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Os direitos de autor do original trocadilho são de Bebiana Cunha, a provável futura líder parlamentar do PAN, que a certo ponto do congresso — claramente embalada pelo entusiasmo — decidiu declarar-se aos companheiros de partido e dizer-lhes que são “PANtásticos”. O momento de stand-up até lhe valeu um prémio (o Fernando Rocha), mas há mais: como é tradição, o Observador analisou atentamente tudo o que se passou no congresso deste fim de semana, em Tomar, e atribuiu outros nove galardões.

Entre eles encontram-se momentos cómicos (ou, pelo menos, valeu o esforço), promessas políticas, figuras emergentes e até há quem tenha merecido dois prémios, de tão omnipresente que foi. Já o próprio PAN termina o congresso arrecadando o prémio de Melhor Vizinho — resta saber se há partido que o queira ao seu lado no Governo, como Inês Sousa Real tanto pediu.

Prémio ‘Tenho uma consulta às cinco’: André Silva

André Silva quis afastar-se do combate político interno e do debate, mas criou uma situação insólita: o líder do partido em funções não assistiu à reunião magna do partido. O líder cessante fez o discurso com mais conteúdo político e ideológico de todo o Congresso, cumpriu aquilo que se espera do último discurso ao fim de seis anos da liderança, mas depois voltou para Lisboa. Falou antes de almoço, ainda almoçou com os “camaradas” (é assim que chama aos outros militantes, embora admita que exista quem não goste), mas depois pegou no carro e foi embora. Foi avistado junto a um cão pela última vez às 15h40 no hall do Hotel Templários. Poucos minutos depois já ia na estrada, a tempo de chegar para uma consulta às cinco (se fosse caso disso) na capital.

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Prémio Fernando Rocha: Bebiana Cunha

A futura líder parlamentar do PAN, Bebiana Cunha, teve o seu momento stand up comedy no palco. Contexto prévio: a candidata única à liderança do PAN, Inês Sousa Real, teve uma queda grave dias antes do Congresso que a impediu de dar entrevistas à comunicação social e participar no Congresso a tempo inteiro. Ora, ao chegar ao palco, Bebiana Cunha avisou que ia “fazer uma piada” e que até tinha ponderado bem se havia de arriscar ou não. Arriscou e lá saiu: “Inês, tens queda para política”. Se a bancada parlamentar correr mal, tem futuro no humor ao estilo ‘Malucos do Riso’ e nem precisa de sorrisos gravados, já que conseguiu arrancar gargalhadas a pelo menos metade da sala. É sabido que Bebiana Cunha nem sempre achou piada à liderança de Sousa Real (já que alimentava a esperança de ser ela a líder), mas percebeu que há momentos em que é mais fácil ser engraçado do que cair em graça. A cereja no topo do bolo foi o trocadilho final: “Somos PANtásticos!”

Prémio Ambição: Inês Sousa Real

Se dúvidas houvesse sobre o posicionamento do PAN em relação ao Governo — e eram bastantes, porque no congresso pouco se falou de estratégia política concreta — elas desfizeram-se com as constantes referências de Inês Sousa Real, no discurso de encerramento, sobre ir para o Governo: o PAN quer lá chegar e já o assume sem pudores o objetivo para 2023. A estratégia nem sempre resulta: não foi assim há tanto tempo que Assunção Cristas aproveitou um congresso do CDS para se afirmar como candidata a primeira-ministra (e meses depois teve 4% em legislativas), ou que o Bloco de Esquerda prometeu “ir até ao infinito e mais além” (e ficou apeado e fora do Governo). O futuro dirá se o PAN tem mais sucesso nessa empreitada.

Prémio BFF: Duarte Cordeiro

O PAN bem prometeu que vai ser “mais duro” com o Governo e que quer “mais” de António Costa, mas as promessas foram mais entendidas como um início de conversa do que como ameaças. Duarte Cordeiro ouviu as exigências da nova líder e respondeu com descontração: a ideia é “manter a colaboração” e provar ao PAN que o Governo executa mesmo as medidas exigidas pelo parceiro de Orçamentos. A amizade é para continuar. Com uma nuance: se a ideia é ir para o Governo, é preciso pôr gelo nos pulsos — é uma ambição que o PAN terá de “gerir”, mas que “não encaixa com certeza” no projeto político do PS. Amigos, amigos, Governos à parte.

Prémio ‘PANinho’: Beatriz Salafranca

O PAN aprovou a criação de uma juventude partidária e, poucos minutos após dar esse passo, a jovem Beatriz Salafranca ofereceu-se para tomar as rédeas do projeto, como principal rosto. É uma espécie de proto-candidata a líder de uma estrutura que ainda não existe. A jovem disse que queria criar uma “jota” diferente das outras, mas, na verdade, a primeira coisa que fez foi explicar que não abdicava de cargos destinados a jovens na estrutura do partido-mãe. Para Beatriz Salafranca a “jota” não deve ser uma “gavetinha” onde se colocam os jovens e exige mesmo que estes continuem a poder progredir na carreira política dentro do partido. Se o objetivo era contrariar a ideia que as jotas são um trampolim para os chamados “tachos” políticos, a intervenção não terá sido a mais eficiente.

Prémio “É a política, estúpido”: Albano Lemos Pires

Não houve muito tempo para discussão política propriamente dita, à exceção de uns minutos de debate provocados por uma moção setorial. Alguns congressistas entendiam que o documento proibia o PAN de chegar a acordos com partidos que apresentassem medidas contra os seus princípios, outros garantiam que a intenção era assegurar que o PAN não se torna uma “bengala do PS”. A irritação foi geral e Albano Lemos Pires, da direção, acabou por arrasar a proposta que entendeu ter por finalidade “fechar o PAN” e deixá-lo “orgulhosamente só”, como no “salazarismo”, por parte de uma fação que “queria manter o PAN pequenino”. Solução? Uma congressista concluiu que  entre a “discussão sobre o sexo dos anjos” e a “aula de português” que se estava ali a ter, mais valia “refazer a porcaria da frase!” que gerou discórdia. E assim foi: a moção alterou-se; as discordâncias de fundo sobre a postura do PAN em relação a entendimentos políticos, que pouco discutidas foram, não.

Prémio “O mais chato”: Albano Lemos Pires

Não é engano: é mesmo mais um prémio para Albano Lemos Pires. E não somos nós que o dizemos: foi o próprio Albano Lemos Pires que se descreveu assim mesmo, como “o chato”, durante o congresso do PAN. O congressista, que faz parte da direção (transita da antiga para a nova) e é casado com Bebiana Cunha, foi a todas: entrou em discussões sobre esterilização de animais, corrupção e Europa; apresentou moções, perguntou sobre moções, indignou-se com moções; descreveu-se como “o chato” do congresso no primeiro dia e no segundo anunciou o seu regresso: “O chato ainda não tinha falado hoje!”.

Fora de brincadeiras, o que a omnipresença de Albano Lemos Pires deixou transparecer foi o papel importante que assume no partido, sempre atento a cada passo dos trabalhos, a par de quem é e o que defende cada militante e com visível cuidado para não deixar as discussões descambar. No primeiro dia, explicou que é judeu para se dizer revoltado com a proposta que visava acabar com as ligações familiares em órgãos do PAN — caso de Albano e de Bebiana — a fazer lembrar as “leis de Nuremberga”; sugeriu que se retirasse uma moção sobre relações internacionais que estava a gerar confusão (ver prémio “Perdoa-me”); e pôs ordem na casa quando finalmente se fez uma (pequena) discussão sobre posicionamento político (ver prémio “É a política, estúpido”). O poder e a presença de Albano são tão evidentes que um prémio não chegou para falar do seu papel neste congresso: tiveram mesmo de ser dois.

Prémio “Perdoa-me”: Nuno Cardoso da Silva

Foi um mea culpa muito público — e rápido: em poucos minutos, Nuno Cardoso da Silva apresentou uma moção ao congresso, ouviu uma chuva de críticas, pediu desculpa aos camaradas — “provavelmente fiz mal” — e retirou-a da discussão. O documento focava-se nas relações externas de Portugal e defendia que o país não deve meter-se em assuntos internos de outros países. Uma ideia que indignou vários congressistas, que se apressaram a perguntar se em caso de “novos holocaustos” ou do “lunático” Bolsonaro, que quer “deitar fogo” à Amazónia, não deveria haver ação externa. Depois de muita discussão, Nuno Cardoso da Silva lá lamentou as condições em que os norte-coreanos vivem (dizendo que apesar disso não se sente ameaçado), mas concordou em retirar a moção. Pelo meio, o omnipresente Albano Pires concluiu que o assunto não estava amadurecido: “Ainda não saímos da praia da Nazaré e já estamos a discutir se queremos ir para Filadélfia ou para Boston…”. A discussão não chegou a Filadélfia, a Boston nem a parte nenhuma e, feito o pedido de desculpas, o PAN ficou mesmo sem moção internacional.

Prémio Uber: Pedro Ribeiro de Castro

A greve da CP teve impacto no Congresso do PAN, levando a que quatro congressistas ficassem sem forma de se deslocar para Lisboa. Mas o presidente da Mesa do Congresso, Pedro Ribeiro e Castro, fez as vezes de Uber e resolveu de imediato o problema sem causar danos ambientais. Fez uma pausa nos trabalhos e questionou: “Precisamos de boleia para quatro pessoas para Lisboa. Quem pode dar?” Poucos segundos depois os braços começaram a levantar-se e prontamente se dividiu as pessoas por quatro carros. Os congressistas que ficaram apeados por culpa da greve vão assim seguir em modo de car sharing para Lisboa e sem aumentar a pegada ambiental.

Prémio melhor vizinho: PAN

Quase fez o pleno: neste encerramento do congresso, o PAN conseguiu juntar na mesma sala os representantes do Governo, PSD, CDS, Bloco de Esquerda, PCP, PEV, Livre e Volt, pelo que merece o prémio de melhor vizinho. E se não conseguiu o pleno não foi por falta de vontade: o partido até convidou o Chega — aquele partido que classifica como “antidemocrático” e com o qual diz não querer nada — e o Iniciativa Liberal, mas estes não vieram a Tomar. Pelo lado do Governo, foi Duarte Cordeiro, secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares, que esteve sentado na fila da frente enquanto ouvia o desfiar de desafios da nova líder ao Executivo. Aliás, o entusiasmo — e a ambição — foi tal que Inês Sousa Real não se cansou de prometer que o PAN quer mesmo chegar ao Governo. Resta saber se PS (ou, no futuro, PSD) querem o PAN como vizinho do lado.