Luís Montenegro não desiludiu, Paulo Rangel não se comprometeu e Miguel Pinto Luz quase não compareceu. Pedro Duarte foi salomónico, Carlos Moedas jurou lealdade à nova liderança e José Eduardo Martins não chegou sequer a intervir. As intervenções de seis potenciais rivais de Rui Rio no Congresso do PSD eram aguardadas com muita expectativa, mas só Luís Montenegro se posicionou verdadeiramente para o futuro: não só anunciou a saída do Parlamento, como prometeu que não vai “pedir licença a ninguém” para avançar para a liderança do PSD assim o entenda fazer.

O posicionamento de Rui Rio no sentido de se aproximar do PS de António Costa nunca seduziu a máquina social-democrata que ficou órfã de Pedro Passos Coelho. E ainda antes derrotar Santana Lopes nas eleições internas do PSD, Rui Rio já tinha uma espada sobre a cabeça: ou vence as eleições europeias e legislativas de 2019 ou terá de enfrentar os críticos internos. Restava saber quem se ia posicionar já para essa corrida. E só Montenegro assumiu essa pretensão.

O ex-líder parlamentar prometeu não ficar na “sombra” da “intriga”, mas garantiu que não vai “pedir licença a ninguém” quando e se decidir avançar. Garantiu lealdade ao novo líder, mas sugeriu que o ex-autarca esperou dez anos para avançar para a liderança do partido. Pediu a Rio para esquecer a “intriguilhada”, mas definiu a fasquia: o PSD tem de ganhar as terceiras eleições legislativas consecutivas.

Rui Rio só pode ter um cenário: ganhar as terceiras eleições consecutivas e lutar por uma maioria no Parlamento. Concentre a sua energia e a energia da sua equipa no combate aos nossos adversários externos. Confio em si e sei que se vai afastar da intrigalhada e que vai avançar sem medo da sombra. A sombra só incomoda os fracos. Mas eu sei que Rui Rio é forte. Se algum dia entender [avançar para liderança do PSD], não vou pedir licença a ninguém“, afirmou Montenegro. Mais claro era impossível: o ex-líder parlamentar social-democrata tem as peças todas em cima do tabuleiro.

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Luís Montenegro, tal como Paulo Rangel, foi apontado como muita insistência para suceder a Passos, mas acabou por recuar, num gesto que acabou por ser interpretado pelos apoiantes de Rui Rio como um gesto de calculismo. Este sábado à tarde, o ex-líder parlamentar respondeu a todos aqueles que o acusaram de “falta de coragem”.

Acusar de falta de coragem alguém que passou os últimos anos, não no sofá, mas a dar o corpo às balas é inusitado e é injusto. Não fui eu que estive 10 anos à espera para disputar a liderança do PSD, entre desejos alternantes de ser primeiro-ministro e Presidente da República. Em matéria de coragem e autenticidade não levo lições de ninguém”. Quem é apontado como presumível candidato à liderança do PSD há mais de uma década? Rui Rio.

O (ainda) deputado tinha outra provocação para Rui Rio. Na noite eleitoral, o sucessor de Passos Coelho, que nunca escondeu a pretensão de arrumar a casa assim se tornasse líder, deixou um recado aos críticos: “O PSD não foi fundado para ser um clube de amigos, nem foi pensado para ser uma agremiação de interesses individuais”. Ora, até para isso Montenegro tinha uma resposta:  “Não transforme o partido numa agremiação dos amigos de Rui Rio“. Logo a seguir, o líder haveria de intervir a anunciar as suas listas para os órgãos nacionais.

O cachimbo da paz de Rangel

A intervenção de Paulo Rangel era também aguardada com muita expectativa — tinha afastado a candidatura à liderança do PSD por “motivos pessoais”. Mas, ao contrário de Montenegro, o eurodeputado fez questão de passar o cachimbo da paz a Rui Rio, afastando-se de qualquer campo de batalha virtual.

Este não é nem o tempo nem o momento para batalhas virtuais, nem para mapas astrais. As batalhas que temos pela frente são bem reais e neste contra-relógio, amigos e companheiros, não há espaço nem tempo para lutas virtuais”, afirmou num recado que parecia dirigir-se a Montenegro.

“As batalhas pelo nosso ideário humanista, de liberdade, justiça social e prosperidade contra a demagogia da frente vermelho-rosa começam aqui e agora e necessitam deste PSD, deste PSD unido e forte que está diante de nós”, disse o eurodeputado, que é vice-presidente do Partido Popular Europeu e vice-presidente da mesma bancada no Parlamento Europeu.

Com um discurso muito centrado  nas questões europeias, com muitas críticas ao PS, o eurodeputado fez uma intervenção mais morna que no congresso de há dois anos. Em 2016, fizera um discurso no conclave de Espinho a dizer que o PSD devia ser o partido da mobilidade social e depois fez uma proposta disruptiva: acabar com as referências s doutores e engenheiros nos documentos do Estado. Em Lisboa, foi mais discreto.

Miguel Pinto Luz. A carta que nunca escreveu

O ex-líder da distrital do PSD/Lisboa desafiou publicamente Rui Rio com uma carta aberta em que traçava uma série de linhas vermelhas para o novo líder do partido. A iniciativa caiu mal entre os apoiantes de Rio, que acusaram Miguel Pinto Luz de procurar protagonismo artificial depois de ter fugido das eleições internas.

Nas semanas que antecederam a reunião magna do PSD, Pinto Luz chegou mesmo a acusar Rui Rio de estar a tentar “fazer do PSD um novo Bloco e um novo PCP”. Agora, com Rui Rio a assistir na primeira fila, o vice-presidente da Câmara de Cascais moderou as críticas: pediu uma vitória a Rio em 2019 e exigiu que o partido lidere as reformas que o país precisa. Disse que não via que houvesse uma “necessidade de recentramento” do PSD e argumentou que não entendia que fosse uma discussão que interessasse aos portugueses.

Ainda sugeriu que o PSD exigisse a António Costa que fosse “honesto com os portugueses” e dissesse se estava “disponível para ser primeiro-ministro mesmo se perdesse as próximas legislativas”. Se há apoiantes de Pinto Luz para a liderança do PSD, terão de esperar por outra oportunidade. A sua intervenção foi uma revisão em baixa da assertividade da sua carta aberta.

Pedro Duarte. Próximo q.b., mas sem “cascas de banana”

O antigo líder da JSD e ex-secretário de Estado foi, durante muito tempo, uma das poucas vozes do partido que questionavam a liderança de Pedro Passos Coelho. Com a saída de cena do ex-primeiro-ministro, Pedro Duarte era visto como uma alternativa — ou, pelo menos, como parte de uma alternativa geracional a Rio e a Santana Lopes. O diretor de relações institucionais da Microsoft Portugal não apoiou qualquer candidato na corrida interna e será, ao que tudo indica, um nome a ter em conta no futuro do partido.

Neste Congresso, Pedro Duarte preferiu ser contido nos elogios e discreto nas críticas. Exigiu “renovação de rostos” a Rio, mas garantiu que não estava disponível para “ocupar cargos”. Assumiu que a vitória em 2019 é “difícil”, mas lembrou que o novo líder tem “vantagens” que Passos não tinha. Elogiou (timidamente) Passos, mas disse estar “satisfeito” com a eleição de Rio. Notou que ainda falta a este novo PSD um “novo discurso”, mas não se alongou nas críticas. Preferiu apresentar uma moção com o comissário europeu Carlos Moedas a defender um novo contrato social. E pouco mais.

“Já defendi, na altura praticamente isolado – ao lado do José Eduardo Martins – um rumo diferente no PSD, mas isso não significa que se possa dar agora essa mudança, que não haja mais do que tempo até às eleições legislativas”, sublinhou Pedro Duarte. Um sinal discreto de pressão que deve ser acompanhado com as afirmações do social-democrata ao Observador: “A última coisa que qualquer um de nós quer é colocar cascas de banana” no caminho de Rio.

A lealdade de Carlos Moedas

Marcelo Rebelo de Sousa não se cansa de o elogiar e de o apontar como um dos quadros mais valiosos do partido. Perante uma eventual derrota de Rio em 2019, o nome do comissário europeu da Inovação e Ciência começou a ser apontado com alguma insistência como alguém a ter em conta no presente e no futuro do partido.

A intervenção de Carlos Moedas, no entanto, foi pacificadora: não se esqueceu do papel do Pedro Passos Coelho como primeiro-ministro e jurou lealdade a Rui Rio, comparando os desafios que um teve e o que outro tem agora.

Quando chegámos ao Governo em 2011, os bem-pensantes sabiam que tudo ia correr mal. Sabiam que, mais cedo ou mais tarde, a coligação ia colapsar. Não colapsou. Sabiam que mais cedo ou mais tarde, íamos falhar uma avaliação da troika. Não falhámos. Sabiam que mesmo cumprindo não escaparíamos a um segundo programa. Escapamo-nos. Sabiam que apesar de termos evitado o segundo programa, íamos obviamente ter uma derrota esmagadora nas eleições. Ganhámos as eleições. Os mesmos bem-pensantes vaticinam que Rui Rio vai perder as eleições de 2019. Estão mais uma vez enganados”, afirmou Moedas.

José Eduardo Martins. O Congresso pela Luz e pelas bifanas

O discurso do antigo secretário de Estado do Ambiente tinha tudo para ser um dos momentos do Congresso do PSD: distante de Pedro Passos Coelho, José Eduardo Martins tinha prometido ir dizer umas coisas “inconvenientes” à reunião magna do partido. Aconteceu que, por motivos estatuários, estava impedido de se inscrever para discursar e como tal teve de mudar de ideias.

José Eduardo Martins já não vai intervir no Congresso. “Sempre se poupam 6 ou 7 minutos”

“Assim, olhe, sempre se poupam seis ou sete minutos do Congresso”, reagiu quando confrontado com essa impossibilidade. Prometeu escrever sobre o assunto e saiu do Centro de Congressos. Para onde? Para onde fala “à vontade” e “há bifanas”. E também já houve golos. E foram muitos: o social-democrata viu de perto a vitória do Benfica por 4-0 contra o Boavista, no Estádio da Luz. Fica para a próxima.