Naquela escola, os alunos gostam de trocar ideias com escritores; eles esforçam-se por ler um dos livros de determinado autor e logo que é oportuno, a escola recebe-o, para assim poderem trocar impressões. Naquela manhã, quem receberam foi uma escritora que, sendo também jornalista, tinha publicado naquele preciso dia uma crónica num jornal de grande circulação. Logo a seguir às apresentações, ML, são estas as suas iniciais enquanto autora, foi questionada por aqueles alunos, conhecedores da crónica publicada, sobre um assunto muito importante no meio escolar. Tratava-se de ‘bullying’, e quiseram de imediato saber, antes de mais, como é que ela escolhia os temas, qual seria o exercício mental necessário para se escrever uma crónica.

Ela bem se explicou, bem deu pistas, falou de tudo, de paixão, de justiça, ou a falta dela, como motivação para a escrita, mas não adiantou. O que aqueles alunos queriam saber era mesmo como é que escolhia e começava a escrita, assim como uma pessoa em frente de uma ementa escolhe o que comer. Ah!, percebo-vos, disse ela. E de imediato desafiou aquela turma a lançar uma frase que poderia ser o assunto da crónica. Ouviram-se muitas sugestões e a escolhida recaiu sobre a sala de aulas: ‘Esta sala cheira mal!’.

Depois da risada colectiva, ML, apercebeu-se de que aquela escolha não foi a melhor. Era verdade que naquela sala de aulas se sentia, de vez em quando, um cheiro não muito agradável, e que, julgava a escritora, seria tema para ser discutido como protesto juvenil. Mas não! Havia alunos e alunas já com ideias feitas e por isso tinham lançado aquela frase, um isco, aproveitado logo para dizer que a sala começou a cheirar mal desde que Faruk e Aisha, José e Maria, ou ainda, Babacar e Niaye (nomes fictícios) tinham sido incorporados naquela turma.

Aterrorizadas, tanto a escritora como a professora, e ainda a maior parte dos alunos e alunas, ficaram num silêncio envergonhado enquanto os promotores da ideia se riam. Reagiu de imediato a professora que chamou o encarregado da manutenção do edifício que explicou que aquele fétido cheiro se devia ao entupimento de uma caixa de esgoto e que o problema estava em vias de ser solucionado.

E assim se conclui quem é que tem andado com a cabeça no esgoto, disse a escritora, para aplauso geral e de pé.

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