Os dois ativistas políticos, que a Liga Guineense dos Direitos Humanos disse terem sido sequestrados na segunda-feira, alegaram esta sexta-feira terem sido espancados na Presidência da República da Guiné-Bissau por elementos do batalhão da Presidência.

Em conferência de imprensa, realizada na Casa dos Direitos, em Bissau, na presença do presidente da Liga Guineense dos Direitos Humanos, Augusto Mário Silva, os dois ativistas, Carlos Sambú e Queba Sani (Kelly), disseram que foram raptados no bairro da Ajuda, na capital guineense, por um militar e por Tcherno Bari, mais conhecido por ‘Tcherninho’, da segurança do chefe de Estado, Umaro Sissoco Embaló, e levados para a Presidência da República.

Naquele local, Carlos Sambú disse ter levado uma coronhada, caiu e bateu com a cabeça numa pedra.

Eu disse Tcherno ‘calma, que se está a passar’ e ele disse-me para entrar no carro e eu entrei obedientemente e eles ficaram os dois a torturar selvaticamente o Kelly, e depois ele ficou um pouco imobilizado, meteram-no no carro e amarraram-nos um ao outro”.

“Seguimos justamente para o símbolo do poder do nosso país, o Palácio da República (…), ou melhor o Tcherno levou-nos. Estava um grupo de cinco pessoas, supostamente do batalhão da Presidência e esses todos, com galhos, com fios de eletricidade, mandaram-nos deitar no chão. Foram mais de 30 minutos de chicotadas, eu levei 56 chicotadas”, recordou, afirmando que o elemento da Presidência estava a acusá-los de gerir um perfil online falso para criticar a ministra dos Negócios Estrangeiros, Susi Barbosa.

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Eu disse-lhe ‘eu falo por mim, não uso e nunca usei perfil falso. Falo por mim. Não sou eu’. E ele disse ‘quem te mandou criticar Susi Carla Barbosa’, eu disse-lhe que critiquei a conduta política, havia nomeações que eu achava que era mais clientelismo, mas quem o fez foi um colega e nós fizemos ‘print’ dessa crítica”.

“Fomos humilhados, filmados, tiraram-nos as roupas, mandaram-nos para o carro como se fôssemos porcos e depois fomos para o Ministério do Interior”, continuou.

Já no Ministério do Interior, Carlos Sambú disse que deram “de caras” com o comissário da Ordem Pública, o comandante da Guarda Nacional e o diretor da segunda esquadra.

“Depois de o Tcherno se ter ido embora, o diretor da segunda esquadra despediu-se. O comandante disse: ‘Tenham calma aqui já estão salvos’. Mandou buscar um colchão, mandou comprar água e não entramos na cela”, afirmou Carlos Sambú, precisando que não estiveram detidos, mas no quintal da prisão.

Carlos Sambú contou também aos jornalistas que o ministro do Interior, Botche Candé, lhes pediu desculpa e que os soltou.

Saímos de lá como entramos, sem nota de culpa e com uma desculpa do ministro do Interior. Esta é a verdade clara deste rapto”.

Questionado pela Lusa sobre quem é Tcherno Bari, Carlos Sambú disse ser um “faz tudo do Presidente”.

Carlos Sambú é coordenador da página do Facebook ‘Estamos a Trabalhar’, que apoia o atual gobernono poder na Guiné-Bissau, e militante do Movimento para a Alternância Democrática (Madem-G15).

Mas isto nunca me desencorajou por lutar pelo meu país e pelo bem-estar na Guiné-Bissau, sendo do Madem-G15 e pró-regime não aceito intolerância, discriminação e antidemocracia”.

A minha convicção é defender a Guiné-Bissau. Fomos mal interpretados, mas agora muita gente vai compreender. Vou lutar sempre contra este tipo de políticas”, acrescentou.

O Ministério Público da Guiné-Bissau anunciou quinta-feira a abertura de um inquérito que visa os responsáveis morais e materiais daquilo que classificou como um “ato ignóbil”.

A Lusa tentou obter um comentário da Presidência da República sobre estas acusações mas, até ao momento, não obteve resposta.

O Presidente da República da Guiné-Bissau, Umaro Sissoco Embaló, está hoje em Lisboa, no âmbito de uma visita de Estado a Portugal.

Na quarta-feira, antes de viajar para Lisboa, o chefe de Estado lamentou o que aconteceu aos dois ativistas e pediu ao Ministério Público para abrir um inquérito ao caso.