Há uma guerra na Europa e ninguém a discute na campanha eleitoral portuguesa. O que é muito estranho por várias razões.

Antes de mais, a guerra pode alastrar-se para fora das fronteiras da Ucrânia. Aliás, ontem assistiu-se a uma escalada nas declarações políticas. Após uma cimeira sobre a guerra, Macron afirmou que os países da União Europeia poderão ser forçados a enviar tropas para a Ucrânia. O Presidente francês foi imediatamente desmentido pelo Chanceler alemão. Mas há um ponto em que Macron está certo. Uma derrota da Ucrânia seria igualmente uma derrota da União Europeia, e teria implicações muito graves para a segurança da Europa.

Putin avisou logo que o envio de tropas europeias para a Ucrânia significa uma guerra entre a Rússia e a NATO. E não é a primeira vez que Putin ameaça atacar um país da Aliança Atlântica. Quase toda a gente acha que as ameaças de Putin não são para levar a sério. Não deixa de ser extraordinário. Em 2007, ninguém achava que Putin ia atacar a Geórgia. Atacou. Em 2014, ninguém acreditava que Putin conquistasse e anexasse a Crimeia. Conquistou e anexou. Em 2022, só os serviços de inteligência americanos e britânicos é que acreditavam que Putin iria invadir a Ucrânia. Invadiu. O que é ainda necessário para levar as ameaças de Putin a sério?

A guerra na Ucrânia vai ainda alterar a natureza da União Europeia e da NATO e a relação dos Estados membros com essas instituições. A NATO já tem mais dois membros, a Finlândia e a Suécia, desde que começou a guerra. A União Europeia vai iniciar este ano negociações para a adesão da Ucrânia. Se Trump for eleito Presidente em Novembro, a natureza da Aliança Atlântica pode mudar de um modo significativo. Uma coisa é certa. Todos os aliados, incluindo Portugal, vão estar sob uma enorme pressão para investir 2% do PIB em defesa. A possível eleição de Trump também vai provocar mais investimento na defesa europeia, mesmo que não seja eleito. Depois de décadas a desinvestir na defesa, o governo português terá que aumentar as verbas para a defesa. Estas questões são seguramente relevantes para a política orçamental do próximo governo.

Por fim, as reações em Portugal à guerra na Ucrânia dizem muito sobre a natureza dos partidos políticos das esquerdas e sobre a natureza ideológica dos debates públicos. Até hoje, o PCP foi incapaz de criticar a invasão russa. Nem uma crítica. Nada. Os ataques dos comunistas estão todos guardados para a NATO. Merecem ter o pior resultado eleitoral de sempre. O Bloco critica Putin, mas também é contra a NATO e contra a defesa europeia. Gostava muito de ouvir o Bloco explicar como é que os países europeus se protegem da ameaça russa sem a NATO e sem a defesa europeia. E não venham com o discurso vazio e hipócrita de “trabalhar para a paz.” Só pode fazer a paz quem começou a guerra, ou seja, Putin. A incapacidade de defender as instituições que ajudam a guerra de resistência da Ucrânia significa a defesa da paz de Putin: uma paz à custa da independência e da liberdade dos ucranianos.

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Ora, é com estes partidos que Pedro Nuno Santos está disposto a fazer uma coligação governamental. Um populista de trazer por casa, como André Ventura, indigna a maioria dos comentadores portugueses. A possibilidade do PS fazer acordos com um partido incapaz de criticar o ditador imperialista mais perigoso que surgiu na Europa desde Hitler e de Stalin, e com um partido anti-NATO e contra a defesa europeia é vista pelos mesmos comentadores com uma indiferença total ou mesmo com apoio.

Não me venham com o exemplo da geringonça. Em 2015, Putin não tinha começado uma guerra na Europa, invadindo um país por meras razões imperialistas. Em 2024 já o fez. O modo como o PCP e o Bloco reagiram a essa guerra imperialista mostra que nada mudaram. Os seus principais adversários continuam a ser todos aqueles que defendem os valores ocidentais e liberais.

Quem é incapaz de criticar Putin pelo ataque à Ucrânia? Orban, Trump, a AfD e o PCP.

Quem ataca a NATO? Trump e as extremas esquerdas europeias, entre elas o PCP e o Bloco. São estes os partidos que Pedro Nuno Santos gostava de levar para o governo. Quem não se indigna com isto, não dá valor à democracia nem à liberdade dos povos, mesmo que diga o contrário.