Especialistas norte-americanos consideraram esta sexta-feira que a pandemia de Covid-19 criou oportunidades a África para recorrer a recursos produzidos dentro do continente e reforçar o comércio e a colaboração continental, com possível perdão da dívida por outros países.

Alexandra Xander Meise, da universidade de Pensilvânia, disse esta quinta-feira, num debate ‘online’, promovido pelo instituto Brookings, disse que a África deve apostar no reforço do comércio continental interno e “promover recursos dentro do continente”, para não estar tão dependente do exterior, o que vai ao encontro dos objetivos da Zona de Livre Comércio Continental Africana.

Não há uma solução fácil, mas se há uma boa altura para reforçar [o comércio intracontinental], pode ser agora”, sublinhou Alexandra Meise, considerando que os parceiros comerciais do exterior podem continuar “hesitantes” e a lidar com problemas dentro das suas próprias fronteiras por vários anos.

“Reconfigurar cadeias de fornecimento” em África para criar empregos “desesperadamente necessários” foi também um apelo de Desiree Cormier Smith, antiga diplomata norte-americana e assistente na embaixada dos Estados Unidos em Pretória, África do Sul.

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Alexandra Meise, especialista académica do Centro de Ética da Faculdade de Direito da Universidade de Pensilvânia, acrescentou que os credores de dívida, como por exemplo Estados Unidos ou União Europeia, podem participar na reestruturação da dívida dos países africanos, incluindo considerarem o perdão da dívida.

Esta pode ser uma oportunidade de os EUA mostrarem liderança e reconstruírem relações com alguns países, ao tomar uma posição no alívio económico, nomeadamente perdoar dívidas”, declarou Alexandra Meise.

Desiree Cormier Smith, agora diretora para África na consultora Albright Stonebridge Group, considerou que o continente deve recorrer à “ingenuidade” da população e promover a comunicação entre investidores, sociedade civil, jovens e empreendedores para criar “soluções africanas”, que possam ser aplicadas no contexto dos países africanos, criticando medidas que foram transportadas como “corta e cola” do Ocidente para lutar com a Covid-19.

A especialista considerou que algumas medidas que funcionam noutros países não são eficazes ou práticas em África: por exemplo, lavar constantemente as mãos pode não ser possível devido aos recursos escassos de água limpa. O distanciamento social, como outro exemplo, também é difícil devido a falta de infraestruturas e à densidade populacional elevada em várias partes do continente africano.

Muitas pessoas trabalham no setor informal em África e não podem decidir ficar a trabalhar em casa ou não ir ao trabalho, porque existe a preocupação de “morrer de fome antes de ser atingido pela Covid”, disse ainda Desiree Cormier Smith.

Zoe Marks, professora de políticas públicas na Universidade de Harvard, propôs que organizações não-governamentais (ONG) internacionais “sigam a liderança de órgãos continentais [africanos] incrivelmente coordenados”, como o Centro de Controlo e Prevenção de doenças, Africa CDC, que podem “guiar as ONG e racionar a ajuda que tem de ser distribuída”.

Para Zoe Marks, as ONG devem investir em ‘start-ups’ e iniciativas de tecnologia digital que são inovadoras e contribuem a nível local, com “ressonância cultural” e acessível para pessoas iliteradas.

Youssef Travaly, cientista e membro da Aliança África-Europa da organização Friends of Europe, defendeu um “acordo transnacional sobre infraestruturas físicas, infraestruturas digitais, política regulatória e tecnologia digital”.

O especialista acrescentou que África deve reforçar as áreas de prevenção e diagnóstico da Covid-19 (e não apenas concentrar-se no tratamento) e sugeriu que haja mais “intervenção política” para a criação de parcerias e colaborações nacionais, continentais e transcontinentais.