Só tenho um objectivo com este texto. Contribuir para a reflexão e discussão do tema.

1 Desde que o mundo é mundo que o elemento de caracterização do clima é a mudança. A temperatura, a precipitação, a nebulosidade e qualquer outro fenómeno climático, incluindo a frequência com que ocorrem, é variável e mutável. Às eras glaciares (geológicas, químicas e paleontológicas) sucederam-se períodos de calor. Sabemos que a história geológica e climática do nosso planeta é um registo de desequilíbrios resultantes de factores endógenos (deriva continental, vulcanismo, etc.) e de factores exógenos (ciclo solar, variação orbital, etc.) que provocaram e provocam alteração do clima. Dito de outra forma, o clima é inconstante.

2 Os homens e a sua forma de agregação, a sociedade, dependem da energia. Sempre dependeram. O desenvolvimento da sociedade humana está intimamente ligado à abundância de energia. Sem energia não há desenvolvimento. E eu tenho sérias dúvidas de que seriamos capazes de viver hoje com o mesmo nível de energia que era consumido no início do século dezoito.

3Com os dados recolhidos até agora, não sabemos se o planeta já passou por períodos de idêntica, ou até superior, temperatura. Porém, é inquestionável que a temperatura media do planeta tem vindo a aumentar e que há um nexo entre esse aumento e o desenvolvimento tecnológico originado pela Revolução Industrial.

4 Existe uma profunda cisão quanto à origem das alterações climáticas, i.e., se as causas são naturais ou antropogénicas, discussão essa que só tem contribuído para adiar soluções. Para mim, esta questão é irrelevante. Não importa a causa, importa resolver o problema. Qual é o problema de cuidarmos da nossa casa comum? Qual é o problema de reduzirmos a dependência dos combustíveis fósseis? Qual é o problema em desenvolver indústrias, tecnologias e negócios verdes?

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5 A preocupação com as alterações climáticas é um fenómeno que começa a ser visto a nível mundial, principalmente no âmbito da esfera social. Duas coisas parecem ser prementes e constantes: Primeiro, o impacto ambiental é um problema do presente que exige atenção e respostas imediatas; segundo, não há qualquer dúvida de que a consciência ambiental está a crescer. Nesse sentido, os consumidores, desde que tenham a garantia de que estão a contribuir para a sustentabilidade ambiental, não se importam de pagar mais por produtos amigos do ambiente. Logo, a sustentabilidade também é uma oportunidade de negócio.

6 Apesar da aposta e do crescimento das fontes de energia renováveis – hídrica, solar, eólica, biomassa, geotérmica, oceânica, hidrogénio e nuclear (todas têm os seus problemas) – ainda são os combustíveis fosseis que nos garantem essa abundância. Mas não é descabido afirmar que estamos a viver uma fase de transição, transição essa que, apesar de todos os indicadores positivos que a evolução tecnológica aponta, ainda requer algum tempo para a sua afirmação (talvez a energia solar seja a mais desenvolvida e a última geração de centrais nucleares também demonstra muito potencial). Segundo a EIA, em 2023, cerca de 2,8 triliões de dólares serão investidos em energia, 60,7% dos quais canalizados para as tecnologias verdes.

7 Não podemos, nem devemos, negligenciar o impacto da influência dos combustíveis fósseis na sociedade. Este vai muito para além da energia. Não há área da actividade humana que não esteja ligada, directa e indirectamente, aos combustíveis fósseis. Para ficarem com uma ideia do que estou a dizer, eis uma pequena lista dos produtos que são produzidos a partir do petróleo: solventes, graxas, tinta, cera do chão, esferográficas, inseticidas, pneus, telemóveis, vestuário, perfumes, capacetes, calafetagem, vaselina, Fita transparente, antissépticos, conservantes de alimentos, sabão, cápsulas de vitaminas, anti-histamínicos, acalçado, cortisona, desodorizante, massa de vidraceiro, corantes, refrigerantes, coletes salva-vidas, fita adesiva, epóxi, esfregões, repelente de insectos, guarda-chuvas, fio, fertilizantes, coloração de cabelo, assentos sanitários, batom, adesivo para dentaduras, linóleo, borracha sintética, glicerina, cimento de borracha, corda de nylon, velas, sacos de lixo, canalização, cremes para as mãos, skates, computadores, pranchas de surf, champô, cordas de guitarra, bagagem, aspirina, óculos, anticongelante, escovas de dentes, pincéis, detergentes, vaporizadores, válvulas do coração, paraquedas, esmalte, travesseiros, máquinas fotográficas, anestésicos, relva artificial, próteses e membros artificiais, dentaduras, filme, lentes de contato, creme de barbear, amónia, pasta de dentes, etc.

Para quem não sabe, são cerca de 6000 os produtos derivados do petróleo que utilizamos diariamente na nossa vida. Produtos esses que vão da saúde ao lazer, passando pela educação e agricultura. Entre outras áreas, obviamente.

8Quer isto dizer que não devemos defender a transição para as energias alternativas? Não, pelo contrário. Cada vez mais é urgente pensar em termos de sustentabilidade, pois temos de garantir o futuro dos nossos filhos. Mas é preciso ter a noção que esta transição energética não ocorrerá simultaneamente em todo o mundo (a não ser que seja descoberto algo extraordinário que o possibilite) e que não deixará de ter efeitos. Os responsáveis políticos dos países pobres, e os dos países em desenvolvimento (China, Índia, Brasil, Indonésia e Turquia, por exemplo) não se vão preocupar com tanto com o ambiente se isso tiver impedir o seu crescimento económico. A sua principal preocupação será reduzir a pobreza. Para além disso, esta transição vai gerar tensões geopolíticas e geoeconómicas, e terá custos sociais. Tentar precaver e gerir este tipo circunstâncias vai ser importante para ultrapassar mais rapidamente os problemas.

9Também as políticas de financiamento devem ser revistas. Vai ser necessário não só acabar com os subsídios, como também introduzir taxas “de carbono”, mas tornando-as neutras com a redução de outros impostos (algo que em Portugal, com um governo socialista, dificilmente acontecerá). Depois é preciso evitar a radicalização do discurso e das acções. Posições radicais não contribuem para a solução do problema. Não se defende o ambiente pela radicalização, principalmente com posturas incoerentes e irracionais. Não é à bruta que se vão atingir os resultados pretendidos. É preciso sensibilizar pessoas e governos.

10 O factor que nos ajudará a deixar a era dos combustíveis fosseis é a tecnologia, cujo desenvolvimento será fundamental para responder à questão da energia. Teremos de continuar a investir na tecnologia até que seja atingido um estádio que nos possibilite ter fontes inesgotáveis. As centrais nucleares de fusão são uma possibilidade e nos últimos dois anos foram feitos progressos significativos neste âmbito. Os países que lideram a investigação são: Estados Unidos (1), Japão (2), China (3), Alemanha (4), Canadá (5), França (6), Reino Unido (7), Itália (8), Rússia (9) e Austrália (10). Até lá será necessário continuar a investir no desenvolvimento das energias renováveis de modo a fazer com que sejam mais eficientes. O exemplo da evolução técnica da agricultura é um modelo a seguir. Novas tecnologias, com a aplicação da IA em tratores autónomos e drones, permitem realizar tarefas com mais eficiência e precisão. Como resultado, a indústria agrícola está mais sustentável e produtiva. Algo essencial para alimentar uma população global crescente. O mesmo irá verificar-se noutras áreas.

Investigador do Centro de Investigação em Ciência Política da Universidade do Minho, co-fundador da Iniciativa Liberal.