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Quem já ouviu o primeiro episódio da “Operação Papagaio” sabe que o novo Podcast Plus do Observador é sobre o plano mais louco para derrubar Salazar. Não foi fácil descobrir esta história. Não havia apenas uma versão do que tinha acontecido — havia várias e todas contraditórias entre si. Pior: cada uma delas era curta, com pouca informação e ainda menos detalhes. Pior ainda: nenhuma delas era verdadeira. Perante tudo isto, havia até a dúvida, legítima mas angustiante, sobre se a “Papagaio” teria mesmo existido. |
A Tânia Pereirinha e o João Santos Duarte começaram a fazer perguntas, a entrevistar pessoas e a consultar jornais da época. Alguém dizia que os membros do grupo que levou a cabo a “Operação Papagaio” tinham sido interrogados pela polícia política e que os agentes da PIDE tinham precisado de interromper os interrogatórios para se irem rir às gargalhadas lá fora. Se isto fosse mesmo assim, então tinha que haver algum registo no arquivo da PIDE, que está guardado na Torre do Tombo. A Tânia pediu que fosse feita uma pesquisa por “Operação Papagaio”, mas a resposta foi desanimadora: “Não foram localizados documentos referentes à ‘Operação Papagaio’. Cumprimentos”. |
Entretanto, tinham sido pedidos mais ficheiros, dos vários artistas surrealistas e revolucionários profissionais que teriam estado envolvidos na tentativa de golpe. Pasta após pasta, nada. Até que chegou à secretária onde a Tânia estava sentada uma pasta com o processo do homicídio do capitão Almeida Santos, o caso que deu origem ao romance “A Balada da Praia dos Cães”, de José Cardoso Pires. Inicialmente, pensou que fosse um engano, aquilo não tinha nada a ver com a “Papagaio”. Mas, depois, começaram a aparecer os nomes de alguns dos poetas do grupo surrealista e referências a bobines e ao Rádio Clube Português. Ora, aquela operação pretendia, precisamente, derrubar o regime através da emissão clandestina, no Rádio Clube Português, de uma mensagem revolucionária guardada numa bobine. Era mesmo aquilo. Mas havia um problema. |
O problema era que os documentos que entregaram à Tânia tinham sido expurgados. É um procedimento normal nos arquivos da Torre do Tombo, por razões de privacidade — mas é também uma frustração. Apesar disso, não desistiu. E, pouco depois, recebeu uma pasta com o nome de Henrique Correia dos Santos Carvalho, mais conhecido como Gavroche, o cérebro da “Papagaio”. Eram 144 páginas e guardavam toda a história nunca contada da operação que agora se transformou num podcast. |
Durante os meses seguintes, a Tânia e o João conviveram de perto com Gavroche — e acabaram por se afeiçoar a uma das fixações dele: os pseudónimos. Sempre que alguém novo se juntava ao grupo de revolucionários, tinha de ter um pseudónimo, para confundir a PIDE. Quando as nossas gravações começaram, alguém decidiu fazer o mesmo. O João passou a ser o “Cândido”; a Tânia escolheu chamar-se “Gina”; o sonoplasta Diogo Casinha era agora o “Alberto”; e o ator Miguel Guilherme, que é o narrador do podcast, escolheu ser o “Amílcar”. Era por esses nomes que eles se tratavam no estúdio e fora dele, nas muitas mensagens que foram trocando. Temos de admitir que não é um método de trabalho convencional, mas funcionou. |