Custou mil euros e algumas bolas. O Benfica queria-o e observava-o há muito, tinha a vantagem de o miúdo ser benfiquista dos quatro costados. Mas Aurélio Pereira deu a benção, o Sporting (que sempre teve boas relações com o histórico “Fofó”; Rúben Semedo também foi lá “pescado” em tenra idade) avançou para a contratação e há seis anos (com a época 2010/11 a meio) o lingrinhas e “desavergonhado” (fora de campo era tímido, mas dentro dele driblava o mais matulão dos matulões) Gelson chegava a Alcochete e aos juvenis do Sporting.

Logo chegaria também à seleção e cedo se auguraria que Alvalade teria outro extremo da linhagem de Figo, Quaresma ou Ronaldo. Mas podia não ter tido. É que, no derradeiro ano de Gelson na formação, o treinador dos juniores, José Lima, à falta de melhor opção para o lugar, resolveu colocar Gelson a lateral direito. E assim foi a maior parte da época. Ascenderia depois ao Sporting B, onde João de Deus o devolveria à posição onde é melhor. A época correu-lhe bem, Jesus chegou a Alvalade no Verão seguinte (no ano anterior Marco Silva também lhe havia concedido alguns minutos), testou-o na pré-epoca e não voltaria Gelson a sair do onze – nem naquela época de 2015/16 nem na última.

Ganhou “cabedal” sem perder velocidade. Apurou o drible, continuando desconcertante (para quem o tentar parar, claro), mas sendo agora mais objetivo: depois de driblar ou cruza ou remata, não voltando incontáveis vezes ao ponto de partida para voltar a driblar outras incontáveis vezes. O que faltava a Gelson? Golos, dirão. Se os tivesse (apontou sete em cada uma das épocas do Jesus) não faltaria quem pagasse o que Bruno de Carvalho pede por ele: 60 milhões de euros, mais coisa menos coisa — sem ser preciso oferecer bolas como as que o Sporting ofereceu ao “Fofó”.

Pois bem, cheguem-se os “tubarões” à frente com o livro de cheques: é que Gelson começou a época com o pé quente. Frente ao Aves, bisou. Mas tivesse ou não “molhado a sopa” duas vezes teria sido sempre o melhor do Sporting na Vila das Aves. Não foi o único a mostrar-se (Acuña esteve sempre em alta-rotação e Bruno Fernandes é classe dos pés à cabeça) mas foi o melhor.

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E foram precisamente Bruno e Acuña quem primeiro assustou o Aves. Primeiro Bruno, aos vinte minutos. Adriano evita o golo do Sporting. O remate é cruzado, mesmo na esquina direita da área, a defesa do guarda-redes do Aves é com a ponta das luvas — o árbitro Tiago Martins não deu canto. No minuto a seguir, o remate de Acuña é praticamente do mesmo local que o de Bruno Fernandes. Mas é de canhota, mais frontal e forte. Adriano teve que “voar” (a defesa vai dar uma bela fotografia) para evitar o golo.

O Aves responderia. E logo na jogada após o remate do argentino ex-Racing. Braga, devagar, devagarinho, passa por Piccini, entra na área do Sporting pela esquerda e é também com o pé esquerdo que remata na direção do poste contrário. Patrício defende para canto. O jogo na Vila das Aves acelerou, estava “partido” e Sporting chega ao golo aos vinte e três minutos.

Canto para o Aves, Gelson corta a bola e entrega-a em Bruno Fernandes — a receção de calcanhar de Bruno é um primor –, saindo depois em sprint para o ataque. Bruno sem delongas (a verticalidade do médio ex-Sampdoria fez muita falta ao Sporting na última temporada) desmarcaria Acuña mais à esquerda e de pronto o argentino desmarcou Gelson nas costas da defesa do Aves. Depois, foi o talento do extremo do Sporting a resolver: driblou Rodrigo Soares, trocou a bola do pé direito para o esquerdo e com Adriano tombado no relvado só teve que escolher o lado vazio da baliza para rematar.

Antes do intervalo, um livre perigoso, a “queimar” a área do Aves e ligeiramente descaído para a esquerda. Foi aos trinta e oito minutos. A barreira era densa e contavam-se lá seis do Aves, todos juntinhos e sem nesga de espaço para a bola os transpor. No Sporting, todos queriam marcar: Acuña, Mathieu, Adrien e Bruno Fernandes. Sairiam os canhotos, ficariam os destros, quem rematou foi o capitão Adrien, um remate em jeito e a circundar a barreira na direção do poste direito. Adriano não a viu sair, mas defenderia a custo para a frente. Dost tentou a recarga, mas Lenho foi mais veloz e deu um valente chutão para fora da área. Ufffff!

Os aspersores foram ligados ao intervalo. Logo no recomeço, Nilton erra um passe e entrega a bola a Acuña a meio-campo. O argentino seguiu na direção da baliza, seguiu, seguiu e seguiu — ninguém do Aves o “incomodou” –, até que, chegado perto da área, rematou de pé esquerdo. O remate foi fortíssimo, Adriano estava batido — apesar de se ter esticado até ao último tendão — mas a bola embateu na barra. Depois, foi ver a água (a tal que os aspersores deixaram no topo da baliza) pingar com o abalo. E Acuña de mãos na cabeça.

Depois de longos minutos de marasmo (o Sporting tinha a bola mas raramente se assistiu a um remate de parte a parte) Piccini cruza desde a direita aos setenta e cinco minutos, Dost amortece a bola no interior da área e Acuña remata-a de primeira. Adriano segura. Na jogada a seguir, o Sporting consumaria em golo a ameaça anterior. Battaglia surge sozinho na esquerda, entra na área e cruza, mas o cruzamento não segue para ninguém do Sporting. Seguiu, isso sim, para o central Diego Galo. E seguiu-se o disparate: tentou fazer um corte acrobático (como a célebre defesa “à escorpião” de René Higuita), deixou a bola redondinha na pequena área em Gelson, que prontamente rematou para o segundo golo do Sporting e para o seu bis na Vila das Aves. Foi a segunda vez (a outra foi no distante maio de 2016 com o Setúbal) que Gelson bisou de verde-e-branco.

Mas a jogar assim, dificilmente voltará a bisar de verde-e-branco. É que o mercado está aberto e há muito clube endinheirado (cof, cof… Barcelona… cof, cof…) a precisar de um extremo.