A abertura de novos alojamentos e unidades hoteleiras em Lisboa não tira o sono a empresários do setor, que defendem existir “mercado para todos”, mas alertam para a necessidade de se preservar a identidade da cidade.
“Ter uma oferta diferenciada é muito bom, porque dá ‘destino’ a Lisboa. Não pode ser só [hotéis de] cinco estrelas, não pode ser só ‘hostels’, mas ter um bocadinho de tudo já dá para todos”, disse à Lusa Heleen Uitenbroek, proprietária do Hotel Santiago de Alfama.
O ’boutique’ hotel, com 19 quartos, abriu a 01 de julho, aproveitando alguns elementos das ruínas de uma fábrica de camisas e roupa interior de senhora, no espaço do antigo Palácio dos Castros, do século XV. É um dos 12 hotéis que abriram na cidade este ano, de um total de 23 previstos.
“Há mercado para todos, o turista que vem para o hotel não vai para o alojamento local e o do alojamento local não vai para o hotel”, frisou Maria João Coelho, gerente da Pensão Praça da Figueira.
A pensão está classificada como alojamento local, embora nada tenha a ver com os apartamentos particulares que, desde novembro de 2014, podem registar-se com a mesma categoria para acomodar turistas.
A unidade, instalada entre o segundo e o quarto piso de um prédio numa esquina da praça que lhe dá o nome, costuma ter os 32 quartos “sempre cheios, pela localização” e porque “há muita procura”, reconheceu Maria João Coelho.
A abertura de hotéis e apartamentos leva os residentes mais antigos a queixarem-se da redução da habitação, mas a gerente da pensão apontou como positivo a reabilitação do edificado na Baixa.
“É pena se a Baixa ficar só com lojas para turistas. Acho que tem de ficar com lojas para todos, para portugueses e para turistas, porque é isso que as pessoas procuram, não é montes de postais e coisas feitas na China”, notou Heleen Uitenbroek, holandesa que se lançou no ramo em 2009, com um pequeno hotel no Chiado.
A dois passos da Praça Luís de Camões, o PH in Chiado — Hostel & Suites ocupa os pisos superiores de um edifício de finais do século XVII, com 12 quartos e capacidade para 36 hóspedes, repartidos por quartos e camaratas.
“Vamos sempre ter essa necessidade e esse gosto de manter o que é característico e o que é autêntico de Lisboa para mostrar a toda a gente, e não é uma procura excessiva que vai alterar essa nossa identidade”, comentou Raquel Paradella, gerente do negócio familiar.
A unidade tem visto subir a procura ao longo do ano, “sempre com bom tempo”, e a gestora da Paradella’s Houses destacou como positivo o aumento de visitantes numa Baixa que, antes, “estava muito deserta”.
O centro da cidade encheu-se de turistas que, em pleno agosto, calcorreiam em grupo as ruas estreitas de Alfama ou tiram “selfies” com os filhos ao colo da estátua do poeta Fernando Pessoa, no Chiado.
As opções de alojamento variam consoante o tipo de turista, as circunstâncias da viagem e as preferências. Juliette Descroix, 18 anos, viajou de Paris (França) com quatro amigas e escolheram Lisboa por ter praia perto, optando por arrendar um apartamento, por ser mais barato e poderem confecionar refeições, contou à Lusa.
Jesús de Pedro, 31 anos, e Sandra Moreno, 27 anos, são de Bilbau (Espanha), deslocaram-se de comboio desde a cidade basca de Vitoria e, na comparação com um apartamento, acharam mais barato um hotel no Chiado. Sandra mostrou-se agradada com a arquitetura, a comida e o “ruído, um pouco caótico”, da cidade.
Para Mar Herranz, 54 anos, de Barcelona, a viagem com uma prima não correu como esperado, devido ao apartamento no Bairro Alto, onde “há muito barulho”, mas elogiou os portugueses, “muito afáveis e cavalheiros”.
Bernardo Schmitt, 58 anos, de Munique (Alemanha), escolheu um hotel afastado da confusão do centro, para ficar com o filho, deslocando-se de metro para a Baixa, onde se queixa de “demasiados turistas”.
“Ontem fomos a Sintra, não conseguimos entrar, não havia espaço”, lamentou o turista, apesar da espera “durante uma hora” na vila romântica da periferia, que da sua experiência — a terceira vez no país, segunda em Lisboa — prefere maio para visitar a capital.
O diretor-geral da Associação de Turismo de Lisboa (ATL), Vítor Costa, estimou que “o setor do turismo represente à volta de 14% do PIB [produto interno bruto] da cidade de Lisboa”, que “terá 35 mil turistas por dia”.
“Se compararmos com outras cidades, por exemplo o caso de Barcelona, que é muito usado, temos menos de metade das dormidas em Lisboa”, salientou, em entrevista à Lusa, comparando os 8,4 milhões de dormidas na capital portuguesa, em 2014, com os 17,4 milhões da cidade catalã.
O também presidente da Entidade Regional de Turismo da Região de Lisboa considerou que ainda há margem para o aumento da oferta, desde que de forma sustentada, para “acompanhar o crescimento da procura”.