Os vencedores
Rui Rocha
Não conseguiu aprovar novos estatutos, o que, mesmo assim, é só meia derrota. Isto porque o grande objetivo da direção era mesmo que a proposta da oposição não fosse aprovada. Ficou tudo na mesma e isso não é nada preocupante para Rui Rocha. Além disso conseguiu aprovar o segundo grande documento que apoiou na reunião magna: um novo programa político. Apesar da Convenção ser estatutária, há críticos da direção que podiam aproveitar para atirar ao líder. Mas isso não aconteceu. A forma como Rui Rocha se colou a Cotrim faz com que o presidente da IL tenha chegado a esta Convenção em cima de um sucesso eleitoral. Esteve longe de ser a Convenção em que Rui Rocha se afirmou como um líder carismático dos liberais, mas ninguém contestou a sua liderança. E isso, nesta altura, não é pouco.
João Cotrim Figueiredo
Mesmo não sendo fundador do partido, como não se cansa de repetir, João Cotrim Figueiredo é cada vez mais uma espécie de Mário Soares da IL. Ou, no mínimo, um António Costa da IL – uma vez que é o antigo líder querido que optou por ir para a Europa. Comparações à parte, o que é inegável é que o facto de ter sido o primeiro deputado eleito da IL e de ter saído pelo próprio pé com desapego pela liderança, tornam-no na principal referência do partido. A quase indiferença que mostra relativamente às batalhas internas (“não percebo nada de estatutos”) – mesmo que esteja sempre ao lado da atual direção e dos que eram os seus antigos muchachos – também ajudam a que seja uma das figuras menos contestadas. A juntar a isso tem aquilo que os liberais mais apreciam: resultados. Depois de ser eleito o primeiro deputado em 2019, de passar para 8 o número de deputados em 2022 e de ter o melhor resultado de sempre em 2024, Cotrim merece o prémio de gestor do ano da grande empresa IL. O facto de a Convenção ser tão colada às eleições europeias, acabou por ser um momento de consagração do antigo líder. Está tão à vontade que até cita Lenine do púlpito e acaba aplaudido com estrondo. João Cotrim Figueiredo afirmou assim a sua condição de senador do partido. Porventura, o único.
Bernardo Blanco, João Caetano Dias e Abrantes Amaral
Houve uma troika de liberais que ficou responsável pela apresentação e defesa do novo programa político: Bernardo Blanco, João Caetano Dias e André Abrantes Amaral. Dos três, André Abrantes Amaral (que é colunista do Observador) fez o discurso mais elogiado e aplaudido da Convenção. De tal forma, que o presidente do partido fez questão de se levantar para felicitá-lo logo após terminar o discurso. Mas o programa foi aprovado (com 511 votos a favor e apenas 11 contra) e o mérito dessa aprovação – mais fácil do que os estatutos, já que bastava a maioria simples – é também dos três proponentes, que evitaram uma postura de confrontação e respeitaram, a partir do púlpito, as várias críticas que foram realizadas.
Os vencidos
Tiago Mayan Gonçalves
Há um ano e meio a oposição interna representava meio partido. Rui Rocha venceu com 51,7% dos votos, o que significa que quase metade da IL não tinha votado nele. Entrentanto, Carla Castro, que teve 44% dos votos no início de 2023, saiu do partido e o principal rosto da oposição passou a ser o antigo candidato presidencial, Tiago Mayan Gonçalves. Para afirmar a oposição, através do movimento Unidos pelo Liberalismo, Mayan escolheu a revisão dos estatutos como principal cavalo de batalha. Era uma espécie de primeiro teste à força da oposição, mas não correu bem. A proposta que apoiou teve apenas (28,97%), muito aquém dos quase 60% da que era apoiada pela atual direção. Se quer desafiar a liderança de Rui Rocha dentro de meio ano, Mayan tem um longo caminho a percorrer. Para já, sai de Santa Maria da Feira com uma clara derrota.
Miguel Ferreira da Silva
Desde que se tornou crítico da direção não tem dado descanso, mas o sucesso tem sido reduzido. Começou nos tempos de Cotrim Figueiredo quando apresentou uma moção que acusava a IL de estar a derivar para um “partido de protesto” — e que foi chumbada; prosseguiu com o apoio à candidatura derrotada de Carla Castro, na mesma altura em que encabeçou uma lista ao Conselho Nacional que fazia frente à escolha da corrente da liderança; e agora era o primeiro subscritor da proposta de estatutos que não estava alinhada com a direção. Até podia não ter vencido porque eram precisos dois terços (e nem a proposta do Conselho Nacional conseguiu), mas também não convenceu: a proposta foi chumbada e teve mais votos contra do que a favor. No rescaldo, se Ferreira da Silva podia ser visto como um dos rostos dos desalinhados que nos tempos de Carla Castro valiam quase metade do partido, acabou por ver esse apoio reduzido a menos de 30%. O primeiro teste não foi bom, agora é esperar para ver qual será o próximo passo de Miguel Ferreira da Silva e o que fará na próxima convenção eletiva.
Miguel Barbosa
É o presidente do Conselho de Jurisdição da IL e foi o responsável pela apresentação e defesa da proposta do grupo de trabalho estatutário do Conselho Nacional. Apesar da bênção e pedidos de vários membros da direção (e dos apoios de peso de João Cotrim Figueiredo e Rui Rocha), a proposta teve o voto a favor de uma maioria simples, mas sem os dois terços necessários para que o partido passasse a contar com novos estatutos. Além dos longos meses de trabalho, a convenção dedicou oito horas à discussão dessas ideias e no final ficou tudo na mesma e são os estatutos atuais que ficam em vigor. Miguel Barbosa, como o rosto desse documento, acaba por ser um dos vencidos da reunião magna.
O atacado
Luís Montenegro
Logo no discurso de abertura da Convenção, Rui Rocha fez um discurso de 20 minutos e, apesar de se assumir como “oposição”, fez uma única crítica ao Governo: ter perdido a vontade privatizar a TAP. Cotrim admitiria depois que o Executivo está a avançar, ainda que timidamente, com várias das ideias liberais. A IL parecia até ao último quarto de hora da Convenção mais um parceiro que oposição construtiva, mas Rui Rocha elegeu um único adversário político no seu discurso de encerramento. Não atacou a esquerda, só bateu no PS en passant, concentrando os esforços no ataque ao Governo da AD. Desde logo com uma primeira frase dura para Montenegro: “É difícil tirar o PS do poder, mas é igualmente difícil tirar as ideias socialistas do poder, mesmo quando não é o PS que está no poder”. E a partir daí atirou sempre ao Governo de Montenegro, que acusou de anunciar políticas económicas que não dão o crescimento que desejado (o “pacotão” da economia) nem permitem diminuir o desemprego jovem. Acusou o Governo de “não tomar as medidas certas do lado da oferta” na habitação. Criticou ainda o facto de “mesmo com o Governo da AD” não ser possível escolher uma creche privada quando não há vaga no público. Atacou, com estrondo, a medida-bandeira do IRS jovem. E, por fim, ainda disse que há um momento em que os jovens vão perceber que “a AD não vai mudar nada de estrutural”. No discurso em que fala para fora, para o país, o alvo de Rocha foi claro: Luís Montenegro.