Um homem acusado de matar a ex-mulher com pelo menos 18 facadas, em Braga, alegou esta segunda-feira não se lembrar do crime, sublinhando que amava a vítima e que ela era “a última pessoa do mundo a quem quereria fazer mal”.

No Tribunal de Braga, no início do julgamento, o arguido, de 48 anos, disse que apenas se lembra que, no dia dos factos, tinha ido correr com a ex-mulher, como seria “habitual”, e que no final os dois estavam a conversar “cordialmente”.

“Não me lembro de mais nada”, referiu. Segundo a acusação, a vítima foi esfaqueada com pelo menos 18 golpes com força, sendo três na zona da cabeça, cinco na zona do pescoço, oito na zona do tórax e dois no membro superior esquerdo.

O arguido disse que, passado o “apagão”, se apercebeu de que “alguma coisa não estava bem”, quando viu “uma marca” no pescoço da vítima e se apercebeu que ele tinha um “canivete” nas mãos.

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Deixou a vítima no local e foi a uma esquadra de polícia situada a poucos metros alegadamente pedir ajuda para a ex-mulher. “Acho que a matei”, terá dito na ocasião.

Esta segunda-feira, no julgamento, o arguido afirmou que, apesar de estar equipado para a corrida, de t-shirt e calções, também levava à cinta uma bolsa, com alguns objetos pessoais e um “canivete” que tinha comprado uns dias antes. Alegou que era normal andar com canivetes, por força da sua ocupação como eletricista. Para o tribunal, em causa está uma navalha, com cerca de nove centímetros de lâmina e que, aberta, media mais de 20 centímetros.

Perante o depoimento do arguido, uma das juízas pediu ao arguido para “não tentar atirar areia para os olhos” do tribunal, sublinhando que “as desculpas são sempre as mesmas”. Disse ainda que a versão apresentada pelo arguido “pode ser um bom argumento para um filme de terror”.

Os factos ocorreram em 18 de setembro de 2019, pelas 22h, quando, segundo a acusação, a mulher compareceu na Travessa da Praça da Justiça, em Braga, para se encontrar com o arguido, acedendo ao pedido que este lhe fizera.

A acusação diz que o arguido iniciou uma discussão com a vítima, acabando por a atingir com 18 golpes, que se revelaram fatais. O arguido e a vítima casaram em fevereiro de 2017 e divorciaram-se em 8 de julho de 2019.

“O arguido não se conformava com o fim dessa relação e tentou reatar a mesma, o que não foi aceite pela ofendida”, acrescenta a acusação. Já o arguido disse que o divórcio só aconteceu porque não suportava a filha da vítima, mas assegurou que o casal continuou a manter um relacionamento “praticamente igual”, mas “às escondidas”.

No entanto, há registos de mensagens trocadas poucos dias antes do crime em que o casal discutia, num tom pouco cordial, a divisão dos bens. A entrega ao arguido de tudo o que lhe pertencia deveria ocorrer dois dias após o crime.

Este homicídio esteve na base da criação do movimento cívico Mulheres de Braga, entretanto constituído como associação, que tem como objetivo apoiar vítimas de violência doméstica. Esta segunda-feira, algumas representantes da associação apresentaram-se fora do tribunal com uma tarja em que se lia “Estamos aqui por ti, Gabriela” [nome da vítima].

De manhã, uma parede do tribunal apareceu pintada com a frase “Fim da imunidade machista”. Numa outra parede no largo do tribunal, foi escrita a frase “Revolução feminista já”.