Sendo o Estado e a Administração Pública o maior empregador do país, pensar acerca dos seus recursos humanos parece ser absolutamente necessário face à edificação de um serviço público de qualidade capaz de contribuir, em última instância, para um conveniente desenvolvimento económico e social do país. A par da qualidade inerente às políticas públicas, poder-se-á dizer que uma política integrada de gestão dos recursos humanos na Administração Pública é hoje matéria de necessária discussão, tal como deveria ser, concomitantemente, de crescente preocupação.

Quer antes, quer depois do 25 de Abril de 1974, a Administração Pública foi alvo de várias reformas das quais advieram mudanças significativas na área dos recursos humanos, sobretudo no que diz respeito à sua flexibilização.

A primeira grande reforma que ocorreu na Administração Pública reporta-se ao ano de 1935, através do Decreto-Lei 26 115, de 23 de Novembro. Até à efectivação dessa reforma o cenário existente era considerado inconsistente, predominando, a título de exemplo, um sistema de pirâmide invertida, em que existiam mais superiores hierárquicos do que subordinados, bem como salários diferentes para funções consideradas em tudo semelhantes. O advento da democracia haveria de trazer um novo impulso reformador ao sector da Administração Pública, no entanto acabaria por ser somente nos meados da década de oitenta, quando as condições políticas e económicas se tornaram mais estáveis e favoráveis, que as ditas reformas haveriam de assomar perante todos com contornos mais sistemáticos e claros. Para que tal tivesse acontecido contribuiu decisivamente o facto de Portugal ter começado a usufruir de avultadas verbas provenientes de fundos estruturais da União Europeia, bem como estar em curso uma evidente recuperação da crise petrolífera e da depressão económica sentida a nível global.

Ao longo dos anos que se seguiram foi-se trabalhando na desburocratização inerente à administração, houve preocupação acerca da formação dos seus agentes, bem como algum investimento legislativo na melhoria dos serviços, com o intuito de que, consequentemente, pudesse haver uma melhor utilização destes por parte dos cidadãos.

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Novos regimes jurídicos foram surgindo para tentar assegurar a eficácia da gestão pública e a satisfação dos cidadãos. Tentou-se promover uma aproximação do sector público ao sector privado e iniciou-se uma busca de eficiência, ao instalar uma cultura de avaliação e responsabilidade, exultando o mérito e a excelência.

Mas, chegados aos dias de hoje, terão sido verdadeiramente adequadas as muitas medidas implementadas?

Terão desembocado numa satisfatória reforma administrativa na área dos recursos humanos?

Ter-se-á conseguido atingir o intento último de melhor servir os cidadãos?

Alguma coisa terá sido alcançada mas, infelizmente, tal não foi certamente suficiente para contrariar o enorme peso da disfuncionalidade que teima em persistir na Administração Pública.

Assiste-se, a título de exemplo, à perpetuação de situações similares às verificadas nos anos trinta do século passado, não propriamente no que concerne à existência de uma pirâmide invertida, como aquela a que atrás aludi, mas à existência (muitas das vezes predominante) de superiores hierárquicos que têm inferiores conhecimentos técnicos relativamente aos seus subordinados.

Infelizmente, na Administração Pública, muito especialmente na Administração Autónoma, os melhores quadros são invariavelmente alienados pela incompetência crónica que facilmente tende a ser promovida. Ao nível local, esta tendência assegura uma pacífica e deleitosa exultação dos eleitos, muitos deles pouco conhecedores acerca do lugar que ocupam ou acerca das competências que lhe estão adstritas, ou então tende a assegurar um facilitismo no desenvolvimento de certos e determinados procedimentos administrativos, não exequíveis se dependessem de opinião técnica mais competente e atenta.

Certo é que tal tendência é o semblante de uma lastimável Administração Pública cada vez mais descontextualizada das exigências actuais e lesiva para os cidadãos.