A GNR pediu à Unidade de Informações Desportivas da PSP colaboração para conseguir identificar os 23 suspeitos que na tarde de terça-feira invadiram a academia do Sporting, em Alcochete. Entre os suspeitos estão adeptos do Sporting ligados à Juventude Leonina, uns relacionados com o movimento Ultra e outros com os Casual, apurou o Observador. A informação reunida pelos spotters da PSP que trabalham no terreno tornou-se fundamental para descobrir quem são os homens que provocaram ferimentos a jogadores e técnicos do Sporting.

O movimento casual, que tem origem em Inglaterra, tem preocupado as autoridades por integrar adeptos cujo objetivo é escapar ao controlo policial — o que obriga, também, a pensar em opções de policiamento diferentes quando se fala em jogos de futebol. “O movimento casual deriva do hooligan. Enquanto no Ultra há um apoio incessante ao clube com cores, com megafones, com cânticos, os casual não recorrem a nada disso para poderem fugir ao controlo policial. Este movimento está presente em várias claques nacionais”, disse ao Observador uma fonte policial.

Um comandante de uma divisão da PSP do Porto sabe bem como eles atuam. Numa entrevista a um colega, para uma dissertação de mestrado sobre a PSP e a gestão de adeptos, descreveu que no dia em que uma centena de casuals do Sporting irrompeu no estádio do Dragão e partiu para a agressão de adeptos adversários, a 27 de outubro de 2013, estava de serviço e viu como eles chegaram. Naquele momento as consequências não foram maiores porque o público ainda era reduzido e foi “fácil” reagrupar os adeptos e encaminhá-los para um “local adequado”.

Ainda assim, um ano depois, na acusação proferida contra 87 dos 102 adeptos constituídos arguidos, o Ministério Público referia que os suspeitos tinham intenções de entrar às escondidas no recinto e, durante o jogo contra o Sporting, iniciar uma rixa com os adeptos do clube azul e branco. “Queriam provocar efeito-surpresa e assim muitos deles, no meio da confusão, entrariam no recinto desportivo para cometer atos de violência”, acusou o procurador. Entre os arguidos estavam também seis membros dos Super Dragões, um deles Fernando Madureira. Só dois arguidos acabaram por ir a julgamento, uma vez que todos os outros aceitaram pagar um valor a uma instituição ou prestar trabalho comunitário para verem o processo ser suspenso provisoriamente.

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“Naquele caso concreto”, refere o oficial da PSP, referindo-se ao caso no Estádio do Dragão, algo escapou à polícia. “Esses grupos com elevada capacidade de movimentação e deslocação saíram de Lisboa e foram-se agrupando ao logo do trajeto, incluindo paragens em restaurantes. Deslocaram-se em carros gama alta e média. É um fenómeno para o qual estávamos expectantes, mas como noutras coisas da vida a surpresa negativa aconteceu”, reconheceu. A PSP tinha informações das horas a que este adeptos saíam de Lisboa e qual seria o destino. Mas como eles ainda pararam para almoçar, a PSP acabou por deixar de os monitorizar. Chegariam ao Dragão no pior momento: aquele em que a PSP estava empenhada “na segurança do trajeto na deslocação e na receção das equipas”. “O crime de hostilidade era público”, sublinha.

A fonte contactada pelo Observador diz que o movimento casual é transversal aos vários clubes. Mesmo aos mais pequenos. Ainda em janeiro a PSP de Braga conseguiu dispersar, com tiros para o ar, um grupo de uma centena de adeptos que se aproximou, vestido de negro e de caras tapadas, do estádio municipal de Braga — num cenário semelhante ao que a GNR acabou por encontrar esta terça-feira na academia de Alcochete.

Para o polícia que os viu atuar nos Dragões, “interessa analisar o que motiva os casual“. Estes homens e mulheres “desprezam os Grupo Organizados de Adeptos” (claques), não se alinham com as direções dos clubes, tentam subtrair-se ao controlo policial e tentam camuflar-se com roupas, que até acabam por os identificar (roupa negras)”, descreve. Nalguns casos, trazem consigo adereços e roupas com as cores do clube que posteriormente exibem no interior dos estádios — como a PSP já constatou nalgumas revistas.

“É um fenómeno internacional. Para além dos casos conhecidos a nível nacional, temos outros registos no Porto (FCP) de casuais afetos a equipas internacionais visitantes. R. Celta de Vigo. Atlético de Bilbau, Paris St. Germain, além de outros. Transportam até à abordagem policial, materiais considerados perigosos, tais como: objetos de agressão diversos, armas brancas, bebidas brancas em garrafas de vidro, drogas, inscrições ou imagens/desenhos ilegais, por apelar à violência, ao racismo e à xenofobia, à intolerância”, refere a PSP.

A GNR, que deteve 23 supeitos em Alcochete, diz ter apreendido vários “artigos relacionados com os crimes”. Recorde-se que foram cerca de 50 os suspeitos que invadiram a academia do Sporting, agrediram funcionários, treinador e jogadores e ainda destruíram os balneários. “Já tinha havido episódios de claques a entrarem nas academias para fazerem pressão sobre os clubes, mas um caso destes assim parece-me excecional”, reconheceu a fonte contactada pelo Observador.

A inspiração dos casual portugueses, que terão começado a crescer em Portugal há cerca de oito anos, reside nas claques inglesas dos anos 1980, mais concretamente num grupo que se vestia de determinada forma para ir ver o futebol (os ténis da Adidas são uma das imagens de marca) e que não estava associado a fenómenos violentos. Muitos deste grupos usam as datas de formação dos seus clubes nos seus nomes e recorrem a palavras como “nação, pátria e orgulho”, o que  para as autoridades demonstra a sua ligação à extrema-direita.