Confissão: sou um Portista do sul, de Lisboa, um mouro tripeiro portanto, e não posso dizê-lo a ninguém, não aqui nas terras da águia, perdão, das águias, milhões de águias a pairar todos os dias ao longo de anos sem fim, uma vida toda sem poder sair à rua orgulhosamente de azul e branco sob pena de um insulto gratuito, uma agressão gratuita, uma pedrada na janela e tudo porque se morre de amor por um clube: o Futebol Clube do Porto.
Começou aos 12 anos de idade esta paixão quando um amigo se voltou para mim, eu ainda incerto sobre quem apoiar, o Benfica acabara de perder uma final Europeia e o porquê de não apoiar o Porto se o Porto ganha sempre?
E até hoje vestimos os dois de azul e branco, mas às escondidas, entenda-se, décadas em segredo entre a felicidade fortuita de um outro portista cumprimentado entre sussurros e apertos de mão sob medo de represálias, sempre imediatas.
Mas e a contrapartida? Noites sem fim à frente da televisão e os números não mentem se antes de Pinto da Costa o Porto arrecadara 10 títulos nacionais e depois, não depois, mas com Pinto da Costa e ainda com Pinto da Costa o Porto soma 22 Campeonatos Nacionais, 2 Taças dos Campeões Europeus, 2 Taças Intercontinentais, 1 Super Taça Europeia, 13 Taças de Portugal, 21 Super Taças de Portugal e mais de 1300 títulos em diversas modalidades desde o hóquei em patins ao basquetebol, andebol, ciclismo e atletismo.
Crescemos em alegria e com alegria celebrávamos os livres de Branco e Geraldão diante do semblante fleumático de Artur Jorge e das suas palavras eternas quando lhe perguntavam qual dos dois marcaria o livre: “Tanto faz, é golo”, e era golo, é golo e o ripa na rapaqueca do saudoso Jorge Perestrelo a assobiar no rádio da sala enquanto abraçávamos a televisão.
E a festa continua com Bobby Robson, Sir Bobby Robson e a sua alegria de viver, o sorriso contagiante e as eternas conferências de imprensa onde num português macarrónico resumia o jogo: “Domingos – Kostadinov – goal” e os anos 90 passaram-se assim com o pentacampeonato ainda por igualar e um total de 8 títulos nacionais em 10 anos.
Mas há mais e mais é ver Old Trafford em silêncio diante dos azuis e brancos, o livre de frente para a baliza ao cair do pano e Mourinho de braços no ar a correr ao longo da linha: estávamos novamente na final dos Campeões!
E isto um ano depois de uma das finais mais frenéticas de sempre contra um Celtic indomável e Derlei, o ninja de serviço, a resolver.
E sim, Gelsenkirchen já estava ganho e para comemorar dois portistas e um benfiquista, amigos de sempre desde a faculdade, foram jantar fora na noite da final.
Atingíramos a maioridade, crescemos felizes e se assim foi devemo-lo a Pinto da Costa e nunca nos esqueceremos, não enquanto vivos e poderíamos ter ficado por aqui.
Mas Pinto da Costa não se ficou por aqui e entre outros tantos campeonatos e títulos já vai no 15.° mandato e promete continuar.
Infelizmente, desde 2016 as dívidas acumuladas entre empréstimos bancários, empréstimos obrigacionistas e dívidas a fornecedores deixam hoje o clube em falência técnica e uma dívida de mais de 280 milhões de euros a ser paga no espaço de um ano.
A gestão ruinosa vem assim pôr em risco o legado de Pinto da Costa, legado esse igualmente manchado pelo conluio entre um clube e uma claque cujo líder, entre ameaças e agressões e buscas policiais com a descoberta de uma arma de fogo e estupefacientes, promete a morte para quem não estiver com o nosso presidente.
Mas como podemos nós estar com o nosso presidente quando o clube por si erguido se arrisca a cair como um castelo de cartas e consigo a sua memória e o trabalho de uma vida?
Soubesse Pinto da Costa como o trabalho de décadas criou uma legião de apaixonados pelo desporto e pelo clube e, estou certo, de bom grado cederia o seu lugar a este timoneiro e este timoneiro é a geração agora ao leme.
Obrigado por tudo, Pinto da Costa, pelo brio, pela disciplina, pelo Porto à Porto e esta certeza de não ser só André Villas-Boas mas todos nós dispostos a receber o testemunho e erguer o testemunho na certeza de mais vitórias, na certeza da glória, parafraseando o nosso capitão, João Pinto, em nome de uma só cor: azul e branco.

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