MATIAS / OBSERVADOR

Rolf Schrömgens, cofundador da Trivago

MICHAEL M. MATIAS / OBSERVADOR

Ligar a produtividade às horas de trabalho é "um completo absurdo"

Em entrevista ao Observador, Rolf Schroemgens, fundador da Trivago, defende: "devíamos livrar-nos da ideia de fazer do tempo [de trabalho] um indicador da produtividade."

Quando, em 2005, Rolf Schroemgens cofundou a Trivago, já tinha sido criador de outra empresa, a Ciao. Dessa experiência, tirou uma lição: ser cauteloso na procura de financiamento, porque “seis meses ou um ano depois”, e com “perto de 20 milhões” de euros angariados, a Ciao “estava a ser dirigida por investidores” — e os investidores, “por norma, não são bons empreendedores”, afirma o cofundador da Trivago em entrevista ao Observador, à margem da sua presença na conferência Building Global Entrepreneurs, que decorreu esta segunda-feira na Universidade Católica, em Lisboa, e que serviu de mote à apresentação da EO Portugal, a primeira rede portuguesa de empreendedorismo inserida na Organização de Empreendedores (EO).

Para o atual líder executivo da Trivago — um agregador e motor de busca online de hotéis, usado todos os meses por mais de 100 milhões de utilizadores de todo o mundo —, há outro aspeto em que se deve ter cuidado: a forma como se ligam as horas de trabalho à produtividade. A ideia de que “se estivermos a trabalhar nove horas, em vez de oito, estamos a ser dez ou 11 por cento mais produtivos, já não faz sentido para a maioria dos trabalhos que temos hoje”.

Rolf Schroemgens, trivago, 2016, joão candido da Silva,

Fundou a Trivago com outros três empreendedores, na Alemanha [em Dusseldorf]. Como é que se conheceram?
Conhecemo-nos durante a universidade, na Alemanha. Na nossa primeira semana de aulas, na verdade. Quando começámos a estudar tivemos uma espécie de primeira semana de introdução, em que tivemos de trabalhar bastante, mas onde nos pudemos conhecer. Numa das aulas, dividiram-nos em cinco grupos — a nossa turma era pequena, só tinha 25 alunos — e ficámos juntos. Foi assim que nos conhecemos e foi aí que aprendemos realmente a trabalhar juntos e a confiar uns nos outros — uma coisa que ainda hoje nos é útil.

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Partilhavam a ideia de que havia uma lacuna no mercado ou a ideia surgiu apenas porque gostavam de viajar e, a partir da vossa experiência como turistas e clientes, achavam que havia muito para melhorar?
Foi, sem dúvida, um processo evolutivo. Em 2005, achámos que seria uma ótima ideia construir muito conteúdo [digital] sobre um determinado assunto e especializarmo-nos num determinado assunto, porque sabíamos que a Google ia continuar a evoluir muito e acabaria por dar aos utilizadores bons conteúdos. Essa era a ideia inicial. Achávamos que nos devíamos especializar em algum tipo de conteúdo e acabámos por escolher o das viagens.

Basicamente, a área das viagens é, por um lado, um setor sobre o qual muitas pessoas gostam de escrever, de trocar ideias e experiências e, por outro, é um setor que se pode explorar muito em termos comerciais. E é um setor onde também se pode comercializar através do tráfego que se gera [para outros sites]. Foi basicamente por isso que escolhemos o mercado das viagens. Não éramos propriamente pessoas com uma enorme paixão por viajar, para ser honesto. Fizemos uma escolha muito inteligente quanto à direção a seguir, mas a ideia final da Trivago, o produto final, foi desenvolvido ao longo dos anos, ainda não existia no início.

"Foi assim que nasceu a Trivago. Nasceu mais ou menos a partir de um erro, não foi aquela coisa de termos tido uma ideia magnífica num grande momento [de inspiração]"

A ideia inicial foi sendo alterada até se tornar o que é hoje?
Exatamente. Começámos por ser uma espécie de Wikipedia comercializável para o setor das viagens. Pensámos em construir algo que tivesse, por um lado, informação mais extensa do que a Wikipedia sobre um país ou sobre uma cidade específica, para quem vai viajar, e pensámos em comercializar isto, pagando de volta a quem escrevia o conteúdo, para os motivar a escrever mais.

Mas o plano inicial não resultou?
Com o tempo descobrimos que, apesar de ser uma boa ideia, não estava a “descolar”. Mais tarde, por volta de 2007, já a crise financeira tinha chegado, estávamos a ter algum sucesso com os anúncios que tínhamos no site. Mas alguns anunciantes começaram a fazer-nos perguntas, como o porquê de os anúncios não originarem [mais] cliques. Sentámo-nos à mesa e explicámos: provavelmente, porque estamos a mostrar um artigo sobre a Torre Eiffel e temos ao lado um anúncio sobre uma viagem às Bermudas, que, quando se clica, redireciona para a página inicial do vosso site onde surge o anúncio de uma viagem a Londres.

Daí, começámos a pensar em como é que as pessoas poderiam encontrar um hotel em Paris. E sugerimos que nos facilitassem esse trabalho e anunciassem hotéis em Paris ao lado desses artigos. Disseram-nos que não, que não tinham acesso à nossa base de dados, que não nos podiam dar essas informações. E voltámo-nos a sentar. Está no vosso website, estão a mostrar estes hotéis e não nos podem ceder? Disseram-nos que nem pensar. E nós pensámos: ‘ok; se não o fazem, fazemo-lo nós’. E começámos a usar pequenos robôs para andar pelo website deles [anunciantes]. Cada vez que alguém vinha até nós procurar a Torre Eiffel e os hotéis próximos à Torre Eiffel, corríamos todos os websites deles à procura de hotéis perto da Torre Eiffel [para colocar como anúncios]. E o que acontecia é que víamos o artigo e os hotéis perto da Torre Eiffel e tínhamos exatamente os mesmos cinco hotéis uns junto dos outros.

Isto não fazia sentido, era sempre o mesmo hotel. Há anunciantes diferentes, o Booking, a Expedia, muitos outros, e todos eles têm preços diferentes. Sentámo-nos para ver o que podíamos fazer e começámos a combinar todos estes anúncios uns ao lado dos outros, todos sobre o mesmo hotel, mas com cinco preços diferentes. Só o mostrávamos uma vez e colocávamos os cinco preços por baixo. E foi assim que nasceu a Trivago. Nasceu mais ou menos a partir de um erro, não foi aquela coisa de termos tido uma ideia magnífica num grande momento [de inspiração]. No fim de contas, acabámos por descobrir que as pessoas gostavam mais de nós por causa dos anúncios do que por causa dos artigos. Demorou um bocadinho a encaixar isso. A escrita dos artigos era algo de que gostávamos muito e descobrimos que não era isso que as pessoas queriam de nós, eram os preços, era encontrar o site mais barato a que se pode ir para reservar um hotel.

Antes de fundar a Trivago, o fundou a Ciao, em 1999. O que é que aprendeu com essa experiência? Cometeu alguns erros que o levaram a mudar a sua forma de trabalhar?
A Ciao foi uma cria na primeira vaga da Internet. Na altura, eu tinha 23 anos e havia alguns cofundadores, mas tinha 23 anos e, seis meses depois de lançar a plataforma, havia pessoas que me estavam a dar, sei lá, perto de 20 milhões de euros em financiamento. E, sim, gastámos muito deste dinheiro, ganhámos algum, mas perdemos a maior parte. O que realmente aprendi foi que não se deve entregar a nossa independência demasiado cedo. Porque o que vi foi que éramos uma empresa muito jovem e, no espaço de um ano, ano e meio, estávamos a ser mais ou menos dirigidos por investidores, já não éramos nós a dirigir a empresa. E não queria que isso alguma vez voltasse a acontecer. E disse, realmente, que nunca o voltaria a fazer, nunca mais ia trabalhar numa empresa que não pudesse levar até ao próximo nível.

"Eu como investidor tento nunca me envolver nos detalhes dos negócios. Estou presente quando me chamam e partilho a minha experiência, "à antiga". Isto foi o que eu fiz e podes tirar daí o que quiseres — mas não te vou dizer como é que deves gerir o teu negócio."

Já não dirigia o negócio e já não podia gerir o projeto da forma que achava correta?
Exatamente. Já não tinha influência na cultura da empresa. Já era dirigida pelos investidores. Hoje em dia — e oxalá já me permitam dizer isto, porque eu próprio invisto em negócios — acho que os investidores, por norma, não são bons empreendedores. Eu, como investidor, tento nunca me envolver nos detalhes dos negócios. Estou presente quando me chamam e partilho a minha experiência, “à antiga”. Isto foi o que eu fiz e pode-se tirar daí o que se quiser, mas não vou dizer como é que se deve gerir o teu negócio. E isso foi diferente da situação que vivi antes. Por isso é que não voltei a entregar a minha independência, o meu poder de decisão, foi porque queria ser eu o responsável [pelos projetos]. Se falhar, falho por causa de mim, e, se acertar, acerto por causa de mim. Não quero estar dependente das decisões de outros, isso era algo que realmente não queria que voltasse a acontecer. Portanto, quando comecei a Trivago, disse que não entregaria uma percentagem tão grande do meu negócio tão cedo. (…) É também por isso que nunca recebemos muito financiamento ao longo dos anos, mantivemos sempre a decisão de continuar com o controlo do nosso negócio.

Mas não deve ser fácil ter pessoas e empresas a quererem investir num projeto e decidir recusar dez ou 20 milhões de euros de financiamento. Como é que se decide isso? Quais são os sinais de que ainda não se está preparado para entregar a independência na gestão?
Bom, esta é a minha forma de lidar com esta questão — não estou certo que seja a correta, é a minha e nasceu a partir da minha experiência anterior na Ciao. Não diria às pessoas para decidiram desta ou daquela maneira. É uma estratégia que veio da minha experiência anterior e que ajudou a minha empresa [Trivago] numa fase inicial a não receber grande financiamento, a não se construir de forma ultra-rápida, mas antes de uma maneira cautelosa. Não diria que esta é sempre a melhor solução, que é sempre a decisão certa. Também tenho investimentos em que digo [às empresas] para serem mais agressivas, para procurarem mais dinheiro, pelo que também não generalizaria.

Ainda sobre este tema e sobre a aquisição da Trivago pela Expedia, em 2012. Isso provocou mudanças na empresa?
Não, nenhumas. Isso foi muito importante para nós, fundadores, que vendemos apenas 25% das nossas ações, mantivemos 75% das que tínhamos. Para nós foi muito importante podermos continuar a controlar o negócio, continuar a sermos responsáveis por ele, manter a liberdade de fazermos o que achamos que devemos fazer. Para além dos contratos, acordámos com os acionistas e com a administração da Expedia que mantínhamos a nossa independência. E toda a gente vê esta independência como importante para o desenvolvimento da empresa, portanto, nada mudou realmente para nós. Posso dizer oficialmente que não houve qualquer decisão na Trivago que não tenha sido tomada por nós. De outra forma não aceitaria [a aquisição]. Estamos a trabalhar juntos há três anos e meio e isso não mudou, o que me leva a achar que não haverá grandes mudanças no futuro.

Vocês fazem algum trabalho de pesquisa com os vossos clientes, veem-nos a planear as vossas experiências através do Trivago. Fazem-no, também, com clientes portugueses?
Fazemos isso com clientes de todo o mundo e de forma contínua. Todos os dias temos milhões de versões do Trivago, que testamos e comparamos entre si. Basicamente, usamos os nossos utilizadores para melhorar constantemente o nosso website e tentamos ver as reações deles, a forma como usam o site, e, claro, fazemos isso em todos os países [em que estamos presentes].

Fazemo-lo para verificar se há diferenças na forma de agir [de uns e outros] e reagimos a esses dados, se acharmos necessário. Para além disso, também fazemos testes com utilizadores, claro, de forma internacional. Como estamos em 55 países e somos uma empresa global, não conseguimos responder a todas as necessidades de todos os utilizadores dos países em que estamos presentes. Mas acredito fortemente que as diferenças que vemos entre países [a nível de utilização do Trivago] não derivam provavelmente da nacionalidade das pessoas. Haverá, por exemplo, um grupo de pessoas em Portugal que é provavelmente muito mais parecido com um grupo de pessoas na Alemanha do que um outro grupo de pessoas que também vive na Alemanha. Portanto, não se pode dizer que é assim que os utilizadores de país A reagem ou que os utilizadores do país B reagem. As pessoas agem de forma diferente, mas normalmente isso não se deve à sua nacionalidade.

Que importância tem o mercado português para a Trivago?
Portugal sempre foi um mercado importante para nós, por estar muito próximo de Espanha — talvez não o queiram ouvir mas é assim e decorre de termos tido muito sucesso em Espanha, logo desde o início. Basicamente, no início, os mercados mais importantes eram a Alemanha e a Espanha e, quando começámos, tínhamos ainda mais sucesso em Espanha do que na Alemanha. Portanto, pensámos que, se Espanha é um mercado importante, devíamos chegar mais rápido a Portugal. E, depois, claro que tem um grande impacto porque usamos Portugal para chegar ao Brasil, por causa das semelhanças na língua e cultura. Portanto, chegámos também ao Brasil, que é um grande mercado para nós, no qual somos extremamente bem-sucedidos. Portugal teve uma importância estratégica para chegarmos ao Brasil.

"Queremos estabelecer esta ligação para que quem queira reservar ou obter informações sobre um hotel, a primeira coisa que pense seja o Trivago."

Em termos de anúncios televisivos — por exemplo, aqui em Portugal. Isso resultou do bom feedback que tiveram com essa estratégica noutras partes do mundo, Estados Unidos, por exemplo?
Sim, acreditamos mesmo na importância de construir uma marca, porque queremos mesmo estar na cabeça dos consumidores. Queremos estabelecer esta ligação para que quem queira reservar ou obter informações sobre um hotel, a primeira coisa em que pense seja o Trivago. Queremos estabelecer essa ligação, para que as pessoas não vão primeiro ao Google, ou a outro website. Para que no momento em que pensem em hotéis pensem sempre na Trivago. Isso é uma parte central da nossa estratégia e só o conseguimos fazer através do branding. Fazemo-lo desde o início da Trivago e é uma parte importante da nossa estratégia. Isso também é válido para Portugal, é essa a direção que queremos seguir. Fizemos essas campanhas publicitárias no passado, fazemo-lo ainda mais hoje, também por vermos os especialistas em marketing a reagir e por vermos que estamos a crescer fortemente em Portugal.

Na Trivago, permitem aos vossos empregados definirem as suas próprias horas de trabalho e até promovem esta forma de funcianamento. Porquê?
Porque acreditamos que não há nenhuma razão para que as pessoas tenham de trabalhar num período de tempo específico, numa altura específica do dia. Ir trabalhar numa hora específica e dizer “ok, vou trabalhar às 09h00 e saio às 17h00”, as pessoas fazem-no todos os dias e acho que isso não faz sentido para a maioria dos trabalhos que temos hoje. (…) E [a ideia de que] se se estiver ali a trabalhar durante horas, em vez de oito, se é, sei lá, dez ou 11 por cento mais produtivo já não é verdade hoje, porque a maioria das pessoas trabalha sentada, em frente ao seu computador. Essas pessoas estão a fazer, na sua maioria, um trabalho criativo, a organizar material, seja o que for, mas no fim de contas é um tipo de trabalho criativo, e todos sabemos que [a produtividade de] só raramente está relacionada com o tempo [de trabalho].

"E [a ideia de que] se estiveres ali a trabalhar durante nove horas, em vez de oito, és, sei lá, dez ou 11 por cento mais produtivo já não é verdade hoje."

Seguindo esta linha de pensamento, acha que o próximo passo pode ser ter cada vez mais pessoas a trabalhar à distância, a partir das suas casas, por exemplo?
Não, não. Acredito muito na ideia de que o tempo [de trabalho] não é uma medida importante para calcular a produtividade [dos trabalhadores]. E devíamos livrar-nos da ideia de fazer do tempo [de trabalho] um indicador da produtividade. Para mim, isso é um completo absurdo. Mas não acredito muito na ideia de dizer a toda a gente que deve trabalhar a partir de casa.

Porquê?
Porque acho que é muito importante que as pessoas se vejam umas às outras, que trabalhem umas com as outras. Na Trivago, juntamos pessoas de países de todo o mundo, temos mil pessoas que vêm de 70 países diferentes, e só perto de 25% dos nossos atuais empregados é que são alemães. Os outros 75% chegam de todo o mundo para trabalhar na empresa. E nós queremos isso. É importante que as pessoas se ajudem, é importante que discutam e conversem umas com as outras, que se vejam umas às outras, que troquem ideias. E, como acho que isso tem uma enorme importância, não acho que seja bom sentarem-se sozinhas em casa a trabalhar. As pessoas devem ter flexibilidade para trabalharem a partir de casa, se acharem que são bem produtivas aí. Mas eu não o promovo. Quero criar um ambiente único no escritório e quero ter um escritório onde as pessoas adorem ir, para o qual realmente querem ir, e que o querem porque acham que aí podem trabalhar melhor. E, se não o conseguirem, se depois de tudo isto conseguirem ser mais produtivas trabalhando desde casa, tudo bem, mas o meu objetivo é tê-las todas a trabalhar num único sítio.

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