Ser Professor não é para qualquer um. Sou professora por vocação. Não foi casualidade, fatalidade ou escolha circunstancial. Foi a minha primeira opção, uma escolha que faço todos os dias. E é aos profissionais da educação que começo por manifestar o meu profundo respeito e agradecimento. A todos, sem exceção, mas em particular aos, que marcaram a minha vida pessoal e profissional.

Ainda criança percebi o quanto me deixava feliz poder ajudar a minha primeira professora no decorrer das aulas. E esse “trabalho” continuava fora da escola, com outras crianças, em casa dos meus pais. À volta de uma mesa-redonda, resolvíamos as tarefas para o dia seguinte, que auto e heterocorrigíamos num pequeno quadro de giz. A vocação reforçou-se na adolescência, como mentora de uma colega de turma recentemente chegada da África do Sul. Os desafios eram ajudá-la a aprender a comunicar em português e facilitar o seu processo de inclusão. Uma missão que cumpri com toda a dedicação e algum sucesso. Tornava-se cada vez mais claro que este era o caminho que escolheria seguir na fase adulta.

O Professor é naturalmente um eterno estudante

Os meus primeiros anos como professora do 1.º Ciclo do Ensino Básico foram “deliciosos” e, por isso, marcantes. Rapidamente tomei consciência da necessidade de continuar a aprender, de conhecer e de construir estratégias inovadoras, inclusivas e diferenciadas, para chegar a todos os alunos e a cada um em particular. Esta busca constante por aprender mais e melhor fez-me perceber que o diploma profissional é apenas a autorização legal para iniciar a carreira de professor. Tal como a carta de condução permite começar a conduzir, o certificado de curso de um professor não é mais do que a licença para iniciar a viagem de aprender a ensinar.

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Ensinar é uma arte. Apreendi esta verdade ainda na infância e consolidei-a até à fase adulta, com professores de diferentes gerações. É a arte de fazer com que cada ser humano aprenda, tendo em conta os seus diferentes estilos de aprendizagem. É proporcionar ambientes de ensino e de aprendizagem inovadores, flexíveis, criativos e inclusivos, onde a valorização do conhecimento e do saber são tão importantes como o relacionamento interpessoal e social. Ambientes onde se cultiva cooperação, responsabilidade, integridade e liberdade, alguns dos valores que imperam naquele que é o modelo de escola que ambicionamos tornar real.

As competências individuais desenvolvem-se em conjunto. Nesta minha viagem, encontrei um conjunto de recursos e de metodologias ativas de ensino e aprendizagem baseadas na “Aprendizagem Cooperativa”, com o potencial necessário para transformar práticas pedagógicas tradicionais num modelo mais atrativo, participativo e motivador, não só para quem ensina, mas sobretudo para quem aprende. Nesse processo criei o Projeto COOPERA, com o objetivo de levar esta realidade a mais alunos e professores, um projeto que passa pela formação (em contexto) e capacitação de professores para a utilização destas metodologias. Até esta data, foram envolvidas mais de 20 escolas, 80 turmas, 350 professores e 2000 alunos. Os resultados comprovam os efeitos positivos da Aprendizagem Cooperativa ao nível do desempenho académico, da crença de autoeficácia, da motivação e das competências sociais dos alunos, resultando também na melhoria do clima de sala de aula. A Aprendizagem Cooperativa convida todos os alunos à escola e desperta-lhes o gosto pela aprendizagem. De forma responsável e divertida, cada um, de acordo com as suas capacidades, dá o seu melhor! Alunos implicados nos desafios que lhes são lançados em equipa, tornam-se individualmente mais competentes e seguros em diferentes áreas, do que alunos que aprendem individualmente.

O Professor fará sempre a diferença

Enquanto formadora de professores, já tive o privilégio de trabalhar com centenas de profissionais deste país, não podendo aqui deixar de testemunhar a sua dedicação, empenho e compromisso com a docência. Tanto é assim, que, no atual contexto imposto pela Covid-19, reorganizaram o seu trabalho em tempo recorde, colocando as tecnologias ao serviço da pedagogia.

Os professores constituem-se como modelos de referência e são corresponsáveis pela construção de cada ser humano. Formam pessoas, abrem horizontes, disponibilizam ferramentas, expandem conhecimentos, estimulam o espírito crítico e criativo, criam oportunidades para escolhas futuras e contribuem para a felicidade de tantas crianças e jovens. Na verdade, ser professor implica ter gosto pela arte de os ensinar, mas também apreciar a sua companhia, com tudo aquilo que é inerente à fase de desenvolvimento correspondente à sua idade. Ser professor implica ser um bom comunicador, valorizar o espírito de trabalho em equipa, bem como a formação contínua imprescindível no desenvolvimento profissional e atualização permanente. Em boa verdade, ser professor significa querer “sê-lo”; querer “estar disposto a” e querer “consegui-lo”; implicações tremendas que deviam nortear a (ausência de) política de acesso à profissão, gestão da carreira e aposentação.

É preciso que nós, professores, sejamos ainda “mais pessoas”, mantendo viva a pedagogia dos afetos e da proximidade (mesmo que digital), onde cada aluno é um aluno, adotando um paradigma mais humanista, inclusivo, coerente e flexível, sustentado na pedagogia do exemplo.

Sónia Moreira é a vencedora do Global Teacher Prize Portugal 2020. Professora do Ensino Básico (1.º ciclo) do AE Escultor António Fernandes de Sá, V. N. Gaia. Formadora de professores. Mentora do Projeto COOPERA.

Caderno de Apontamentos é uma coluna que discute temas relacionados com a Educação, através de um autor convidado.