Poderá ser tomada já esta segunda-feira uma decisão sobre a possível introdução de uma cerca sanitária no concelho do Porto. A informação foi adiantada por Graça Freitas, diretora-geral de Saúde, na conferência de imprensa diária com a diretora-geral de Saúde e com o secretário de Estado da Saúde, António Lacerda Sales.

“O Porto neste momento do ponto de vista dos recursos materiais e humanos que precisa tem estado a receber todo o apoio nacional”. Mas, sobre o “cordão sanitário, ou cerca sanitária, está neste momento a ser equacionado e provavelmente será hoje tomada uma decisão nesse sentido”, uma decisão que será tomada entre as autoridades regionais e as autoridades de saúde nacionais e o Ministério da Saúde, explicou a responsável.

Esta foi uma das principais informações saídas da conferência de imprensa que se seguiu à apresentação do boletim diário em que se relata um aumento no número total de mortes para 140 mortes, mas se sinaliza um aumento mais lento do número de infetados confirmados (cerca de 7%). No Porto (concelho), especificamente, no relatório de domingo havia um total de 417 casos no boletim, com um asterisco de “Informação reportada pelas Administrações Regionais de Saúde e Regiões Autónomas”, mas esta segunda-feira perdeu essa nota e subiu 524 casos, chegando agora aos 941, bem mais do que Lisboa (633).

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Apesar de, a nível nacional, ter abrandado o ritmo de crescimento de casos positivos, António Lacerda Sales assinalou que “faz esta segunda-feira que fecharam as escolas e há duas semanas que as famílias estão nas suas casas a fazer a sua parte nesta luta contra a pandemia”. “Temos todos de continuar este trabalho porque este vírus não dá tréguas”, avisou.

O responsável agradeceu aos portugueses que têm sido “exemplares” neste comportamento cívico, mas “aos que ainda hesitam em seguir esta conduta, tentados por uma manhã de sol ou por uma falsa ideia de invencibilidade”, disse que “ficar em casa é salvar vidas”.

Graça Freitas, por seu lado, voltou a referir-se ao caso do rapaz de Ovar, de 14 anos, que morreu no domingo mas que não surge no boletim diário. “Está ainda em investigação a causa da morte. Tudo aponta num determinado sentido, mas temos de ter muita cautela e só quando estivermos certos é que será divulgada a causa da morte”, afirmou a responsável, acrescentando que “no entanto, e seguindo o critério português, provavelmente vamos inscrever essa morte no boletim“. Mas “primeiro vamos ter de esperar a verdadeira causa da morte. Depois, vamos decidir neste caso concreto se vamos introduzir no boletim”, concluiu.

As prioridades das autoridades nesta fase: “Testar, isolar, proteger e tratar”

O secretário de Estado da Saúde diz que nesta fase a prioridade das autoridades de saúde é “testar, isolar, proteger e tratar”. Para isso, “continuamos a reforçar as nossas reservas em equipamentos de proteção individual e testes”: a reserva nacional recebeu, na semana passada, mais de 66 mil testes, 5,2 milhões de máscaras cirúrgicas e 1,2 milhões de respiradores FFP2 entre outros equipamentos como batas e fatos.

Esta semana, “prevemos continuar a receber encomendas. Hoje mesmo devem chegar 700 mil respiradores FFP2 e 200 mil testes. Nos próximos dias, 100 toneladas de equipamentos de proteção individual”. Graça Freitas contrapôs, mais tarde, que “quem está a aguardar teste vai continuar a aguardar“, até porque “o que decide o tratamento não é o teste, são os sintomas”. As pessoas suspeitas não podem sair de casa e devem monitorizar a temperatura e os sintomas, ligando para a linha Saúde24 e para o 112 em caso de agravamento súbito dos sintomas.

Porém, António Lacerda Sales argumentou que “a capacidade laboratorial do país tem aumentado gradualmente ao longo da epidemia e estes resultados só são possível graças ao incansável trabalho dos laboratórios da rede pública mas, também, pela rede privada”. Em particular, testar nos lares é uma “grande preocupação nossa”, afirmou, num dia em que arrancou uma operação nacional de testes em lares de idosos (a utentes e profissionais).

“Temos todos de proteger os idosos”, disse o responsável, pedindo a que quem possa ter os idosos em casa – “em isolamento social”, sublinha – deve fazê-lo.

Sobre a capacidade que o país tem para colocar doentes em ventilação, António Lacerda Sales partilhou números atualizados:

  • Capacidade instalada é de cerca de 1.124 ventiladores. 528 estão em UCIs e 480 em blocos operatórios, com uma capacidade de expansão de 134 ventiladores.
  • Existe uma encomenda de 500 ventiladores por parte do Estado português, dos quais 138 se encontram já na embaixada de Portugal na China para virem na próxima semana.
  • Existem outras disponibilidades, através de instituições, e este conjunto chegará à ordem dos mil ventiladores, o que praticamente duplicará a capacidade de ventilação em Portugal.

A conferência de imprensa teve, ainda, um momento caricato quando, depois de Graça Freitas ter dito que havia cerca de 200 profissionais de saúde infetados com Covid-19, o secretário de Estado da Saúde, António Lacerda Sales aproveitou para corrigir dizendo que existem, na realidade, 853 profissionais de saúde (209 médicos, 177 enfermeiros e 467 noutras funções). A diretora-geral da Saúde pediu desculpa várias vezes, afirmando que tinha feito confusão com os (cerca de) 200 médicos infetados.

Grávidas vão ser grupo prioritário para serem testadas, mesmo que assintomáticas

A conferência de imprensa contou, também, com a presença de Carlos Veríssimo, Diretor do Serviço de Ginecologia-Obstetrícia do Hospital Beatriz Ângelo e membro da direção do Colégio da Especialidade de Ginecologia-Obstetrícia e do Colégio de Competência em Ecografia Obstétrica Diferenciada da Ordem dos Médicos, que explicou o impacto da doença nas grávidas e deixou recomendações concretas para este grupo específico, que serão transcritas em normas a publicar em breve.

Começando por deixar “uma nota de tranquilidade contida para as grávidas”, Carlos Veríssimo disse que se sabe que “o risco de se infetarem é semelhante à população em geral, mas há evidência de maior risco clínico se contraírem a doença”. “Se tivermos 60 mil grávidas por todo o país, distribuídas pelos três trimestres, teremos cerca de 230 partos por dia. Teríamos seis grávidas infetadas sintomáticas. Quatro até agora, é mais ou menos o que se está a passar”, explica.

“Existe uma evidência clínica de uma raridade de transmissão vertical. Existe um caso na China que ainda requer alguma validação de transmissão da mãe ao feto”, diz o médico, acrescentando que “as grávidas devem seguir os conselhos de higiene e contenção recomendados pela DGS. Não queremos gravidezes não vigiadas ou mal vigiadas. Mantemos as duas ecografias principais. A ecografia do primeiro trimestre e do segundo trimestre, para não diminuir o risco de deteção”.

O médico rematou que “a palavra de ordem é contenção social, que também implica teletrabalho. As grávidas positivas devem ser vigiadas no domicílio”, devendo ser mantida uma “monitorização diária remota da sua evolução clínica”. Ao mesmo tempo, Carlos Veríssimo anuncia que a população grávida vai ser considerada como prioritária para fazer teste à Covid-19, ainda que assintomática, sempre que se identifique contactos de risco.

Carlos Veríssimo revelou, ainda, um conjunto de indicações que devem ser seguidas no momento do parto e que vão constar da norma da DGS sobre a Covid-19 e a gravidez:

  • Parto deve ser feito em salas isoladas, se possível de pressão negativa;
  • Profissionais de saúde devem usar equipamentos de proteção individual;
  • Menor número possível de intervenientes no parto, daí que o acompanhamento por terceiros não seja de todo recomendado;
  • Analgesia epidural é fortemente recomendada nestas situações, para evitar ao máximo é uma anestesia geral;
  • Contacto pele a pele desaconselhado;
  • Testar o recém-nascido;
  • Separação mãe-filho e não-recomendação do aleitamento materno (uma medida que Carlos Veríssimo admitiu ser “polémica”);
  • Pós-parto deve ser em salas de isolamento próprias.