A paixão de Julen Jimenez era a bola de futebol. Foi o pai que o ensinou a jogar. Quando o verão chegava e as temperaturas subiam, era vê-lo “sempre na rua, a brincar com os primos, a brincar com a bola”, contou ao Observador a vizinha María. Era esse o brinquedo favorito da criança de dois anos. Esse e um triciclo verde que até agora continua à porta da casa dos pais, no número 44 da rua Almagro y Cardenas em Totalán, Málaga, à espera que o bebé volte a casa.

O triciclo de Julen ainda está à porta de casa. Os vizinhos rezam para que o venha buscar

Mas Julen não vai voltar. Ao fim de treze dias de buscas nas profundidades de um túnel com 107 metros e 25 centímetros de diâmetro, o bebé de dois anos foi encontrado morto a 73 metros de profundidade, logo abaixo da massa compacta de terra encontrada dentro da perfuração de prospeção de água. Foram precisas quase 300 horas de buscas para se chegar ao desfecho que contrariou a persistente esperança dos pais da criança.

PUB • CONTINUE A LER A SEGUIR

José Rosellio e Vicky Jimenez, os pais, ambos com 29 anos, cresceram em El Palo, no mesmo bairro em Totalán onde agora moram. Começaram a namorar a 11 de setembro de 2001 e casaram pouco depois. “Lembramo-nos sempre disso. Como esquecer? Foi o dia do ataque às Torres Gémeas. Éramos apenas crianças, estivemos juntos as nossas vidas todas”, recordou ele numa entrevista ao Diário Sur.

Esta não é a primeira vez que o jovem casal passa pela morte de um filho. Óliver, pouco mais velho que Julen, morreu na primavera de 2017. “Mamã, ajuda-me que estou cansado”, alertou o rapaz enquanto brincava com a prima durante um passeio que a família fez à praia. Depois abrandou o ritmo da corrida, começou a fechar os olhos como se tivesse sono e caiu na rua.

Não era a primeira vez que isso acontecia, mas daquela vez o episódio foi fatal. “Pensava que estava vivo. Chamaram a ambulância, assistiram Óliver, mas ele já estava morto”, conta Lleliam, outra vizinha da família, ao Observador. Tinha sucumbido a um ataque cardíaco fulminante. Os amigos de José e Vicky dizem que o casal estava agora “a aprender a viver com isso” e planeava “dar um irmãozinho ao Julen porque a vida lhe tirou o outro”.

https://twitter.com/julie67610224/status/1088985029458444288

Segundo a vizinhança, esta família não está “amaldiçoada”, mas sim “destroçada”: “Tinha o meu coração partido em mil pedaços pela perda do Óliver. E agora tenho-o partido em três mil porque dentro de um dia ou dois posso ficar sem ele”, disse José Rosellio cinco dias depois do desaparecimento do filho mais novo. Ao fim de 13 recebeu a notícia de que Julen também os tinha deixado, era 01h25 em Málaga e menos uma hora em Portugal Continental.

A forma como tudo aconteceu está agora a ser analisada pela polícia, mas o pai já explicou aos jornalistas as memórias que guarda do fatídico dia. A 13 de janeiro, um domingo, a família tinha-se juntado no terreno do companheiro de uma prima, que ia construir ali uma casa, para fazer uma paella ao almoço. Enquanto Vicky avisava a casa de hambúrgueres La Cala que não ia trabalhar nesse dia, José tinha de acender uma fogueira e olhar por Julen.

Pai de Julen relata o que aconteceu no dia do acidente: “O papá está aqui e o teu irmãozinho vai ajudar”

O bebé estava a quatro ou cinco metros dali a brincar com uma prima que também tinha dois anos. Mas quando José virou costas para apanhar uns galhos do chão, Julen começou a correr para dez a quinze metros de onde estava. “O menino! O menino!”, gritou a mãe da menina com quem Julen brincava. De repente, o bebé tropeçou para dentro de um buraco junto de uns pedregulhos atrás dos arbustos.

José aproximou-se do local onde Julen desapareceu, arrastou as pedras para mais longe e enfiou o braço dentro do poço até ao ombro na esperança de encontrar o filho. O braço não alcançou Julen mas ali, com o rosto colado ao chão poeirento da montanha, José ainda chegou a ouvir o filho chorar. “Tem calma, o pai está aqui e o teu irmãozinho vai ajudar-nos”, disse ele a chorar. Treze dias depois, com 26 de operacionais envolvidos nas buscas — oito mineiros, 10 agentes da Guardia Civil e oito bombeiros —, Julen Jimenez foi encontrado sem vida. Tinha apenas dois anos. E morreu dois anos depois do seu irmão.

[Vídeo: Silêncio por Julen no fim de “um sonho que não pôde tornar-se realidade”]