Interceção de telecomunicações, vigilância de pessoas que não são suspeitas de nenhum processo-crime, pagamento a fontes que têm informações sigilosas e acesso a dados restritos. Estes são alguns dos processos previstos pelas 222 páginas do Manual de Procedimentos do Serviço de Informações de Segurança (SIS), através dos quais os espiões podem obter informações e que não estão contemplados pela lei, podendo mesmo ser ilegais, apurou o jornal i.

O manual, que entrou em vigor em 2006 no tempo do anterior Governo e cuja autenticidade foi comprovada junto a fontes do SIS, inicia-se com um “glossário técnico” que explicita os termos “mais ou menos encriptados” usados pelos serviços de informação. Nele são especificados os métodos através dos quais os espiões (ou oficiais de informação) podem obter informações.

Interceção de telecomunicações ou “escutas ilegais”

Para além de procedimentos como recolha de informação através de fontes abertas e pesquisas na internet, a recolha de informações pode basear-se na interceção de sistemas de comunicações e eletrónicos, da interceção de radares ou outros sinais eletromagnéticos ou mesmo da interceção de telecomunicações, algo que pode ser equiparado a escutas ilegais.

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No caso da interceção de telecomunicações, esta é feita por “escutas ambientais, feitas por intermédio de microfones, ou de dispositivos instalados nos telemóveis” ou pela instalação de programas que “permitem extrair os dados de um email ou de um computador”, afirma o i com base em fontes dos serviços.

O manual do SIS recomenda “procurar que a motivação principal seja monetária, pois o controlo será mais fácil, efetivo e duradouro”, afirma o i.

A pesquisa humana é outra prática descrita pelo Manual de Procedimentos do SIS, no capítulo que lhe é dedicado. O documento explica que se deve adequar a abordagem do oficial de informação ao tipo de perfil em causa, para possibilitar a captura de informação com maior detalhe. A pesquisa humana não se refere apenas a pessoas mas também a “instituições” e “empresas”. Em todos os casos devem ser tidos em conta “os acessos do alvo, o seu perfil, caráter, vulnerabilidades e motivação” diz o i, reiterando que “captar e ‘controlar’ uma fonte humana é essencial na estratégia dos serviços”.

O manual realça a importância da gestão de fontes é crucial na obtenção de informação e que se deve “procurar que a motivação principal seja monetária, pois o controlo será mais fácil, efetivo e duradouro” e que este procedimento não deve “ser encarado como uma mera troca de conhecimento por favores ou dinheiro”, diz o i.

Procedimentos previstos pelo manual podem ser ilegais

A lei portuguesa não prevê nenhuma destas práticas pois está construída determinando o que um agente das secretas “não pode fazer”, ao contrário do manual, que explicita como é que o agente deve proceder.

“Os funcionários ou agentes, civis ou militares, dos serviços de informações previstos na presente lei não podem exercer poderes, praticar atos ou desenvolver atividades do âmbito ou competência específica dos tribunais ou das entidades com funções policiais”, afirma a Lei Quadro de Sistema de Informações da República Portuguesa.

Mas será que a liberdade e direitos dos cidadãos portugueses está a ser violada por estes procedimentos do SIS? Corresponderá o tipo de interceção de comunicação descrito no manual uma forma de realizar escutas ilegais, para as quais é sempre necessária a autorização dos tribunais, mesmo em casos de escutas feitas pela Polícia Judiciária? Será que o mesmo se aplica às vigilâncias, que são apenas permitidas à polícia criminal?

Júlio Pereira, secretário-geral do Serviço de Informações da República Portuguesa (SIRP), recusou-se a comentar os procedimentos do manual e a sua relação com a lei portuguesa, afirma o jornal i, que o questionou.