As coisas não têm estado fáceis para Donald Trump. À beira de um segundo debate presidencial frente a Hillary Clinton (que o Observador vai acompanhar em direto a partir das 2h00 de Lisboa), o magnata republicano está na posição mais frágil desde que assumiu a sua candidatura à presidência dos EUA.
Se nos cingirmos apenas às últimas duas semanas, a lista cronológica de passos em falso e polémicas em torno do candidato às presidenciais norte-americanas é esta: 1. Prestação fraca no primeiro debate frente a Hillary Clinton, que demonstrou estar mais bem preparada e revelou o caso de Alicia Machado, uma ex-Miss Universo a quem Trump chamou de “porca”; 2. Envio da parte de Donald Trump de uma série de tweets às 3h20 da manhã sobre Alicia Machado, que acusou falsamente de ter uma sex tape; 3. Revelação da declaração fiscal de 1995 de Trump por parte do The New York Times, que revela prejuízos de mais de 900 milhões de dólares, mostrando que o milionário pode não ter pagado impostos durante 18 anos; 4. Mike Pence, a escolha de Trump para vice-Presidente, demonstrou a calma que tem faltado ao seu número um, acabando por vencer o debate contra o democrata Tim Kaine e por superar o magnata nova-iorquino no campo político; 5. O Washington Post tornou pública uma gravação de 2005 onde Donald Trump diz que por ser famoso beija e mexe nas partes íntimas das mulheres sem lhes pedir permissão.
O parágrafo anterior foi longo, mas não tanto quanto foram as duas últimas semanas para Trump. As sondagens são a prova disso. No site FiveThirtyEight (que nas eleições de 2012 previu corretamente a votação de todos os 50 estados dos EUA), a probabilidade de uma vitória do republicano caiu a pique.
A 26 de setembro, horas antes do primeiro debate presidencial, os números eram estes: 54,8% de probabilidade de uma vitória de Clinton; 45,2% de probabilidade de uma vitória de Trump. Ou seja, apenas 9,6% de diferença (Nota: falamos de probabilidade de vitória e não de percentagem do voto popular).
Agora que o segundo debate está prestes a começar, os números são drasticamente diferentes. Hillary Clinton subiu substancialmente, tendo agora 81,3% de probabilidade de vencer no dia 8 de novembro. Trump desceu até aos 18,7%. Ou seja, de uma vantagem de 9,6%, Clinton subiu para outra bem maior, de 62,6%.
Crucial para estes resultados foram as alterações do sentido de voto em muitos estados conhecidos como swing-states, onde a tradição de voto não é definida e, assim, podem pender para os dois lados. Nas duas semanas que passaram, vários estados onde Trump estava à frente passaram para o lado de Hillary. É o caso da Florida (sem o qual o candidato dificilmente vencerá as eleições), do Nevada, do Ohio, do Iowa e da Carolina do Norte. Além disso, os swing-states onde Clinton já tinha uma vantagem ligeira estão agora mais seguros para a democrata: Pennsylvania e New Hampshire.
O debate mais violento da história?
Conseguirá Trump inverter esta tendência? E que estratégia usará esta noite?
“Who the hell knows”, foi a resposta de Harry Enten, comentador e jornalista no FiveThirtyEight, numa gravação ao vivo do podcast daquele site.
Porém, pelas pistas que Trump tem dado, o debate desta noite pode muito bem vir a ser um dos mais agressivos da história dos EUA. A promessa já tinha sido feita no final do debate inicial, com Trump a dizer que se estava a “controlar” por “respeito” a Chelsea Clinton — filha de Hillary e Bill Clinton —, deixando no ar a ideia de que se estava a referir ao historial de infidelidade do 42º Presidente dos EUA. Logo a seguir, numa conferência, disse que ia deixar o “politicamente correto” para trás.
E recentemente, a braços com a polémica do vídeo divulgado pelo Washington Post, também deixou sinais de que vai insistir nas infidelidades de Bill Clinton. No seu pedido de desculpas tépido, disse o seguinte: “Eu tenho dito algumas coisas parvas, mas a há uma grande diferença entre as palavras e as ações. Bill Clinton já abusou de mulheres e a Hillary ameaçou, atacou, envergonhou e intimidou as suas vítimas. Vamos discutir um pouco disto nos próximos dias. Vemo-nos no debate de domingo.”
Já depois disto, Trump retweetou dois posts de Juanita Broaddrick, que em 1999 acusou publicamente Bill Clinton de a ter violado em 1978. “Quantas vezes é preciso dizê-lo? As ações falam mais alto do que as palavras. Donald Trump disse coisas más. Hillary Rodham Clinton ameaçou-me depois de Bill Clinton me ter violado”, escreveu numa das mensagens.
How many times must it be said? Actions speak louder than words. DT said bad things!HRC threatened me after BC raped me.
— Juanita Broaddrick (@atensnut) October 8, 2016
Hillary calls Trump's remarks "horrific" while she lives with and protects a "Rapist". Her actions are horrific.
— Juanita Broaddrick (@atensnut) October 8, 2016
E o que é que isto tem a ver com política? Pouco ou nada. Mas, depois de um debate entre os dois candidatos a vice-Presidente onde, apesar de tudo, a política foi a personagem principal e que atraiu apenas 35,6 milhões de espetadores, a expectativa para o debate desta noite é muita. Já há quem arrisque que as audiências vão ultrapassar o recorde absoluto estabelecido pelo primeiro debate entre Clinton e Trump (84,4 milhões).
À mesma hora, as televisões vão transmitir um jogo de futebol americano, entre os New York Giants e os Green Bay Packers. Se o critério para uma boa noite de domingo em frente à televisão for a violência, talvez os norte-americanos queiram mudar para o debate.
—
Nota: Depois da publicação deste texto, e pouco menos de hora antes do início do debate, Trump convocou uma conferência de imprensa surpresa com três mulheres que têm acusado publicamente Bill Clinton de violação: Juanita Broaddrick, Paula Jones e Kathleen Willey. A estas, junta-se Kathy Shelton, vítima de violação aos 12 anos, cujo agressor foi defendido por Hillary Clinton em tribunal, à altura uma advogada em início de carreira.
Quanto a Trump, o candidato republicano disse no início da conferência de que “estas quatro mulheres muito corajosas pediram-nos para estarem aqui e foi uma honra para nós ajudá-las”. Fora isso, pouco ou nada disse, recusando-se a responder às perguntas dos jornalistas.
Veja o vídeo completo da conferência de imprensa: