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Desilusão. A 17 de dezembro de 2011, o Atlético de Madrid era isto. Tinha ultrapassado a fase de grupos da Liga Europa, sim, mas na liga espanhola aparecia em 11.º e acabava de ser eliminado da Taça de Espanha, em casa, por uma equipa da segunda divisão (0-1, com o Albacete). Gregorio Manzano, chega. Seis meses depois, à 17.ª jornada, o espanhol já não servia como treinador. Era preciso encontrar outro.

Os colchoneros olharam para a Argentina. Lá estava Simeone, o Diego que, enquanto jogador, andara pelo Atlético de Madrid, primeiro, de 1994 a 1997 e, depois, entre 2003 e 2005. Estava no Racing Club de Avellaneda mas não pensou duas vezes. “Não me assusta este desafio”, garantia, ao ser apresentado. À sua espera estava uma equipa criticada e a defraudar expetativas. Falcao, Diego, Arda Turan, Tiago, Miranda ou Gabi estavam sem confiança e não lutavam contra o cabisbaixo. No dia em que chega ao Atlético, diz a Miguel Ángel Gil, conselheiro do clube, que só tem um desejo: “A única coisa a que aspiro é que os adversários passem a não querer jogar contra nós.” Não demoraria muito.

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Com raça e coração. Durante os jogos berra, pula e gesticula sem parar. O lugar que lhe é reservado no banco de suplentes serve apenas para decorar. Simeone não para quieto. Está sempre em pé, de um lado para o outro, a dar ordens ou a bater palmas aos jogadores. É um adepto mascarado de fato e gravata.

É exigente. Pede tudo a quem está a correr dentro de campo, mas é o primeiro a retribuir-lhes com palavras sempre que obedecem e executam o plano. “Agradeço às mães destes jogadores, que os fizeram com uns cojones muito grandes”, disse, no dia em que o Atlético ultrapassou o Chelsea de Mourinho e confirmou a presença na final da Liga dos Campeões. E os jogadores gostam. “Para mim é o melhor treinador, porque nos faz ganhar”, resumiu Gabi, sexta-feira, na conferência de imprensa antes da final.

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Com o microfone à frente é honesto, frontal e direto. Não torna difícil o sorriso e parece ser de conversa fácil. Explica as opções que toma sem problemas e mostra como a equipa se prepara para as batalhas. Após derrotar o Chelsea, foi assim. Pensa no que lhe perguntam e não dá respostas simples, das pré-formatadas a que tantos treinador e jogadores recorrem. “Acho que não. Estou muito contente claro, mas mais por causa da responsabilidade de tínhamos neste eliminatória”, confessou, quando o questionaram se a vitória contra os blues fora o momento mais feliz da carreira.

No relvado ordena os jogadores em 4-4-2. Diz-lhes que sejam pacientes, que saibam onde e como fechar a defender e avisa-os que não terão a bola muito tempo. Não é o objetivo. Prefere controlar o espaço em vez da bola – mas quando a tiverem, a ordem é que a usem rápido para fazer mal ao inimigo. “Esta equipa transmite o que eu sinto”, sublinhou na sexta-feira El Cholo – o mestiço, em tradução literal.

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Não muito. De 1996 a 2002 fez 38 encontros na Champions, divididos entre Atlético de Madrid, Inter de Milão e Lazio de Roma. Apenas vence 15 jogos e, ao todo, as pernas acumulam 2952 – pouco mais do que ser totalista no campeonato português, por exemplo. Marca seis golos nas cinco edições em que participa – quatro na mesma época, com o Atlético. O melhor que faz é chegar três vezes aos quartos de final, em 1997, 1999 e 2000, sempre com camisolas diferentes vestidas (a ordem é colchoneros, laziales e interistas). As duas últimas experiências que faz na competição, em 2000 e 2001, não passa da fase de grupos

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Como resumir isto? Em apenas uma época (e na de estreia), Simeone já fez o que a maioria dos treinadores passa uma carreira a tentar. Nos 11 jogos com o Atlético na Champions, o argentino guiou a equipa até à final, sendo a única que ainda não somou qualquer derrota. Nem o Barça de Messi ou o Chelsea de Mourinho o conseguiram derrotar.

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Em dezembro de 2011 pegou num Atlético desfeito. Em maio de 2012 já estava numa final. Seis meses após chegar aos colchoneros levantava a primeira taça, ao ganhar a Liga Europa frente ao Athletic Bilbao. Nesse dia, por acaso, Simeone tirou uma camisa preta do armário. Vestiu-a e levou-a para a final. Como a venceu, a camisa ficou. “Sou muito cabulero”, admitiu depois ao El Mundo – a palavra cabulero, na Argentina, vem de superstição. Daí que ainda hoje se vista de negro. E a verdade é que não mais perdeu uma final – venceu a Super Taça Europeia em 2012 e a Copa do Rey em 2013.