Olá, sou uma jovem médica dentista e decidi fazer uma carta aberta a todos os portugueses.
No dia 12 de Agosto vai comemorar-se o Dia Internacional da Juventude. Muitos jovens portugueses vão mesmo comemorá-lo internacionalmente, por estarem emigrados. Segundo o estudo Os Jovens em Portugal, Hoje, publicado no final de 2021 pela Fundação Francisco Manuel dos Santos, 72% dos jovens que trabalham por conta de outrem auferem menos de 950 euros líquidos. Não admira que muitos queiram ir procurar melhores condições lá fora. De 2001 a 2011, a emigração qualificada em Portugal cresceu 88%.
Os médicos dentistas não são excepção. Segundo o mais recente Estudo aos Jovens Médicos Dentistas, promovido pelo Conselho de Jovens da Ordem dos Médicos Dentistas, mais de metade dos jovens não voltariam a optar por medicina dentária.
As faculdades da área publicitam quase 100% de empregabilidade, mas esquecem-se de mencionar a elevadíssima precariedade: quase metade dos jovens médicos dentistas demora mais de um ano a ganhar mais de 750 euros líquidos. Os jovens médicos dentistas ganham tão mal que, no primeiro ano, nem sequer auferem o equivalente ao ordenado mínimo. Não têm direito a subsídio de alimentação, férias e Natal. É o lado negro dos recibos verdes.
Nem os poucos jovens que trabalham para o estado estão melhor: 90% estão a recibos e os 10% que se escapam estão também contratados de forma ilegal como técnicos e não como médicos dentistas, com cargos no papel e pagamento no vencimento que não correspondem à complexidade dos cuidados e responsabilidade que assumem. A título de exemplo, médicos dentistas contratados no SNS através da empresa intermediária Precise auferem cerca de 5,23 euros líquidos por hora.
Numa altura em que muito se fala da fixação de profissionais no SNS, não admira que ainda existam centros de saúde por todo o país equipados com gabinetes de medicina dentária mas sem profissionais para trabalhar.
Estima-se que 16% dos médicos dentistas com menos de 35 anos estajam a exercer a profissão no estrangeiro, a maioria em França. “Brain Drain”, ou “fuga de cérebros”, é o nome deste fenómeno. Dizem não querer voltar porque “o elevado número de profissionais de medicina dentária não permite um emprego com boas condições de trabalho ou rentabilidade” e que se sentem “desvalorizados”. Descrevem “uma profissão que se tornou precária”.
Por isso, peço a todos os portugueses, pais e filhos, que neste momento pensam sobre as cruzes a colocar no boletim de acesso ao ensino superior, que pensem bem sobre os caminhos a seguir. Sigam os sonhos, mas conscientes da realidade.