A Premier League, talvez pelos antecedentes muito recentes, foi a liga de futebol que colaborou de forma mais presente e visível com a onda de protestos e condenação ao racismo que se alargou a vários países depois da morte de George Floyd, nos Estados Unidos, ainda em maio. Os relatos de insultos de caráter racial a partir das bancadas, os cânticos racistas entoados por milhares e o ativismo das últimas temporadas totalmente encabeçados por Sterling, engrossaram a necessidade e a vontade de criar dois momentos, em cada jogo da Premier League, para recordar a luta dos movimentos anti-racistas.

Logo à partida, os nomes nas camisolas. A liga inglesa recomeçou no final da semana passada, depois de três meses de paragem, e ainda nenhum jogador vestiu uma camisola cujo nome estivesse nas próprias costas, logo por cima do número. Em todas as partidas que já se disputaram em Inglaterra, todos os jogadores estiveram em campo com a inscrição “Black Lives Matter” nas próprias camisolas. Além disso, e ainda antes do apito inicial, atletas, equipas de arbitragem e equipas técnicas juntam-se, em simultâneo, para se ajoelharem durante breves segundos, um gesto que também tem sido associado aos protestos contra o racismo. Aubameyang foi mais longe e levantou o punho, Trent Alexander-Arnold aliou os dois momentos a umas chuteiras personalizadas — mas a verdade é que, em todos os jogos da Premier League nesta retoma, atletas, árbitros e treinadores têm estado unidos numa campanha comum e orquestrada pela própria liga.

Manchester City v Burnley FC - Premier League

Antes do apito inicial de todos os jogos da Premier League, os jogadores têm-se ajoelhado durante breves segundos

Nada que, contudo, tenha evitado o que aconteceu esta segunda-feira durante o jogo entre o Burnley e o Manchester City. Nos instantes que se seguiram ao apito inicial, um avião sobrevoou Turf Moor, o estádio do Burnley, com uma tarja onde se lia “White Lives Matter Burnley”, vidas brancas importam, um slogan que tem sido associado a grupos de extrema-direita e utilizado em resposta aos protestos que têm surgido um pouco por todo o mundo. Logo depois do final do jogo, que o Manchester City venceu por 0-5, o capitão do Burnley foi o primeiro a condenar a mensagem que passou por cima do relvado.

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“Adeptos como estes não merecem estar perto do futebol. Estamos envergonhados, embaraçados. É uma minoria dos nossos adeptos. Sei que falo em nome de uma parte massiva dos nossos apoiantes que se distanciam de algo como aquilo. Teve um grande impacto em nós ver aquilo no céu, definitivamente. Estamos envergonhados porque o nosso nome estava lá, tentaram associar aquilo ao nosso clube. Nada daquilo pertence de forma alguma ao nosso clube”, disse Ben Mee, defesa inglês de 30 anos que tem liderado o Burnley, uma das equipas sensação desta temporada — ao lado do Sheffield United — na Premier League.

Logo de seguida, foi a vez de o próprio clube, em comunicado oficial, se distanciar da mensagem. “O Burnley condena fortemente as ações dos responsáveis pelo avião e pela tarja ofensiva. Queremos deixar claro que os responsáveis não são benvindos em Turf Moor. Pedimos desculpa, sem reservas, à Premier League, ao Manchester City e a todos aqueles que ajudam a promover o movimento Black Lives Matter. O clube tem um orgulhoso registo de trabalhar com todos os géneros, religiões e credos ao longo do nosso percurso e na nossa comunidade e colocamo-nos contra o racismo de qualquer tipo”, afirmou o conjunto da cidade a norte de Manchester, acrescentando que vai trabalhar em conjunto com as autoridades no processo de identificação dos responsáveis.

Nas flash interviews, tanto Sean Dyche como Pep Guardiola, os dois treinadores, uniram-se às críticas à mensagem. Já esta terça-feira, a polícia de Lancashire anunciou que está a investigar o episódio, com o objetivo de identificar os responsáveis, assim como o piloto da aeronave. No Twitter, Raheem Sterling, jogador do Manchester City que estava no banco de suplentes quando a tarja sobrevoou Turf Moor e um dos líderes do ativismo contra o racismo no futebol, limitou-se a partilhar uma imagem da aeronave em conjunto com a hashtag #TimeForChange, tempo de mudança.

Entretanto, o Aeroporto de Blackpool, de onde levantou a aeronave que passou por cima do estádio do Burnley, anunciou que vai suspender todas as operações do mesmo género, de aviões com tarjas associadas, para evitar novos episódios. “A mensagem foi ofensiva e a ação é repreensível. A decisão de deixar voar a tarja foi tomada inteiramente pela empresa responsável, sem o conhecimento ou a aprovação do aeroporto. Devido à natureza desta atividade, as tarjas não são verificadas antes da descolagem e o conteúdo fica à discrição do operador”, referiu esta terça-feira o aeroporto, em comunicado, recomendando a outros aeroportos que tomem a mesma decisão.

(artigo atualizado às 13h48 com a informação de que o Aeroporto de Blackpool suspendeu os voos de aeronaves com tarjas)