Os vencedores

Luís Montenegro

Juntou todos os potenciais rivais nas suas listas. Teve 91,7% dos votos. E praticamente não ouviu críticas durante todo o Congresso. A essas vitórias, Luís Montenegro juntou três detalhes cénicos que mostram a vontade de mudar: conseguiu manter em segredo a maior parte das suas escolhas surpreendentes para os órgãos do partido (o que mostra capacidade de controlar informação e ambições); no último dia fez questão de entrar sozinho no recinto, acabando com a confusão de câmaras de televisão (o que mostra vontade de parecer um líder que domina o que se passa à sua volta); e acabou com o seu hábito de fazer discursos não escritos (o que mostra disciplina). As coisas só teriam corrido melhor a Luís Montenegro neste fim de semana se tivesse encontrado um bilhete premiado da lotaria ao passear pelos jardins do Palácio de Cristal.

Hugo Soares

O cargo de secretário-geral é, por norma, dos mais cobiçados porque é nele que se concentra o verdadeiro poder interno. Com uma direção essencialmente política, com nomes como Rangel ou Pinto Luz, Hugo Soares vai ser o senhor do aparelho, sucedendo à dupla Malheiro-Silvano. Se for secretário-geral durante quatro anos, num ciclo de dois mandatos, não haverá um único militante que não o conheça. Vai ser ele o centro de todas as negociações no PSD – mesmo que Pedro Alves tenha ficado como coordenador autárquico – e isso vai permitir que possa alargar as suas ambições políticas. Hugo Soares mantém-se também como uma espécie de extensão de Luís Montenegro, estando para o novo líder como Relvas estava para Passos Coelho. Não perdeu estatuto e manteve uma moderação na linguagem (benéfica para Montenegro) que nem sempre o seu modo bulldozer permite. Se Rangel é oficial e formalmente o número dois, a título oficioso Hugo Soares é a segunda figura mais influente deste novo PSD.

Paulo Rangel

Quando decidiu avançar contra Rui Rio no ano passado, Paulo Rangel tinha o apoio sólido das tropas de Luís Montenegro — mas, no dia do voto, essas tropas desertaram, torpedeando a hipótese de Rangel chegar a número 1 do partido. Não sendo número 1, o eurodeputado será número 2, promovido precisamente por aqueles que lhe cortaram a ambição há uns meses. Mas essa mercearia partidária agora é passado. O que interessa é que a primeira grande prova de Luís Montenegro serão as eleições europeias, o que faz do eurodeputado Paulo Rangel uma das pessoas fundamentais desta nova vida do PSD. Se a isso somarmos o facto de António Costa estar empenhado em ter maior protagonismo na União Europeia, estão criadas as condições para Rangel se tornar numa espécie de sombra do primeiro-ministro. Paulo Rangel é a última demonstração de que, em política, as derrotas não duram para sempre.

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Miguel Pinto Luz

Há oito meses, no último Congresso do PSD, Miguel Pinto Luz até conseguiu mais votos para o Conselho Nacional do que a lista apoiada por Luís Montenegro, mas saiu da reunião magna do partido com uma mão-cheia de nada e passou a imagem de um crítico ressentido e isolado nas críticas a um Rui Rio que ia a votos nas legislativas. Desta vez, sem apresentar lista e sem sequer ter apoiado Montenegro, foi convidado para vice-presidente. O novo líder validou o peso que o vice-presidente da câmara de Cascais tem no partido e isso valoriza-o. Miguel Pinto Luz ganha tempo para poder suceder a Carlos Carreiras, fazer um ciclo autárquico vitorioso, e voltar reforçado a tentar o partido se tiver condições. Isto mantendo uma relevância — mediática e na prática – como vice-presidente do partido.

Carlos Moedas

Pelo segundo Congresso consecutivo, Carlos Moedas fez o discurso mais aplaudido pelos militantes. E, pelo segundo Congresso consecutivo, apresentou a sua campanha e o seu governo em Lisboa como santo e senha para uma futura vitória nas legislativas. A fórmula é simples: o PSD gosta de pessoas que sabem vencer eleições; Carlos Moedas venceu as suas eleições; logo, por decorrência natural, o PSD gosta de Carlos Moedas. Neste fim de semana, Luís Montenegro e Carlos Moedas partilharam um interesse comum: o primeiro precisava do segundo para mostrar que era capaz de promover a unidade; e o segundo precisava de aparecer como figura agregadora dessa unidade. De qualquer forma, nesta contabilidade laranjinha, Carlos Moedas era quem tinha mais a ganhar: está suficientemente perto de Luís Montenegro para ter a importância de abençoar a nova liderança; e está suficientemente longe de Luís Montenegro (num órgão não executivo como é o Conselho Nacional) para se distanciar de eventuais fracassos sem ficar com uma única mancha na gravata.

Marques Mendes

Luís Marques Mendes protagonizou neste fim de semana o seu primeiro ato de campanha para as próximas eleições presidenciais. Teve a distinção de ser expressamente chamado à sala, ao microfone, pelo presidente da Mesa do Congresso; teve a honra de ser o único a entrar no recinto por uma porta ao lado do palanque; teve a habilidade de tomar o seu tempo, acenando aos congressistas e cumprimentando alguns notáveis pelo caminho; teve o simbolismo de se sentar na primeira fila ao lado de Luís Montenegro; e teve o distanciamento institucional para só ficar no Congresso o tempo indispensável para ser visto e aplaudido, saindo pouco depois para não se envolver excessivamente nas minudências partidárias, acima das quais paira agora de forma etérea. Tudo indica que Luís Marques Mendes está preparado para ser o candidato presidencial do PSD — e que o PSD está preparado para que Luís Marques Mendes seja o seu candidato presidencial. Há alguns anos, um antigo líder afirmou que alguns acontecimentos no PSD estavam “escritos nas estrelas” e até lembrou o astrólogo Zandinga. Agora, não é preciso ser Zandinga para perceber que está escrito nas estrelas que o futuro próximo de Marques Mendes e do PSD se vão cruzar no caminho para Belém.

Os vencidos

Rui Rio

No seu último discurso como líder do PSD, Rui Rio filosofou, de forma poética, que “há sempre princípio, meio e fim”. No seu caso, o “fim” foi rigorosamente igual ao “meio”, que já tinha sido uma cópia do “princípio”. Rio queixou-se de nunca ter tido paz no partido; enunciou as reformas que queria fazer no país; sublinhou que uma delas era a justiça; insistiu que o PSD tem de ser uma “alternativa social-democrata”; e persistiu na recomendação de “consensos” com o PS. Como se dizia dos Bourbons, Rui Rio não aprendeu nada nem esqueceu nada. No último dia do congresso, sofreu uma derradeira humilhação. Este domingo, no Palácio de Cristal, a nova liderança do partido recebeu, com entusiasmo e alegria, um convidado especial: depois de Rui Rio ter saído da liderança por uma janela, o seu arqui-inimigo Rui Moreira entrou no Congresso do PSD pela porta principal.

Paulo Mota Pinto

Tornou-se quase numa nova modalidade desportiva no Congresso: bater em Paulo Mota Pinto. Sempre que alguém criticava a condução dos trabalhos do presidente da Mesa, havia um aplauso entusiasmado. O até agora presidente da Mesa levou mesmo um ralhete de Moreira da Silva pela falta de tolerância para com o candidato derrotado. Mota Pinto sai deste Congresso derrotado em toda a linha. Na quinta-feira era líder parlamentar e presidente da Mesa do Congresso e agora é apenas deputado. Paulo Mota Pinto não conseguiu disfarçar o azedume ao longo de todo o Congresso e o sinal desse mau perder aconteceu quando pegou na pasta, abandonou a sala, pegou no carro e abandonou o Palácio de Cristal antes do discurso do novo líder.

Jorge Moreira da Silva

O candidato derrotado nas eleições internas teve uma pequena vitória moral neste Congresso. Quando, a dada altura do seu discurso, o presidente da Mesa, Paulo Mota Pinto, lhe lembrou que o tempo para falar se estava a esgotar, Jorge Moreira da Silva pediu “tolerância” e a assistência apoiou-o com um aplauso. Percebendo a direção do vento, Paulo Mota Pinto recuou e disse-lhe que, sendo essa a vontade “inequívoca” dos congressistas, teria todo o tempo para discursar. Mas somos forçados a admitir que Mota Pinto tinha razão em tentar apressar o final daquele arrastado momento derradeiro da campanha que foi solidamente derrotada por Luís Montenegro. Jorge Moreira da Silva foi ao Porto assegurar que continuará a pensar o que sempre pensou — e foi também reconhecer que o PSD não pensa o mesmo que ele. Usando o esquema mental daqueles bons alunos que passam todos os apontamentos a limpo usando várias canetas de cor, Jorge Moreira da Silva lamentou que o partido tivesse dispensado o seu plano de salvação da pátria, que consistia em “4 metas, 17 objetivos e 13 missões”. No final do discurso, toda a gente confirmou aquilo de que já suspeitava: Jorge Moreira da Silva nunca será líder do PSD.

Carlos Eduardo Reis

O deputado e antigo líder da JSD de Braga tornou-se numa das principais figuras da fase final do rioísmo. O ponto de viragem foi quando, na tentativa de impeachment ao líder Rui Rio, em janeiro de 2019, uniu os conselheiros da lista que encabeçou ao Conselho Nacional e travou as intenções das tropas de Luís Montenegro. O estatuto que foi construindo no partido teve assim por base as listas que encabeçava ao órgão máximo entre congressos, que depois se consolidou com o conquista de Barcelos ao PS e com a influência que teve na vitória de Rio sobre Rangel. Agora, por ter sido diretor de campanha de Jorge Moreira da Silva, optou por não apresentar lista. Esta auto-imposição retirou-lhe necessariamente poder. Além disso, se Rio lhe devia muito, Montenegro não lhe deve nada. Perdeu, por isso, peso dentro do partido.

Salvador Malheiro

O homem do aparelho de Rui Rio nunca foi propriamente um homem de Congressos. A maior atividade que tinha era sempre nas negociações de bastidores. Em 2018, em Lisboa, chegou a ter um contentor pré-fabricado dentro da FIL só para negociar listas com a equipa de Santana Lopes. Na sexta-feira recebeu Rui Rio em modo casual friday quando o então líder chegou ao Congresso, mas não se viu mais. A tendência será para que Hugo Soares, debaixo do guarda-chuva de Montenegro, ganhe espaço no aparelho e, na mesma proporção, Salvador Malheiro vá perdendo. Mesmo no distrito de Aveiro, onde o autarca de Ovar é rei e senhor do aparelho, agora será natural uma aproximação das estruturas ao líder, que também é daquele distrito. Salvador Malheiro passa assim de uma das figuras mais influentes no PSD de Rui Rio para a condição de um entre centenas de autarcas.

O ajudante

Pedro Nuno Santos

O PSD precisava de ajuda para ter um saco de pancada que juntasse todos os congressistas em rituais coletivos de ataque ao inimigo externo. E esse saco de pancada materializou-se, a poucos dias do Congresso, na figura de Pedro Nuno Santos, que, com a sua decisão e posterior recuo forçado em relação ao novo aeroporto de Lisboa, se transformou num símbolo dos problemas do governo. O ministro das Infraestruturas tornou-se, assim, num ajudante involuntário da nova liderança do PSD, atraindo para si todas as críticas. Em tempos, circulou nas redes sociais um pequeno vídeo onde Pedro Nuno Santos, que é praticante de boxe, distribuía pancadaria com enorme afinco. Este fim de semana, experimentou a sensação de estar do outro lado.