Ninguém podia desconfiar. Manfred Seel, alemão de 67 anos, morador na localidade de Schwalbach am Taunus, pacata, com pouco mais de 15 mil habitantes e a meia hora de viagem de Frankfurt, era um homem comum. Marido presente, pai extremoso, vizinho educado, caseiro, arquiteto paisagista de formação — acabou por fazer profissão na empresa de recolha de resíduos urbanos que fundou –, um melómano que tocava saxofone e clarinete nas horas vagas. Os vizinhos chamavam-lhe “Alaska”, por este, tanto no verão como no inverno, vestir sempre um casaco de lã. Era o único comportamento “desviante” que se lhe reconhecia. Mas Seel tinha mais. Muitos mais. Era um assassino em série, que a polícia alemã desconfia ter sido o responsável pela morte de pelo menos cinco mulheres e um menor nas últimas quatro décadas. O número de vítimas, à medida que a investigação avança, avança também.

A primeira morte remonta a meados da década de 1970. Outras se seguiram. Mas os casos, apesar de terem contornos semelhantes na atuação — as vítimas eram esquartejadas e alguns membros ou órgãos não eram encontrados com o cadáver –, acabariam sempre por ser arquivados. O assassino, sempre impune, continuava a matar.

Mas então, como é que a polícia alemã chegou à pista de Manfred Seel? Por acaso. Seel morreu vítima de cancro em 2014. A mulher morreria nem seis meses mais tarde. Quando a filha do casal ganhou por fim coragem para esvaziar a casa dos pais e vendê-la, deparou-se com uma garagem cheia de roupas velhas, material de jardinagem, ferramentas de mecânica. O normal. Algures ao fundo estava um bidão azul, fechado. Ao abri-lo, a filha de Manfred Seel encontrou um corpo humano, em pedações, putrefacto. Contactou a polícia. A vítima era Britta Simone Diallo, uma prostituta de 43 anos, que desapareceu em Frankfurt em meados de 2003.

Os criminalistas veem em Seel um “colecionador de troféus”. O corpo de Britta nunca foi encontrado pela polícia até a filha do assassino em série o ter descoberto no bidão. Mas os corpos das restantes vítimas foram. E em todos faltava um membro ou órgãos, os quais, crê-se, Manfred Seel recolhia como prémios. Não se sabe onde o alemão os guardava. Em casa não. Em casa “só” tinha vídeos de pornografia sádica, até canibal, e mais de 30 mil fotografias com cenas de violência sexual extrema, as quais Seel replicava nas suas vítimas, todas elas prostitutas, imigrantes e toxicodependentes.

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Quem são? A primeira terá sido Gudrun Ebel, de 36 anos, descoberta esquartejada numa mata em Hofheim, corria o ano de 1971. Os órgãos de Gudrun foram retirados por Seel, crê a polícia. Outra das vítimas é Dominique Monrose, encontrada num saco do lixo em 1993, decapitada. A cabeça nunca foi encontrada. As restantes vítimas são Hatice Eruelkeroglu e Gisela Singh, assassinadas também na década de 1990.

Manfred Seel atuava segundo um padrão. Mas há outro crime que lhe é agora apontado, mas que destoa dos restantes e intriga a polícia. É o caso de Tristan Brübach. Tristan não era mulher, nem prostituta, imigrante ou toxicodependente. Era um menor, um rapaz de 13 anos, que foi degolado em 1998 em Frakfurt. O corpo só foi encontrado semanadas depois da morte, mutilado num túnel abandonado da cidade.

Muitos dos assassínios que ocorrem naquela zona nas últimas quatro décadas estão a ser agora reabertos. A polícia acredita que Seel pode ser o maior assassino em série (excluindo, claro, o holocausto nazi) que a Alemanha já conheceu. E só foi descoberto dois anos após a sua morte.