João Paulo II não gostava do termo papamóvel. Achava-o “pouco digno” e até chegou a pedir à comunicação social, em 2002, para não usarem a palavra. Pedido que caiu em saco roto.

A verdade é que não existe um nome oficial para o automóvel que transporta o Sumo Pontífice nas suas aparições públicas. A palavra papamóvel — que surgiu nos anos 80, numa referência ao Mercedes-Benz Classe G utilizado por João Paulo II nas celebrações na Praça São Pedro — descreve na perfeição o automóvel que vai variando de marca e design consoante o Papa em funções.

No caso de Francisco e da sua vinda a Fátima, o papamóvel — foram trazido um segundo carro para no caso de haver uma avaria — é um Isuzu D-Max branco reforçado atrás com uma pala. É o carro que Francisco costuma usar nas suas deslocações até às audiências semanais, na Praça de São Pedro.

O automóvel é igual ao que foi construído e personalizado de propósito pela Isuzu Gencars para a visita do Papa às Filipinas, entre 15 e 19 de janeiro de 2015.

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A empresa explica que foram retirados os dois lugares traseiros para se colocar uma cadeira branca, em pele, vinda de Itália, para o Papa se sentar, e mais dois lugares laterais.

O carro conta também com uma pala de pexiglass, que vai do para-brisas até ao limite posterior do carro; iluminação para que Francisco possa ser visto durante a noite; e uma carpete vermelha, importada diretamente de Itália.

Foi posto ainda um pequeno corrimão para o líder da Igreja Católica se poder agarrar caso queira ficar de pé, mas também para os seguranças se poderem agarrar ao mesmo durante o cortejo.

O Sumo Pontífice gostou tanto do carro que pediu para ser feito outro igual para depois ser comprado pelo Vaticano, lê-se no jornal filipino Business Mirror. A companhia fez então uma réplica e doou-a ao Papa em outubro do mesmo ano — o original está exposto em Manila. É já o segundo carro doado ao Vaticano pela Isuzu Gencars.

O papamóvel chegou a Portugal na terça-feira, depois de a Força Aérea Portuguesa o ter ido buscar a Itália. Um avião C-130 partiu de manhã, da Base Aérea do Montijo, em direção ao aeroporto de Roma/Ciampino. Pelas 17h30 já estava na Base Aérea de Monte Real.

Posted by Força Aérea Portuguesa on Wednesday, May 10, 2017

Como surgiu o papamóvel?

O transporte do Papa foi sempre uma preocupação tida em conta pela Igreja Católica. Um dos míticos meios de transporte é a sedia gestatória, que chegou ainda a ser usada no século XX. Um trono — mais concretamente uma cadeira com braços — decorado e coberto de sede vermelha, fixado numa plataforma transportada por 12 homens, também com uniformes vermelhos, lê-se no Telegraph.

Mas esta sedia pode não ser considerada um transporte. Remontemos então a 1800, ano da eleição de Pio VII, antecessor de Leão XIII. Segundo o Washington Post, que dedica um artigo a todos os papamóveis da história, foi a primeira vez que um recém-eleito líder da Igreja Católica foi até à Cidade do Vaticano de carruagem, e não a cavalo.

Os carros chegaram no início do século XX. Foi em 1930 que foi dado o primeiro carro a um Papa. O papa Pio XI recebeu um Nürburg 460 pullman saloon, explica a Mercedes-Benz, num comunicado citado pela Lusa. Este foi o carro utilizado pelo Sumo Pontífice até aos anos 60, altura em que passou para um Landaulet 300d conversível, com transmissão automática, feito especialmente para o papa João XXIII.

Apesar desta ligação de cerca de 90 anos entre a marca alemã e o Vaticano — um terço dos papamóveis eram Mercedes –, não tem sido uma relação de exclusividade. Outras marcas como a Fiat, Ford, Seat, Citroën e Rover já construíram papamóveis. Ainda assim, todos partilhavam uma característica que se manteve até aos dias de hoje: a matrícula SCV 1. As letras correspondem a Stato della Città del Vaticano (Estado da Cidade do Vaticano) e o número refere-se ao lugar hierárquico do Papa na Igreja Católica.

Até à década de 80, estes carros eram pretos e pouco tinham de diferente dos restantes modelos das marcas. Pelo menos a nível exterior, já que no interior continham pormenores como ar condicionado, vidros anti-fragmentação e uma cadeira que podia ser acionada eletricamente, refere o site Papa2017.

Só nessa altura passaram a ser brancos. Na sequência do atentado a João Paulo II, a 13 de maio de 1981 em Roma, os papamóveis passaram a ser blindados. Os carros passaram a incluir também as armas do Vaticano, e ainda “uma cúpula de plástico transparente, removível, com sistema de climatização e de iluminação”, onde estava uma cadeira, de modo a permitir que o Papa “possa viajar sentado, ou em pé, podendo ver e ser visto por todos”, lê-se no mesmo site dedicado à vinda do Sumo Pontífice a Fátima.

Bento XVI continuou a utilizar a cúpula nas visitas de Estado, ao contrário de Francisco, que dispensou os carros blindados. “Sejamos realistas, com a minha idade eu não tenho muito a perder“, afirmou o Papa em 2014, ao jornal La Vanguardia, argumentando que “dentro de uma lata de sardinhas” não conseguia “saudar as pessoas e dizer-lhes que as amo”.

O papamóvel português

Tal como aconteceu agora com a visita do Papa a Fátima, normalmente o papamóvel é transportado para o país que o Sumo Pontífice vai visitar. Ainda assim, já houve exceções, pelo que os líderes da Igreja Católica depois de João Paulo II já circularam em autocarros na Cidade do México, num camião Leyland em Inglaterra, num Seat Panda em Espanha e até num Ferrari Mondial em Maranello (Itália), refere o site Papa2017.

Todos eles com as características obrigatórias dos papamóveis: brancos, com o brasão do Vaticano e com a matrícula SCV 1.

Na visita de João Paulo II ao Funchal, em 1991, foi utilizado um automóvel de fabrico nacional: um todo-o-terreno UMM branco. E há toda uma história em torno deste veículo.

O Papa só andou neste automóvel porque a diocese da Madeira escondeu o papamóvel que tinha vindo de propósito de Roma. No livro “João Paulo II – Pastor Universal na Madeira”, o bispo do Funchal Teodoro de Faria conta que o Governo português considerava que o automóvel encomendado pela diocese não era seguro o suficiente — apesar de o próprio Vaticano ter achado que era. Fizeram por isso questão de enviar o carro que tinham conseguido trazer do Vaticano para o Funchal.

O problema é que, se não utilizassem o jipe UMM, teriam de pagar 10 mil contos (50 mil euros) à Mocar, representante da Peugeot em Portugal. O que acabou por não acontecer, uma vez que colocaram o papamóvel enviado pelo Governo português num armazém, antes da chegada de João Paulo II.

A história do papamóvel escondido para João Paulo II andar num UMM no Funchal

Situação que com certeza não se irá repetir à chegada do Papa à Base Aérea de Monte Real, por volta das 16h20 desta sexta-feira.

Depois de um encontro com o Marcelo Rebelo de Sousa e de uma visita à Capela da Base Aérea, às 17h15 Francisco fará uma viagem de vinte minutos de helicóptero até ao Estádio de Fátima. Nessa altura, irá de papamóvel até ao Santuário, onde visitará a Capelinha das Aparições às 18h15, recolhendo-se depois à Casa de Nossa Senhora do Carmo.

Durante a Benção das Velas, Francisco irá dirigir uma saudação aos peregrinos na Capelinha das Aparições, às 21h30. Segue-se depois a recitação do Rosário.

A canonização dos pastorinhos ocorre no dia seguinte, 13 de maio.

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