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Russia-Ukraine War
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É no domínio da aviação que a tecnologia está mais a evoluir neste conflito

Anadolu Agency via Getty Images

É no domínio da aviação que a tecnologia está mais a evoluir neste conflito

Anadolu Agency via Getty Images

"Táticas do século XX, armas do século XXI." O conflito na Ucrânia mudou a forma de fazer a guerra?

A guerra na Ucrânia, o maior conflito na Europa desde 1945, ocorre numa altura em que a nova tecnologia militar pode fazer a diferença. É isso que mostra a experiência no terreno?

Foi em redor da Ilha das Serpentes, um pequeno território de apenas 17 hectares no Mar Negro, que se travou uma das batalhas aéreas e navais mais intensas desde o início da invasão. Conquistada pela marinha russa logo no dia 24 de fevereiro, a Ucrânia nunca desistiu de a recuperar devido ao seu valor estratégico: quem controlar militarmente aquele pedaço de território pode criar ou evitar disrupções nas rotas marítimas ucranianas. Para auxiliar na missão de retomar o seu controlo, Kiev contou com tecnologia de ponta — que acabou mesmo por fazer a diferença no terreno.

Um dos momentos mais celebrados pelos ucranianos neste território aconteceu no início de maio e levou mesmo à divulgação de um vídeo pelas forças ucranianas. Com a ajuda de drones Bayraktar TB2, produzidos na Turquia, a marinha da Ucrânia conseguiu aniquilar um helicóptero russo. Noutros ataques à Ilha da Serpente, a Ucrânia destruiu um lança-mísseis, tanques e outros alvos militares, que enfraqueceram a posição da Rússia na Ilha da Serpentes.

Ao controlo e ao poderio naval russo no Mar Negro, a Ucrânia respondia com uma estratégia que combinava “o uso várias forças e métodos de destruição”, entre os quais os drones. E esse terá sido um dos componentes que levou à vitória: a 30 de junho, os militares russos abandonaram a Ilha da Serpente, alegando ter-se tratado de um “gesto de boa vontade”.

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Esta pode ser a prova de como as novas tecnologias militares podem ajudar a ganhar uma guerra, mesmo quando o adversário possui um maior número de meios convencionais à sua disposição. A invasão da Ucrânia, um dos maiores conflitos desde 1945, pode mesmo revolucionar a forma como se combate no terreno com a utilização de drones (que, em parte, permitiram que Kiev retomasse o controlo da Ilha da Serpente), veículos marítimos não tripulados ou mesmo a inteligência artificial. O objetivo é aumentar a precisão dos ataques, infligindo, com o menor custo possível, o maior número possível de perdas ao inimigo. Em simultâneo, também se procura utilizar menos militares.

A Ilha das Serpentes

DigitalGlobe/Getty Images

Ainda assim, como nota o The New York Times, este conflito continua a combinar principalmente ataques de artilharia pesada com táticas militares da altura da II Guerra Mundial — sendo, por conseguinte, uma típica guerra de desgaste. Acrescente-se que muito do armamento deste conflito é do tempo da União Soviética, como ficou provado com o míssil soviético S-300 que caiu na Polónia — de que ambos os países dispõem e cujo fabrico data da década de 1980.

Ao Observador, Mark F. Cancian, membro do Center for Strategic and International Studies (CSIS) e ex-estratega militar na Casa Branca, rebobina ainda mais atrás e descreve que este conflito tem “linhas da frentes que se assemelham à Primeira Guerra Mundial com armas do século XXI”. No entanto, o especialista militar destaca que o armamento de hoje tem-se caracterizado pela “eficácia” e tem dado vitórias a ambos os lados da guerra.

"Este conflito tem linhas da frentes que se assemelham à Primeira Guerra Mundial com armas do século XXI"
Mark F. Cancian, membro do Center for Strategic and International Studies (CSIS) e ex-estrategista militar na Casa Branca

Por sua vez, Marina Miron, investigadora na área da defesa e segurança no King‘s College London, traça um cenário idêntico, ainda que chame à atenção para o facto de a “Rússia não estar interessada em usar as melhores armas na Ucrânia”: “Por isso, vê-se muito armamento soviético no terreno.” Do lado da Ucrânia, que até pouco antes da invasão não esperava ter de travar um conflito no seu próprio território, não houve uma preparação atempada, o que levou a que as forças de Kiev combatessem com equipamento “obsoleto”.

Houve, ainda assim, um game changer, na opinião de Marina Miron, em declarações ao Observador: “A Ucrânia beneficiou em receber, em alguns casos, a mais moderna tecnologia militar do Ocidente.” Mas também a Rússia procurou aliados que lhe pudessem dar armas em outras geografias, tais como o Irão.

Drones invadem campo da aviação

É no domínio da aviação que a tecnologia mais evoluiu neste conflito. Caças, helicópteros e aeronaves, muitos deles ainda do tempo da União Soviética, continuam a ter um papel importante nesta guerra. Porém, um novo equipamento parece estar a substituir muitas das suas funções: os veículos aéreos não tripulados, isto é, os drones. Equipamentos que, como já foi mencionado, deram uma importante vantagem à Ucrânia no objetivo de recuperar o controlo da Ilha das Serpentes.

Não é apenas o lado ucraniano que tem empregado drones em benefício próprio. Também a Rússia os tem usado — e até com mais precisão. Para Mark F. Cancian, um “novo desenvolvimento considerável” que trouxe este conflito foram os chamados drones kamikaze, como os HESA Shahed 136, de fabrico iraniano: “Apesar de existirem já há algum tempo, é a primeira vez que são usados em tempo de guerra.”

Carregando até 40 quilos de explosivos — que detonam assim que atingem o alvo — na dianteira, os drones kamikaze iranianos podem atingir os 165 quilómetros por hora, uma velocidade que Mark F. Cancian caracteriza como “lenta”. No entanto, como explica o porta-voz da Força Aérea ucraniana, Yuriy Ihnat, este equipamento “pode voar em bandos”, o que torna mais difícil a deteção nos radares: “Aparece apenas uma marca, embora sejam cinco drones”. Consequentemente, os sistemas de defesa aérea têm mais dificuldades em atingi-los: “É um alvo difícil, muito pequeno.”

A Ucrânia tem alegado, por sua vez, que os sistemas de defesa aérea têm conseguido destruir mais de 60% dos drones kamikaze lançados pela Rússia. “São vulneráveis”, adjetiva Mark F. Cancian. Ainda assim, embora possam acabar inutilizados, Moscovo continua a usá-los. O motivo? São relativamente baratos, custando cerca de 20 mil euros cada um. Em comparação, o drone turco Bayraktar TB2 tem um preço que se aproxima de um milhão de euros por unidade.

Em termos mais práticos, este equipamento tem sido o método preferencial para a Rússia “danificar consideravelmente o sistema elétrico ucraniano”, afirma Mark F. Cancian. Nos últimos dias, Moscovo tem atacado, com relativo sucesso, pontos estratégicos em várias cidades da Ucrânia — o que faz com que a população fique sem luz e sem água. Aliás, de acordo com o ex-estratega militar na Casa Branca, esta finalidade também é recente num conflito entre dois países.

Um drone Shahed-136 que caiu perto da cidade de Kupiansk, na Ucrânia

Wikimedia Commons

Apesar de estar desvantagem face à Rússia, o lado ucraniano tem à disposição equipamentos militares de origem turca e os Estados Unidos também já enviaram drones de curto alcance — os Switchblade e os Phoenix Ghost. Os últimos “são a nova onda do futuro”, descreve Mark F. Cancian, que ressalva que a “sua eficácia ainda não é conhecida” por completo. Este pequeno objeto, que pesa 15 quilos e mede 130 centímetros, é capaz de destruir equipamento de maior dimensão, como carros de combate blindados. “Estão a ser usados para substituir o combate e as armas antitanques”, diz ainda o ex-estratega militar na Casa Branca.

Relativamente aos turcos Bayraktar TB2, esta não é a primeira vez que são usados no campo de batalha. No conflito que opôs a Arménia ao Azerbaijão em 2020, Ancara forneceu alguns destes drones a Baku, um dos seus tradicionais aliados, que os usou no terreno. Embora a posição ambígua no que diz respeito à relação diplomática com a Rússia (o Presidente Recep Tayyip Erdoğan posiciona-se contra a aplicação de sanções ao Kremlin, mas a favor de que Kiev recupere os territórios ocupados), a Turquia ofereceu este equipamento militar à Ucrânia.

Os TB2, com uma envergadura de 12 metros e um comprimento de aproximadamente 6,2 metros, carregam bombas guiadas por laser, pautando-se por atingir o alvo com precisão. No entanto, apesar de terem sido “úteis” para algumas operações militar, “não são novos”, salienta Mark F. Cancian, acrescentando que “não estão em número suficiente no terreno para fazer uma grande diferença operacional”.

Esta posição é corroborada por Jack Watling, analista militar do instituto britânico Royal United Services Institute. Em declarações à Associated Press, Watling destacou que estes drones “não têm um impacto significativo, porque são equipamentos que voam em altitudes médias e em voo lento, transmitindo um grande número de ondas eletromagnéticas”. O resultado? Os sistemas de defesa aérea russos conseguem abatê-los: “O terreno é muito aberto e oferece uma boa cobertura de radar.”

Marina Miron considera que as “Forças Armas da Ucrânia beneficiariam da entrega de drones” turcos, mas enfatiza que, internamente, Kiev também soube dar resposta à necessidade deste equipamento militar. “Muitas empresas de drones [ucranianos] fizeram grandes avanços em termos da manufatura e na conversão de drones de uso recreativo para militar”, vinca a especialista do King‘s College London, que também frisa que se aprenderam “lições”, nomeadamente “na área da defesa de mísseis hipersónicos e na de drones”.

Ukraine successfully tests Bayraktar TB2 UAV

Um Bayraktar TB2

Getty Images

Javelins, Howitzers, HIMARS: a vantagem no terreno da Ucrânia (patrocinada pelo Ocidente)

Na linha da frente, no terreno de combate, a guerra também se tem tentado moldar a novas circunstâncias que a tecnologia permite, mas de forma mais esbatida do que na aviação. No entanto, ao contrário da aviação, não houve, pelo menos por enquanto, uma invenção como a dos drones. “É uma grande surpresa, a durabilidade da artilharia”, comenta Mark F. Cancian, sublinhando que “poucos especialistas esperavam isso”.

Além de a tecnologia não ter avançado de forma considerável, estas “linhas da frente do século XX” — como Mark F. Cancian evidenciou — revelam uma natureza anacrónica. As lições da Segunda Guerra Mundial fizeram com que a prioridade passasse a ser a aviação, mas, na guerra da Ucrânia, isso não se verifica — a artilharia continua a ser o mais importante. Numa análise publicada na revista National Defense, o jornalista, especialista em assuntos relacionados com a Defesa, Michael Peck, assume mesmo que as “armas grandes estão de volta”.

“Desde 1945, a aviação substituiu as grandes armas como principal maneira de atacar, principalmente nas Forças Armadas do Ocidente. As aeronaves eram vistas como um instrumento de alta tecnologia que necessitava de poucos homens — e desferia ataque precisos”, indicou Michael Peck, afirmando, por sua vez, que, na guerra da Ucrânia, “o poder aéreo desempenha um papel relativamente limitado, enquanto a artilharia emergiu como dominante”. 

"O poder aéreo desempenha um papel relativamente limitado, enquanto a artilharia emergiu como dominante". 
Michael Peck, jornalista especialista em assuntos relacionados com a Defesa

Neste cenário, as maiores novidades da artilharia têm vindo do lado ucraniano, já que a Rússia tem apostado sobretudo em equipamento da época soviética. Aliás, o Presidente da Rússia, Vladimir Putin, anunciou, esta quinta-feira, o envio de armas mais “modernas” para o terreno, reconhecendo ser “importante não apenas aumentar o volume e a variedade dos fornecimentos, mas também melhorar a sua qualidade”.

Putin ordena envio de mais armamento “de qualidade” ao Exército russo

Poucos adivinhariam, no início do conflito, que a Ucrânia viesse a ficar na posse de equipamento militar russo, mas isso acabou mesmo por acontecer, principalmente após a debandada das tropas russas em Kharkiv e a retirada — se bem que mais organizada — de Kherson. De acordo com a última contabilização, Moscovo terá já perdido cerca de 1.400 tanques desde 24 de fevereiro, o que dá uma vantagem inequívoca a Kiev, que tem melhorado as capacidades dos equipamentos militares abandonados.

Consciente de que a Rússia não tem empregado o melhor equipamento de que dispõe no terreno, mas também com uma clara noção das debilidades da Ucrânia a este nível, o Ocidente tem enviado equipamento militar relativamente moderno para ajudar o exército ucraniano. Para Marina Miron, os “javelins, howitzers e os HIMARS” causaram uma “força disruptiva” no terreno.

Os mísseis antitanques javelins podem não ser os mais recentes (foram desenvolvidos nos Estados Unidos no final da década de 1990), mas fizeram a diferença, tendo sido dos primeiros a ser enviados para o terreno. Os militares ucranianos ficaram tão agradecidos com a oferta norte-americana que até foi criada uma conta nas redes sociais em homenagem a este armamento. O seu nome? “Saint Javelin, o protetor.”

Yohann Michel, analista do Instituto Internacional dos Estudos Estratégicos, explicou, ao jornal El País, o motivo pelo qual os javelins se tornaram um ícone: “Trata-se de uma arma muito capaz, desenhada para atacar a torre de artilharia, que costuma ser a zona menos protegida de qualquer tanque”. “A eficácia aumenta, neste caso, porque [os tanques russos] armazenam as munições nas torres ou pouco atrás com muito pouca proteção, ao contrário dos tanques europeus ou norte-americanos, que as têm melhor salvaguardadas”, acrescenta.

Assim sendo, quando o míssil atinge a torre de artilharia, explode com o depósito de munição — e o tanque torna-se inoperacional para atacar.

Russian Forces Withdraw From Towns Around Kharkiv

Soldado a empregar um javelin em Kharkiv

Getty Images

No que toca aos obuses, conhecidos como os canhões dos tempos modernos que disparam projéteis de forma mais precisa (alguns incluem mesmo um GPS), desempenharam um papel fundamental para que a Ucrânia suportasse a ofensiva russa. Os Panzerhaubitze 2000 (da Alemanha), os M777 (de origem britânica e norte-americana) e os César (de França) foram alguns dos equipamentos militares mais eficazes.

Maksym Bohachuk, um professor de história ucraniano de 29 anos que durante a guerra acabou por tornar-se comandante de um batalhão, referiu ao Washington Post que os “obuses podem não ter mudado o curso da guerra, mas estão a acelerar a vitória”. Porquê? O especialista militar ucraniano, Oleh Zhdanov, justificou à Associated Press que estes equipamentos “são superiores [às armas] análogas soviéticas” e dão superioridade a Kiev.

Artillery units stationed on the Kherson fronts provide intense fire support to the Ukrainian army

Howitzers em Kherson

Anadolu Agency via Getty Images

Ainda na artilharia, outro dos equipamentos militares que faz a diferença — e que é temido pelos russos — são os HIMARS (sigla em inglês para High Mobility Artillery Rocket System). A sua eficácia deve-se essencialmente à rapidez com que funcionam, sendo capazes de, em aproximadamente dois minutos, disparar 108 foguetes de 23 centímetros. Estrategicamente, este equipamento militar permite que as forças da Ucrânia consigam atingir alvos que estão para além da linha de defesa russa, dando origem a ataques imprevisíveis e que podem danificar, por exemplo, armazéns de armamento.

HIMARS. O “amigo de confiança” americano que está a ajudar a Ucrânia a virar a guerra

Na contraofensiva ucraniana no sul do país, os HIMARS foram fundamentais para obrigar os russos a recuar as suas linhas defensivas. Andrii Pidlisnyi, soldado ucraniano de 28 anos que deu mais detalhes à CNN internacional sobre o sucesso que levou à reconquista da cidade de Kherson, reconheceu que este equipamento teve um papel primordial, infligindo às tropas russas “grandes perdas”.

Os veículos não tripulados marítimos: a vantagem da marinha da Ucrânia

Numa guerra em que o objetivo primordial foi conquistar território, a artilharia e a aviação são os dois componentes que se impõem. Mas a marinha é igualmente importante, quanto mais não seja porque a Rússia e a Ucrânia partilham o Mar Negro, que banha aquela que é tida como a joia da coroa para Moscovo, que já a ocupa desde 2014: a península da Crimeia. 

“De forma muito criativa.” É assim que Mark F. Cancian define a maneira como a Ucrânia tem reagido à superioridade russa. Como? Com tecnologia, nomeadamente recorrendo a veículos de superfície não tripulados, que, de acordo com o especialista militar, têm atacado “navios russos em portos”. A Forbes vai mais longe ainda: diz que “a Ucrânia tem ganhado a guerra graças aos barco-drones”.

Um veículo marítimo não tripulado

Twitter/Ville Vanska

Existe já um exemplo paradigmático de quão eficazes são estes veículos: há cerca de uma semana, a Ucrânia atacou uma das principais bases navais russas no Mar Negro, em Novorossiysk, com este equipamento. O momento foi registado pelas câmaras de vigilância do porto, sendo visível a destruição que causou a uma fragata Admiral Makarov de 125 metros de comprimento.

Esta é uma mudança na estratégia naval da Ucrânia, que inicialmente tentava combater com meios mais convencionais. Não obstante, os dirigentes de Kiev cedo perceberam a superioridade da Rússia e apostaram em tecnologia mais disruptiva. Como nota a Forbes, isso faz com que o Mar Negro não seja mais um lugar seguro, aumentando a imprevisibilidade e a precisão dos ataques — sem a necessidade de travar grandes batalhas.

“Um país quase sem marinha operacional conseguiu surpreender o inimigo na sua base”, comentou o comandante de infantaria finlandês, Ville Vänskä, na sua conta pessoal do Twitter, acrescentando que os “sistemas não tripulados estão a desenvolver-se de forma muito mais rápida do que a tecnologia inicialmente previa”. O responsável naval explica que isso se deve ao “desenvolvimento técnico e preço baixo”, mas também por colocar “a vida humana menos em risco”.

"Um país quase sem marinha operacional conseguiu surpreender o inimigo na sua base"
Ville Vänskä, comandante de infantaria finlandês

Na ótica de H I Sutton, um analista de defesa, com o uso destes veículos marítimos não tripulados é possível “vislumbrar o futuro da guerra naval”. Ao Financial Times, o especialista frisou que nenhum navio russo terá sido destruído — apenas terá sido danificado —, mas o uso deste equipamento tem uma “implicação estratégica”, tornando os portos russos “cada vez menos seguros”. “E isso vai influenciar a maneira como a marinha russa posiciona os navios.”

Terra, ar, mar. E Espaço?

Embora se tenham verificado melhorias em todos os ramos das Forças Armadas nesta guerra, Marina Miron considera que “o maior avanço em termos tecnológicos que foi empregado para fins militares foi o uso do Starlink”, a constelação de satélites detida pela SpaceX — de que o magnata norte-americano Elon Musk é dono — e que permitem um acesso à internet mais rápido a partir do Espaço. “Isso permitiu que as forças ucranianas tivessem permanecido online durante a guerra”, diz a especialista.

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Os satélites do Starlink

Burhan Ates/Anadolu Agency via Getty Images

“O Starlink, juntamente com outros satélites do Ocidente, ajuda a reforçar as capacidades do ISTAR [sigla em inglês para inteligência, vigilância, aquisição de alvos e reconhecimento] ucranianos”, afirma a investigadora do King‘s College London, declarando que “as maiores mudanças” tecnológicas de uma guerra “não tiveram lugar no campo de batalha, mas muito longe dele”. 

Isto, continua Marina Miron, apesar de estas capacidades serem “intangíveis” e, por conseguinte, “receberem menos atenção”. “A habilidade de recolher dados fiáveis”, ao mesmo tempo “que se recebe informações no timing certo”, “são, sem dúvida, mais importante do que a última geração de armas”.  

A especialista na área da defesa indica que não é “apenas Elon Musk a ajudar com estas capacidades”, lembrando que a Microsoft e a Palantir também o fazem. Relativamente à empresa fundada por Bill Gates, o atual diretor presidente da tecnológica, Brad Smith, anunciou, na WebSummit, que ia estender “para 2023 todas as tecnologias que se fornece à Ucrânia no início da guerra”, reforçando esse apoio em mais 100 milhões de dólares. Esta atitude revela-se diferente da tomada pelo dono do Twitter e da Tesla, que chegou a colocar em cima da mesa a hipótese de deixar de financiar o serviço, algo que levou a que o Pentágono e a Comissão Europeia ponderassem começar a pagar ao magnata norte-americano pelo Starlink na Ucrânia.

Microsoft reforça apoio tecnológico à Ucrânia em 100 milhões de dólares para 2023.

Estas tecnologias levaram a que a “Ucrânia superasse a Rússia” na área da recolha de informações, vinca Marina Miron, que sublinha que, perante esta desvantagem, Moscovo está agora “a repensar as suas capacidades no Espaço e os programas espaciais em vigor”. “Está a haver uma grande reestruturação”, aponta a especialista.

Longe ficam as utopias da inteligência artificial (AI, sigla em inglês). Para Mark F. Cancian e Marina Miron, esta guerra ainda não trouxe desenvolvimentos deste género. Por muito que a especialista da King‘s College London tenha referido que houve algumas tentativas de a integrar em sistemas cibernéticos, isso ainda é pouco significativo. “Não penso que a AI seja suficientemente madura para ter uma contribuição significativa no campo de batalha. É difícil apontar alguma circunstância em que tenha sido um fator decisivo”, remata o ex-estratega militar na Casa Branca.

"Não penso que a AI seja madura suficiente para ter uma contribuição significativa no campo de batalha. É difícil apontar alguma circunstâncias em que tenha sido um fator decisivo"
Mark F. Cancian, membro do Center for Strategic and International Studies (CSIS) e ex-estrategista militar na Casa Branca

A superioridade da tecnologia nota-se no terreno?

A questão é difícil de responder, mas os dois especialistas ouvidos pelo Observador coincidem na ideia de que a tecnologia pode ter ajudado, sim; mas não foi decisiva no decorrer destes nove meses. 

Marina Maron lembra o que aconteceu na reconquista da cidade de Kherson pelas forças de Kiev. Apesar de reforçar que “o apoio do Ocidente foi crucial” para o lado ucraniano, é “muito improvável dizer que mudou o curso da guerra”. “É necessário entender que os sucessos no campo de batalha não se deveram apenas a armas superiores. Certamente que atuaram como força disruptiva, forçando os russos a reajustar as suas abordagem táticas e operacionais.”

Ukrainian civilians celebrate Russian retreat from Kherson

Kherson foi tomada mais por uma questão estratégica, acredita Marina Maron

Metin Aktas/Anadolu Agency via Getty Images

Contudo, realça a especialista, os “sucessos também se deveram ao facto de o contingente russo” estar pouco organizado. Em Kherson, os russos “compreenderam que não tinham hipótese de defender a margem direita do rio [Dnipro] e retiraram-se para a margem esquerda”: “Não foi por causa de nenhuma tecnologia militar. Foi uma decisão militar estratégica.”

“No geral, as forças ucranianas conseguiram capitalizar os erros no campo de batalha cometidos pelos russos. Não têm a ver com tecnologia militar per se“, completa Marina Maron. Sem embargo, mesmo que o apoio do Ocidente com armas mais sofisticadas possa até não dar a vantagem que equivaleria a uma vitória, é um sinal de que a NATO confia na Ucrânia. “As forças ucranianas têm um aumento de moral ao perceber que estão a ser apoiadas”, concretiza.

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