Este vai ser um verão difícil para Jean-Claude Juncker, novo presidente da Comissão Europeia. Pediu 14 mulheres comissárias aos líderes europeus e até agora recebeu apenas três nomeações femininas, tem um nomeado que veio dizer no seu Facebook que não aceita ir para Bruxelas e um ministro dos Negócios Estrangeiros polaco que quer o cargo de Alto Representante, mas que em escutas disse que Cameron foi incompetente ao tentar opor-se à nomeação de Juncker. Ainda nem começou, mas esta Comissão já promete.

Não bastava a dificuldade de atribuir 27 pastas a 27 comissários indicados por 27 países diferentes (27 porque Juncker conta como comissário e assim o Luxemburgo já tem nomeado e pasta) no decorrer do próximo mês, o novo presidente da Comissão já tem problemas internos para resolver.

  • Mulheres, a dor de cabeça maior

As mulheres continuam a ser o calcanhar de Aquiles da comissão de Juncker. Apesar de ter reunido alguns pesos pesados da política europeia com ex-primeiros-ministros, ministro de várias pastas e comissários repetentes, apenas três destes nomeados são mulheres, numa comissão que queria 14 comissárias europeias (metade do colégio da Comissão). Para resolver o assunto a bem, Juncker já prolongou o período limite para a escolha de comissários até 30 de agosto (o prazo inicial era até 31 de julho).

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No mês que resta, o novo presidente pode retomar os contatos com os governos nacionais para pressionar os líderes europeus a repensarem as suas escolhas iniciais, quiçá, em troca de uma pasta com mais peso na Comissão. Será no entanto difícil pressionar países como a Alemanha ou a França que indicaram homens, mas são preponderantes no núcleo decisório da União, fazendo com que possivelmente Juncker se vire para os países mais pequenos. O luxemburguês corre mesmo o risco de ver a sua comissão reprovada no Parlamento Europeu por falta de mulheres.

  • O comissário que não quer voltar para Bruxelas

A Eslovénia terá dado inicialmente quatro nomes a Juncker como possíveis candidatos e disse ao ex-primeiro-ministro do Luxemburgo que seria ele a escolher, já que o país teve eleições a 13 de julho. Mas afinal só três é que estão na corrida: o ex-primeiro-ministro Alenka Bratušek, o ministro dos Negócios Estrangeiros Karl Erjavec e a eurodeputada Tanja Fajon. O quarto nomeado, Janez Potočnik, comissário europeu do Ambiente, veio dizer no seu Facebook que não estava disponível para continuar em Bruxelas.

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  • O novo comissário polaco que disse que Cameron é incompetente

Mas este não é o único embaraço. O ministro dos Negócios Estrangeiros polaco escolhido por Donald Tusk para a comissão Juncker, Radoslaw Sikorski, foi apanhado em escutas divulgadas por uma revista do seu país, a dizer que David Cameron, primeiro-ministro britânico, “tinha lixado tudo” novamente ao opor-se de forma veemente à escolha do antigo governante do Luxemburgo para liderar a Comissão, chamando-lhe incompetente. “Ou foi uma manobra muito mal pensada ou, e não pela primeira vez, é um género de incompetência no que diz respeito a assuntos europeus. Lembram-se? Ele lixou o Tratado Orçamental. Ele lixou mesmo aquilo”, diz Sikorski nas escutas.

“É simples como isto. Ele não está interessado, ele não entende, ele acredita na propaganda estúpida e estupidamente tenta subverter o sistema”, acrescentou Sikorski

Radoslaw Sikorski – que estudou em Oxford e fez parte do Bullingdon Club, mesmo clube de Cameron enquanto frequentava – manteve-se em funções apesar desta divulgação e recebeu o voto de confiança de Tusk para representar a Polónia no seio da Comissão. Palavras que até podem agradar a Juncker, dado o conflito aberto com Cameron, mas que podem vir a afetar a relação entre os comissários e da Comissão com o Reino Unido que em 2017 pode vir a referendar a permanência do país na UE.

  • O que é que se faz com um lord lobista em Bruxelas?

Outro problema de Juncker na relação com o Reino Unido é o comissário inglês. Lord Hill é o ex-líder da Câmara dos Lordes e no meio da recente reconfiguração do Governo britânico foi nomeado para integrar a equipa de Juncker. Logo após esta nomeação, Martin Schulz, presidente do Parlamento Europeu, terá dito que seria difícil os eurodeputados aceitarem alguém com as suas opiniões “anti-europeístas”, embora depois tenha desmentido estas declarações.

Lord Hill tem intercalado desde os anos 80 posições nos sucessivos governos com a atividade de lobista que exerce junto do poder político britânico, em 1998 ajudou mesmo a criar a consultora Quiller. Segundo o seu registo de interesses na Câmara de Lordes, Hill ainda detém uma participação na Huntsworth plc – empresa de relações públicas que em 2006 comprou a Quiller em 2006 por 7.5 milhões de euros. A Huntsworth detém uma das maiores empresas de lóbi de Bruxelas, a Grayling. Fica a cargo dos eurodeputados que vão ouvir os comissários em setembro se isto significa um conflito de interesses e a Juncker atribuir-lhe uma pasta em que seja insuspeito.

No entanto, a capacidade negocial de lobista é uma das qualidades apontadas pelos conservadores para enviar Hill para Bruxelas. “O primeiro-ministro está muito confiante que ele vai ganhar o respeito de Bruxelas. Não é segredo que Lord Hill partilha os pontos de vista do primeiro-ministro no que diz respeito à necessidade da Europa se reformar e mudar a relação que o Reino Unido tem com a UE”, sublinhou o porta-voz do nº10 de Downing Street.

  • Quando o ministro da Alemanha vem travar publicamente as ambições da França

O rumor da nomeação de Pierre Moscovici, ex-ministro das Finanças francês, para comissário europeu não convenceu Wolfgang Schäuble, ministro das Finanças alemão a meio de julho e a sua confirmação como o escolhido de Hollande não veio ajudar a este conflito. O presidente francês nomeou o seu antigo ministro das Finanças na esperança que a França fique com um portfólio económico, e até mesmo, uma das pastas mais cobiçadas, a dos Assuntos Económicos.

Mas Schäuble não partilha deste entusiasmo. O ministro alemão opõe-se a que França receba qualquer alívio sobre o seu défice, já que o equilibro das finanças públicas “só é possível através de poupanças”, questionando numa conferência em Freiburg se nomear alguém com responsabilidades que tem dificuldades em lidar com as próprias finanças para a principal pasta económica da Comissão envia a mensagem certa para dentro e para fora da UE.

Entretanto o ministro da Finanças, já desmentiu que esta mensagem fosse para Moscovici, com quem já esclareceu não ter qualquer conflito pessoal. Mesmo discordando do ministro francês em muitas situações no seio do Eurogrupo, Schäuble diz que o seu antigo homólogo francês é um governante de “confiança” e um “parceiro racional”.