Há um problema numa das medidas aconselhadas pelas autoridades de saúde para evitar o contágio com o novo coronavírus: ninguém consegue parar de tocar no rosto. A Organização Mundial da Saúde está a pedir ao mundo que “evite tocar nos olhos, nariz e boca” porque, caso transporte o COVID-19 nas mãos, isso pode colocá-lo em contacto com as vias respiratórias.
Mas essa é uma tarefa mais complicada do que parece. Um jornalista do Observador filmou-se durante uma hora frente ao computador. Pode ver aqui quantas vezes tocou inconscientemente no rosto:
Evitar tocar no rosto é tão difícil que nem a diretora de um departamento de saúde pública norte-americano conseguiu seguir a sua própria indicação. Numa conferência de imprensa, Sara Cobey disse: “Comecem a trabalhar em não tocar no vosso rosto”, mas poucos segundos levou o dedo à boca para virar com ele a folha do discurso. O momento tornou-se viral e pode espreitá-lo aqui em baixo.
Certo é que ninguém consegue fazer muito melhor do que ela. Um pequeno estudo publicado em 2015 por uma escola de saúde pública australiana descobriu que cada um dos 26 participantes na investigação tinha tocado no rosto, em média, 23 vezes por hora.
Se está impressionado pela quantidade de vezes que toca no rosto, o próximo dado pode deixá-lo ainda mais espantado: em 44% dessas vezes, as mãos mexiam diretamente na boca, no nariz ou nos olhos — precisamente as zonas mucosas que o vírus utiliza para entrar no organismo e provocar uma infeção.
Na verdade, tocar no rosto é um ato espontâneo que praticamos sem nos darmos conta disso desde que somos um feto em desenvolvimento no útero. As teorias sobre o motivo multiplicam-se na literatura científica, mas nenhum estudo é conclusivo.
Uns estudos argumentam que é um sinal de stress, outros dizem que é uma forma inconsciente de demonstrar sentimentos e alguns dizem que está enraizado nos nossos comportamentos mais animalescos para espalhar o nosso odor.
Não há certezas sobre as causas, mas há truques para evitar levar as mãos ao rosto e contribuir para ajudar a travar a epidemia de COVID-19:
Utilize o site “Don’t Touch Your Face”. Se mantiver esta página na internet ligada e lhe der acesso à câmara do seu computador, recebe uma notificação sempre que tocar no rosto. Primeiro, tem de se filmar durante alguns segundos sem levar as mãos à cara. Depois, deve gravar-se durante mais alguns segundos a fazê-lo sem parar (desinfete as mãos antes, claro). E já está! A partir de agora, sempre que tocar no rosto, o algoritmo de machine learning vai enviar-lhe esta mensagem: “Tocaste na tua cara” ao lado de um emoji triste. A página não garante que vai mesmo quebrar o vício. Mas pode ajudar.
Mantenha um objeto à mão. Se mantiver as mãos ocupadas, é menos provável que insista no hábito de as levar até ao rosto. Aperte uma bolinha anti-stress, por exemplo. Se tem por costume tocar no rosto enquanto está a raciocinar sobre alguma coisa no seu local de trabalho, tente habituar-se antes a mexer no relógio, num anel ou num elástico para o cabelo que tenha em redor do pulso. Outro truque pode ser esfregar as mãos se elas estiverem paradas ou colocá-las no bolso até que necessite delas para voltar ao trabalho. Mas não se esqueça de lavar regularmente e desinfetar qualquer um destes objetos.
Lave as mãos com sabonetes com cheiro. Uma das mais importantes tarefas que pode fazer caso queira cortar o mal pela raiz é perceber que situações desencadeiam em si o ato de levar as mãos ao rosto. Como isso nem sempre é fácil de detetar, experimente usar sabonetes com cheiros intensos para lavar as mãos. Assim, é mais provável que se aperceba da proximidade das suas mãos ao rosto de cada vez que as movimenta em direção à cara. Quando isso acontece, reflita sobre o que pode ter provocado esse ato — foi o cansaço? Ou talvez o stress? Depois, é só tentar eliminar esses fatores.
Faça uma competição com o colega do lado. Um dos truques para eliminar um hábito inconsciente pode ser arranjar uma espécie de Voz da Consciência. Se colocar um post-it no ecrã do seu computador não for suficiente, peça ao seu colega do lado que lhe indique sempre que o apanhar a tocar em algum sítio da cara. Combinem uma palavra de alerta e experimentem transformar isso num jogo. Por exemplo, quem for apanhado a tocar nas mucosas (boca, nariz ou olhos) leva dois pontos; e quem for apanhado a tocar em qualquer outro lugar do rosto leva um ponto. Às 12h de sexta-feira, quem tiver mais pontos paga o almoço ao outro. No limite, dá para jogar sozinho: utilize o mesmo sistema de contagem — dois pontos para o caso de tocar nas mucosas, um só caso toque noutro local do rosto. Faça esta contagem até sexta-feira ao fim da tarde. Se a soma dessa pontuação for superior ao valor máximo que tiver estipulado, não pode ver a sua série favorita ao longo do fim-de-semana, por exemplo. Se for igual ou inferior, pode até comprar pipocas para celebrar.
Cubra as unhas com um verniz azedo. A tarefa de não tocar no rosto, sobretudo nas mucosas, pode ser especialmente difícil para quem tem o hábito de roer as unhas. Em tempos de epidemia de coronavírus, junte estes dois objetivos: evitar uma infeção preocupante e parar de roer as unhas. Há dois truques possíveis: cobrir as unhas com um verniz azedo; ou, caso esta técnica ancestral não funcione, usar luvas. Esta última opção pode ser boa porque, ao tocar com o tecido em qualquer outra parte do rosto, isso travará o movimento.