Passado mais de um mês das eleições, com a Assembleia da República a funcionar, o Governo constituído e legitimado, nada mais mudou na forma de se fazer política. Os temas são recorrentes, a forma e as táticas não se alteraram e a sensação é que os partidos e a maioria dos “fazedores” de opinião ainda não perceberam o que se passou a 10 de março.

Mesmo antes de se conhecer o Governo, já se debatia a sua duração, a eventualidade de retificativo e o Orçamento de Estado. Sem prejuízo de serem temas de interesse público, as pessoas têm outros problemas e outras preocupações que as desviam destas questões.

Como olhará uma família com duas ou três prestações em atraso no banco, ou que não tem dinheiro suficiente para pagar a renda atrasada, ou que aguarda uma consulta há meses ou que tem filho na escola ainda sem um ou dois professores, para esta forma de intervenção política?

Como é que este tipo de debate, muito empolgante para os políticos, pode despertar interesse nos jovens, quando se enfrenta um despejo, não se consegue alugar uma casa por valor suportável, não se consegue emprego compatível com o curso superior que se tirou ou quando se ganha o salário mínimo?

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A habitação, a saúde, a educação e o trabalho, são questões que estão todos os dias na cabeça da esmagadora maioria do povo português, que assiste aos políticos e comentadores, na sua maioria entretidos com tacticismos que levam parte das pessoas para soluções de protestos perigosos. A abordagem dos problemas pela espuma e os anúncios táticos da forma como se vota ou não vota documentos que nem sequer existem é uma forma de afastar as pessoas da política e das instituições.

Depois de algum otimismo inicial sobre o futuro do PS, do novo Governo, do futuro do regime (que é o que verdadeiramente conta), as pessoas voltam agora a ficar descrentes. O PS, condicionado por uma gestão em bolha, por vezes sectária e suportada numa base militante, razoavelmente irresponsável, está a trilhar o caminho para a irrelevância.

Com uma AD demasiadamente armadilhada e dependente de outros, que, embora contrários, parecem capazes de se entender sobre soluções de recuos perigosos, a vida política vai ser difícil e o regime pode ficar no essencial abalado. A extrema-direita veio para ficar e crescer e a extrema-esquerda, mesmo que esgotada no seu crescimento, tem uma relevância mediática que a torna perigosa com um frenesim que atraiu o PS.

Não se prevê, por isso, um futuro próximo isento de grandes dificuldades. A carta que Pedro Nuno Santos enviou ao Primeiro-ministro é um bom exemplo da hipocrisia, demagogia e irresponsabilidade que tomou conta do grande partido socialista. É espantoso que um líder e uma direção que pertenceram a governos de António Costa, que, durante oito anos, não quiseram resolver problemas que agora identificam, aparecem na linha da frente a condicionar e pressionar para o imediato as possíveis soluções.

Isto não é fazer política: é exercer terrorismo político. Uma queda do governo corresponde ao reforço da AD e a levar o Chega mais próximo do poder, cavando ainda mais o buraco onde anda o PS.