Vários são os acontecimentos que têm vindo a deixar a sua destacada marca na história da humanidade, influenciando sociedades, inspirando grupos e fazendo mover o mundo social e político cujo girar depende inteiramente das ideias e filosofias de que esses mesmos acontecimentos se fazem acompanhar, numa relação quase (se não totalmente) interdependente e simbiótica.

Ora, como em tudo, há sempre dois lados da mesma moeda: por um lado, grande parte desses momentos contribuíram para o avançar e desenvolver da raça humana, de forma direta e sem a necessidade do conhecido sofrendo, aprendendo característico de tantas outras situações (o período dos Descobrimentos, por exemplo, ou a invenção da locomotiva a vapor); por outro, uma também significativa quantidade de eventos forçaram-nos a uma evolução assente na dor e no sofrimento, unicamente justificada por cenários horríficos outrora vividos. É nestes últimos que se centrará este modesto texto.

Exemplifiquemos: os horrores do nazismo são hoje reconhecidos por todo o mundo e desprezados por todos (ou assim se espera), desprezo esse assente numa crítica constante que parece querer forçar a relembrança desses tempos e das atrocidades experienciadas. Assumindo que qualquer democrata e, acima disso, qualquer ser humano – no sentido não de espécie, mas axiológico e, ainda que redundante, humano – se insurge contra aquilo que foi e que todos sabemos ter sido a Alemanha Nazi, não gastarei muito mais linhas na tentativa de condenar aquilo para o qual não existem sequer suficientes palavras (ou palavras com sentido forte o suficiente) para condenar.

Torna-se, no entanto, fundamental o apontar de uma situação assaz controversa e antíctone quando comparada com a já exposta acima: a aceitação do ideário marxista e das suas várias ramificações. Não seria, no mínimo, coerente condenar com a mesma força a ditadura do proletariado como se faz com o nacionalismo extremado? Não nos faria menos hipócritas criticar Estaline e Lenine com a mesma austeridade e intolerância com que criticamos Hitler ou Mussolini?

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Ignorando (finjamos que por lapso) o facto de os regimes comunistas terem nos seus armários um número inimaginável de cadáveres, quando comparados com os extremismos de direita, este fenómeno tem uma fácil e simples explicação, pelo menos no que ao que se passa «dentro de casa» diz respeito: o amor que Portugal nutre às esquerdas. Muitos diriam que, desde a Revolução dos Cravos, o nosso país não recuperou da sua crónica alergia à direita e às suas principais bandeiras. Já eu prefiro ouvir que se aceitou uma patologia autoimune bem pior que uma simples alergo-constipação: a chamada esquerdopatia.

Já várias são as provas dadas de que, em solo português, poucas são as ocasiões em que a coerência e o bom senso são tomadas em consideração. Nada disto terá que ver com a vincada presença da ala esquerda nos aparelhos de governação, ao longo do tempo de democracia…

Tomemos como exemplo a tradição constitucional portuguesa. Tem-se insistido bastante – quase transparecendo uma imensa vontade de perpetuar os estereótipos de Abril – na manutenção do famoso «caminho para uma sociedade socialista», que, mesmo apenas sendo parte do preâmbulo da constituição, demonstra a obsessão e o deslumbre de que falo. Proíbem-se, também, e com a superioridade moral do costume, «movimentos que perfilhem a ideologia fascista». Compreensível, legítimo, e sem defeitos a assinalar, não fosse o caso de nada se dizer sobre os pressupostos-base das teorias da foice e do martelo. A estes juntam-se outros exemplos, não só escritos, mas, também, costumeiros, que demonstram sem margem para dúvidas o porquê de Portugal não crescer, não se desenvolver e não evoluir – e o porquê de estar estagnado.

Naturalmente que não faço cair sobre os ombros de uns quantos membros da brigada do reumático toda esta imensa e complexa culpa/responsabilidade. Não estão sozinhos, não! A eles juntam-se todos os seus camaradas adeptos de nacionalizações e estatizações, paladinos e defensores ávidos da extinção das classes sociais para que possam, eles próprios, assumir-se como a classe mais abastada e confortável das duas que passarão a existir, ignorando por completo o povo e as suas vontades e necessidades. Os reis e rainhas do utópico, idílico e onírico, portanto. Se apenas um suave toque de utopia, não vejo como possa ser prejudicial. Até pelo contrário. Estamos, porém, perante um agarrar total – e pelo pescoço – do sistema em que hoje se vive, tirando a um capacitado país (com provas dadas dessas capacidades) o ar de que necessita para se voltar a erguer – ar desprovido de moralismos e filosofias não funcionais, mas cheio de vida, fulgor, direitos, liberdades e iniciativa privada.

É por tudo isto que me assumo como marxista ao contrário.