Num projeto de investigação conduzido de acordo com as diretrizes da Declaração de Helsinki e aprovado pela Comissão de Ética do CHULN (Centro Hospitalar e Universitário de Lisboa Norte) e do CAML (Centro Académico de Medicina de Lisboa), foi estudada a relação entre os níveis de burnout de médicos e enfermeiros, medidos através de escalas validadas, e o índice ómega-3, que é determinado nos glóbulos vermelhos dos participantes a partir de uma pequena amostra de sangue.
O burnout está associado ao stress ocupacional crónico e caracteriza-se por exaustão emocional, despersonalização e diminuição da sensação de realização profissional. O índice ómega-3 é a percentagem de dois ácidos gordos essenciais no total de ácidos gordos da membrana dos glóbulos vermelhos. Há uma vasta quantidade de estudos sobre a relação do índice ómega-3 com diversas doenças que concluíram que valores baixos estão associados a maior gravidade. Esta constatação é muito útil do ponto de vista clínico porque permite identificar os indivíduos em maior risco, a estabelecer valores-alvo e, por vezes, a monitorizar a progressão da doença e a eficácia dos tratamentos.
O objetivo de avaliar a sua relação com o burnout surgiu da lacuna de conhecimentos sobre a mesma, no estudo dos fatores de risco psicossociais em profissionais de saúde. Anteriores projetos publicados, que no passado debruçaram-se sobre a violência no local de trabalho que atinge estes trabalhadores e este estudo sobre burnout enquadra-se nessa linha de investigação, que ainda está em curso e cujos resultados serão revelados no próximo ano.
Num primeiro artigo científico publicado na revista Frontiers in Psychology, escrito com base nos dados de burnout dos primeiros cem participantes, com conclusões muito interessantes e úteis para a gestão hospitalar. O principal achado desta primeira análise foi que a antiguidade, isto é, o tempo de permanência do profissional de saúde na instituição com quem tem o seu vínculo laboral, é um potencial fator protetor de burnout. Tendo em conta resultados de estudos anteriores – que mostram uma relação inversa entre os níveis de burnout de médicos e enfermeiros e a qualidade dos cuidados de saúde prestados – é fácil perceber que a criação de condições que incentivem a permanência destes profissionais na instituição onde trabalham pode refletir-se em melhores indicadores de qualidade da assistência prestada. Para além, naturalmente, da otimização da saúde mental desses profissionais, que deve constituir, por si só, um objetivo de desempenho das instituições.
É ainda importante referir que os apoios oficiais disponíveis para este tipo de estudos são muito limitados, mesmo nos projetos acolhidos por centros académicos de investigação. Poder avaliar em contínuo o estado de saúde mental dos profissionais de saúde, obriga a que um médico que não seja um investigador exclusivo, que investigue em paralelo com a prática clínica é, na maior parte dos casos, responsável por obter os seus próprios financiamentos. E, neste momento os meios tradicionais de financiamento da investigação envolvem uma burocracia pesada que consome muito tempo e esforço e que poderá conduzir para que os dados reais de burnout não sejam obtidos on time. Quando não se é investigador exclusivo e não se tem uma estrutura dedicada a concursos, as barreiras ao financiamento são consideráveis. Portanto, são muitas vezes as entidades privadas que se interessam por estes projetos sem contrapartidas comerciais e que apoiam estes investigadores na aquisição dos recursos necessários, contribuindo enormemente para a cadeia de criação de valor científico em Portugal e devem ser reconhecidas publicamente por essa contribuição, para que estes trabalhos possam continuar a ter lugar e a garantir uma avaliação mais fidedigna da evolução da saúde mental em contexto e próximo dos profissionais de saúde numa lógica presente e atual e não com dados do passado.