Charlie Hebdo, Paris, Nice e Berlim. Em comum, estes locais têm o facto de terem sido palco de recentes atentados terroristas. Em comum, também, têm o facto de, em todos eles, os criminosos terem deixado no local do crime os seus documentos de identificação.

Aquilo que, à partida, pode parecer um descuido ou, até, uma manobra de distração para iludir as autoridades tem uma explicação bem mais simples. “No fundo o que querem é ser identificados, pois pretendem ficar na História como os mártires de Alá“, atestou ao Observador José Anes, do Observatório de Segurança, Criminalidade Organizada e Terrorismo (OSCOT).

O também professor universitário, que dá a cadeira de “Terrorismo e Informações estratégicas” na Universidade Lusíada, destacou que, no início, as polícias consideravam essa atitude como uma manobra de distração. “A princípio pensava-se que estariam a deixar as identificações de outras pessoas de modo a que as polícias fossem atrás dessas pistas. No entanto, à luz do que se tem vindo a apurar sobre estes radicais, chegou-se à conclusão que tal atitude seria propositada para reforçar a reivindicação do ataque”, avançou.

O membro do conselho consultivo do OSCOT salientou, ainda, que essa particularidade, que tem vindo a acompanhar os últimos casos onde ocorreram graves atentados, poderá estar ligada à forma como essas pessoas são radicalizadas pelo Estado Islâmico. “São pessoas que não têm qualquer medo da morte, aliás, para eles a morte é a passagem para algo melhor. E nesses atos só pretendem ser reconhecidos enquanto heróis, pois são vistos enquanto tal ao protagonizarem os crimes em nome do radicalismo”, destacou.

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A situação mais recente ocorreu em Berlim. Anis Amri, o principal suspeito do ataque ao mercado de Natal de Berlim, entretanto abatido a tiro pela policia italiana, deixou uma carteira com o documento de identificação no interior do camião de que se serviu para abalroar uma multidão, causando 12 mortos e 48 feridos.

Em janeiro de 2015, no ataque ao Charlie Hebdo, um dos irmãos envolvidos no ataque, Said Kouachi, também deixou um documento de identificação dentro do carro que roubou quando encetou uma fuga após o massacre na redação do jornal satírico francês em que morreram 12 pessoas.

Ainda em novembro desse ano e também em Paris, 130 pessoas morreram na sequência de vários atentados na capital francesa, na sala de espetáculos Bataclan, em dois restaurantes e nos arredores do Estádio de França. Nessa altura, um passaporte de um dos alegados envolvidos foi encontrado no exterior do recinto desportivo.

Neste verão, em Nice e por ocasião das celebrações da Tomada da Bastilha, um camião conduzido por um franco-tunisino abalroou uma multidão que se encontrava nas comemorações, causando a morte a 84 pessoas. Também nesse caso, um documento de identificação, de Mohamed Lahouaiej Bouhlel, de 31 anos, foi encontrado no interior do camião.