Na próxima semana o Parlamento volta a pegar nos temas da transparência no exercício de funções públicas. A comissão eventual estava suspensa à espera da reorganização interna do PSD, mas retoma agora os trabalhos começando por uma mudança de presidente. O arranque para a fase de votação das propostas dos partidos começa, assim, dias depois de o Grupo de Estados contra a Corrupção (GRECO), do Conselho da Europa, ter mostrado insatisfação com a falta de avanços no Parlamento sobre as recomendações feitas há três anos em matéria de conflitos de interesses, controlo de riqueza e código de conduta.

O presidente da comissão eventual (ainda) é Fernando Negrão que disse ao Observador que vai marcar uma reunião para o início da próxima semana e que servirá para passar a pasta a um novo presidente, já que entretanto foi eleito presidente do grupo parlamentar social-democrata. Negrão não avança quem será o seu sucessor, no entanto, a escolha deve recair sobre Luís Marques Guedes, que é atualmente o coordenador do PSD nessa comissão.

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Negrão também diz que a nova direção do partido “já definiu uma linha” a seguir nas votações de cada uma das iniciativas legislativas dos partidos que estão nesta comissão e que tocam temas como um código de conduta para os deputados, alterações ao regime de incompatibilidades e impedimentos dos titulares de cargos políticos e de altos cargos públicos, enriquecimento injustificado, controlo de riqueza dos titulares de cargos públicos, estatuto do deputado e ainda a legitimação da prática do lobbying na Assembleia da República.

O PSD tem cinco iniciativas legislativas entregues para serem votadas na comissão eventual, das 22 que existem, e não exclui que ainda possam entrar outras no decorrer da votação da especialidade (um palavrão que, no léxico parlamentar, quer dizer que os projetos são dissecados e votados um a um, artigo a artigo). Um dos capítulos que o PSD ainda mantém em aberto é o do lobby. O CDS e o PS têm iniciativas que legalizam a existência desta prática no Parlamento, e o PSD tem um projeto alinhado que vai no mesmo sentido, mas decidirá mais adiante se avançará com ele, explicou o líder parlamentar.

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Quanto às declarações de Rui Rio sobre o pacote legislativo da transparência, Negrão também não detalha que tradução terá nas votações do PSD. Rio disse, em entrevista à Antena 1, que não alinha em “populismo e demagogia” e mostra-se pouco receptivo a um reforço de restrições aos deputados. Ora, o PS, por exemplo, tem entre os seus projetos limitações para deputados que tenham a advocacia como atividade profissional paralela. Confrontado com esta proposta concreta, Negrão não diz ser “líquido” que o PSD vote contra. Depende da negociação que vai ser feita sobre cada um dos projetos que serão votados nas próximas semanas.

A discussão sobre estes temas também não está firme na bancada do PS. Recorde-se que nas últimas jornadas parlamentares do partido, em Coimbra, muitas foram as vozes que se levantaram para criticar as iniciativas legislativas alinhadas pela direcção do grupo parlamentar.

Ao Observador o coordenador do PS na comissão eventual diz que não há recuos nas propostas que o partido já apresentou e que o grupo parlamentar só está a aguardar que os trabalhos retomem. Quanto ao que diz o GRECO, Pedro Delgado Alves diz que apenas uma recomendação de 2015 foi seguida “mas todas as outras estão pendentes e em discussão”. “Estamos a proceder a alterações, se o relatório de avaliação fosse daqui a seis meses, o resultado seriam mais recomendações seguidas”. E quanto ao tempo que os deputados levaram a avançar nesta matéria, o deputado socialista diz que “isto é uma democracia, demora a construir consensos”.

Na avaliação do GRECO sobre as 15 recomendações deixadas a deputados e juízes há três anos, fica o registo “com interesse” de uma “reforma ambiciosa” que o país está a lançar para “reforçar a integridade, aumentar a responsabilidade e aumentar a transparência” de vários titulares de cargos públicos, incluindo deputados. Mas, três anos depois das recomendações feitas, o GRECO também diz que estas questões ainda estão “numa fase relativamente inicial e precisam de maior clareza e concretização”. Nomeadamente, em matéria de conflito de interesses de deputados, nas declarações de património e nas sanções aplicadas a quem não cumpre o que está na lei.