Turim. Depois de Amesterdão, o norte de Itália. Ultrapassado o trauma azul do Chelsea, chegava-se a um duelo com o branco vindo de Sevilha. Era a final da Liga Europa, mais uma. Ou melhor, a segunda e logo consecutiva a que o Benfica chegava. Logo aí repetia uma história – em 1961 e 1962 atropelou e para casa levou a Taça dos Campeões Europeus, em 2013 e 2013 aterrava nas decisões da Liga Europa.

Pelo meio, o pormenor que também já conta duas temporadas sucessivas a fazer manchetes – Béla Guttmann e a sua maldição. “Em 100 anos, o Benfica nunca mais ganhará uma taça europeia”, terão sido assim – ou parecidas – as palavras que o treinador húngaro disparou quando se foi embora do clube, após o Benfica lhe recusar um aumento de salário.

Acordar tarde BenficaRodrigoFinal

Os encarnados entravam no relvado remendados por cartões amarelos. No meio não estava Enzo, o trator a gasóleo argentino, e nas alas não apareceram Salvio ou Markovic, os extremos galopantes. Começaram antes André Gomes e Sulejmani. Os nomes estavam trocados e a equipa também ficou.

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A partida arrancou ao ritmo do Sevilha, paciente para roubar a bola ao Benfica mas frenético a fazer uso dela em contra-ataques. Perigo não havia muito, verdade (o primeiro remate à baliza do Sevilha só apareceu aos 37’). Mas eram Reyes, Vitolo e Bacca que mais ameaçam as balizas do relvado. E se o faziam, a culpa era de Rakitic – só nos pés do loiro, cabeludo e croata é que a bola encontrava algum descanso. Era o capitão do Sevilha quem recebia as bolas recuperadas pela equipa e decidia como a equipa atacava depois disso. Uma regra que se cumpriu o jogo inteiro.

Até aos 40’ foi assim – André Gomes perdia quase todas as bolas que recebia de costas para o inimigo, o Benfica emperrava a sair do meio-campo e o Sevilha mantinha o alerta com contra-ataques. Aos 41’, contudo, Rodrigou desperdiça uma oportunidade por teimar em rematar de pé esquerdo e, aos 45’, Maxi não conseguiu desviar um passe de Ruben Amorim para golo, a um metro das mãos amanteigadas de Beto. Aos 46’, Gaitán ainda caiu na área assim que Fazio se encostou nas costas. O árbitro? Nada.

O ping-pong de contra-ataques RakiticFinalCortada

Nem houve tempo para maldição na segunda metade. Unai Emery benzia-se no regresso ao relvado e talvez tenha sido isso a safar o treinador do Sevilha. O Benfica trouxera a catapulta do balneário e, logo aos 46’, quatro remates seguidos na área espanhol bateram sempre num corpo sevilhano. Foi o sinal. Aí arrancou uma sucessão de contra-ataques.

À vez, encarnados e andaluzes iam disparando flechas. Aos 51’ é Reyes a escapulir-se da perseguição de Luisão e a rematar ao lado. Aos 55’, Lima cai e grita-se penálti na área do Sevilha. Antes e depois há safanões que partem o jogo e concentram-no junto às duas balizas – cada equipa que tinha a bola partia o mais rápido que podia até ao outro lado. As pilhas esgotaram-se aos 60’ e tiveram ligadas à corrente até aos 84’.

Até Lima se lembrar de largar uma bomba e de Beto a desviar da baliza. Minutos depois, o guarda-redes português passa a ser amigo, sai mal a um cruzamento e a bola cabeceada por Garay sai um palmo por cima da barra. Até aos 90’, nada feito. E chegava o Benfica aos 180 minutos sem marcar neste estádio – já saíra sem golos da segunda mão das meias-finais, com a Juventus.

Prolongar e arrastar BenficaProlongamentoCortada

O Sevilha esfumou-se. As baterias só tinham carga para hora e meia e os 30 minutos de prolongamento só arrastaram a equipa em campo. Mbia, o trinco camaronês, tinha a coxa presa do ligaduras; Rakitic não recuava e só esperava pela bola; Carriço era um bombeiro mascarado de terceiro central.

O Benfica forçava, tinha a bola, encurralava os espanhóis na sua área. Tentava tudo, mas foi do pé torto de Carlos Bacca que apareceu a melhor oportunidade para alguém marcar um golo. Rakitic pediu ao colombiano para correr, meteu-lhe a bola, o avançado isolou-se e, antes de rematar, lembrou-se de entortar o pé direito e ligar o modo trivela. Quase resultava – a bola passou muito perto do ângulo direito da baliza de Oblak. Nada aconteceu e lá vieram os penáltis.

Penáltis malditos BenficaBetoCortada

Luisão juntou as tropas. As câmaras focavam Oblak. Jesus dividiu a responsabilidade por cinco. Lima, cansado mas frio de cabeça para marcar o primeiro. Cardozo, que tomou 15 metros de balanço, fez um passe que Beto defendeu – o guarda-redes português avançou uns bons dois metros para lá da linha da baliza. Rodrigo viu, foi o terceiro e  imitou o paraguaio quando o seu remate pouca força levou. De novo, Beto defendeu.

Nos entretantos, Bacca, Mbia e Coke nem hipótese davam a Oblak. O quarto penálti foi de Luisão. A bola entrou e o Benfica vivia uns minutos mais. Depois foi um luso-descendente a tudo terminar. Kevin Gameiro correu, marcou o último penálti e voltou a correr, de braços abertos e prontos a levantarem a taça que acabara de confirmar. O Sevilha vencia e, à segunda final consecutiva, o Benfica voltava a perder. Nem sempre os melhores ganham, lamentava Jesus no final. No alto do estádio, ao receber a medalha, Luís Filipe Vieira segurou-o num abraço e deu-lhe repetidas palmadas nas costas, enquanto lhe sussurrava algo.

Lá mais em cima (para os crentes), nem a companhia de Eusébio e Coluna convenceu Béla Guttmann a largar a maldição e a calar-se para sempre. Agora, as verdades. O Benfica perde a segunda final consecutiva da Liga Europa, sim, mas desta feita já com o campeonato e a Taça da Liga guardados no armário. Perdidas ou não, duas épocas com duas finais europeias deixam o clube nos holofotes, com mais dinheiro e mais prestígio. Afinal, a história ainda se pode escrever com a tinta que os adeptos querem ler – a 18 de maio há outra final, no Jamor, e a oportunidade de tudo conquistar em relvados nacionais. Aí, não há maldição.