O final do contrato de prestação de serviços que vai deixar as prisões sem psicólogos, e outros serviços de saúde durante cerca de um mês, foi feito por ajuste direto porque a Direção Geral de Reinserção e Serviços Prisionais (DGRSP) não acautelou a abertura de um concurso público atempadamente.

O contrato por ajuste direto com a empresa I.A.Patrício – Prestação de Serviços de Saúde LDA, no valor de 3,5 milhões de euros foi feito para vigorar entre janeiro 30 de junho de 2014 “eventualmente até 14 de dezembro”. E foi mais um que mereceu apreciação do Tribunal de Contas.

Num acórdão de 28 de janeiro de 2014, os juízes do Tribunal de Contas dizem que a DGRSP adiaram até “um limite incompreensível a abertura do novo concurso público internacional”. Mais, fizeram contratos por ajuste direto para serviços que já tinham sido prestados porque o concurso ainda estava a decorrer.

“A DGSPRS tendo o controlo exclusivo da situação, deve zelar para que o serviço seja prestado sempre de acordo com o cumprimento desse dever. Devo-o fazer, no entanto, salvaguardando sempre o melhor interesse público que o custo do mesmo impõe ao Estado. Daí que a preparação e o lançamento dos procedimentos concursais públicos para que se cumpram esses deveres devem ser efetuados atempadamente em relação ao momento em que devem produzir efeitos”, referem os juízes.

Este acórdão debruça-se sobre um contrato com a mesma empresa, a I.A.P., mas no valor de 1,5 milhões de euros e para serviços prestados em 2013. Os juízes decidem recusar o visto. Ou seja, não aceitaram o ajuste direto.

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Dois meses depois a DGSPRS recorreram da decisão, justificando o ajuste direto pela necessidade de não privar a população prisional destes serviços. Como agora está a ser feito.

“O procedimento seguido era a única via procedimental a adotar, de forma a assegurar a prestação de cuidados de saúde à população reclusa, sem interrupções, obrigação de ordem constitucional, que impende sobre a DGSPRS de molde a garantir as condições de saúde aos cidadãos privados de liberdade e à guarda do Estado”, justificam.

O tribunal deu-lhes razão mas com um voto vencido, assinado pelo juiz conselheiro João Aveiro Pereira. Diz o juiz que esta decisão vem “ao arrepio da jurisprudência já consolidada” no tribunal de Contas. E que poderá abrir precedentes.

“Ou seja, em situações em que a própria adjudicante cria as condições que a impedem de cumprir os prazos e depois, como no caso presente, prevalece-se da sua própria ineficácia para lançar mão de aquisições ou ajustes diretos, sem respeito pela legalidade”, diz o juiz.

Ministra da Justiça dá soluções, mas Ordem dos Psicólogos está preocupada

Depois da denúncia da Ordem dos Psicólogos, a ministra da Justiça Paula Teixeira Cruz veio garantir que a população prisional poderá, em casos mais graves, ser assistida por psicólogos do Serviço Nacional de Saúde.

Uma resposta que a Ordem dos Psicólogos diz não entender. “Há 600 psicólogos no Serviço Nacional de Saúde já direcionados para os centros de saúde, os hospitais e para serviços muito específicos como o pós-operatório, por exemplo”, disse ao Observador o diretor executivo da Ordem dos Psicólogos. Além da escassez de profissionais, Francisco Miranda Rodrigues alerta para o facto de este ser um serviço “necessário” à população prisional.

“A Organização Mundial de Saúde diz que 74% da população prisional sofre de patologia mental, como a depressão e o stresse. Os psicólogos são fundamentais. Mais. São eles que contribuem para a mudança comportamental do recluso e isso é essencial na reinserção social do recluso”, refere, sublinhando que a taxa de reincidência dos criminosos é de 50%, ou seja, metade dos reclusos volta a cometer crimes.

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Contactado pelo Observador, o subdiretor-geral da Reinserção Social dos Serviços Prisionais lembra que há cerca de 200 psicólogos nos quadros do Ministério da justiça. O responsável explicou que estes psicólogos são chamados quando há, de facto, uma patologia, mas que existe uma equipa permanente a acompanhar os reclusos, onde existem psicólogos, sociólogos e assistentes sociais.

“Os nossos psicólogos não podem ter uma relação terapêutica com os reclusos porque existe uma relação hierárquica, mas num caso extremo podem assistir um doente. Estes casos serão depois reencaminhados posteriormente para o Serviço Nacional de Saúde, preferencialmente, ou para serviços privados”, explica.

De salientar que o transporte destes reclusos a uma consulta externa obriga ao acompanhamento em permanência de guardas prisionais, que também tem reivindicado mais recursos humanos.

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