Ao longo dos últimos nove meses, a Lituânia atribuiu mais de 16 mil vistos de longo prazo a cidadãos da vizinha Bielorrússia, incluindo 3.500 vistos que foram concedidos com base humanitária por motivos políticos. De acordo com a Associated Press, aquele país báltico da UE tornou-se um refúgio para muitos dos dissidentes e opositores do autoritário regime bielorrusso, liderado há mais de 25 anos por Alexander Lukashenko. Agora, depois de a Bielorrússia ter mandado desviar um avião que viajava da Grécia para a Lituânia com o objetivo de deter o jornalista Roman Protasevich, um opositor que vivia no exílio, nem mesmo fora das fronteiras bielorrussas os dissidentes se sentem a salvo do regime opressor.

Eu fui um refém do regime de Lukashenko, mas agora toda a União Europeia está na mesma situação. A tortura, a repressão brutal e uma caça aos jornalistas transbordaram as fronteiras bielorrussas e tornaram-se um problema para toda a Europa“, disse à Associated Press o músico Viachka Krasulin, de 32 anos, que em 2020 foi detido por participar em manifestações contra Lukashenko e que entretanto abandonou o país, encontrando refúgio na Lituânia.

Mas se até agora a vida na Lituânia ou noutros países tem sido uma garantia de paz para os opositores de Lukashenko, o episódio da detenção de Protasevich — que levou a UE a adotar sanções contra a Bielorrússia, fechando o espaço aéreo europeu ao país e proibindo os aviões bielorrussos de aterrar em aeroportos do espaço comunitário, ao mesmo tempo que motivou uma série de críticas internacionais — veio deixá-los de novo com medo de enfrentar consequências da oposição política.

Viachka Krasulin fez parte dos milhares de bielorrussos que foram detidos no verão passado por se manifestarem nas ruas contra a reeleição de Lukashenko para um sexto mandato. Enquanto tentava ajudar um manifestante que fora atingido por uma bala de borracha da polícia, Krasulin foi agarrado pelas autoridades.

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“Eles claramente não gostaram do meu cabelo comprido. Bateram-me e ameaçaram que me iam violar com um bastão, mas primeiro decidiram cortar-me o cabelo. Levantaram-me pelo cabelo e cortaram-no com uma faca militar”, lembrou Krasulin. Na cadeia, o músico foi colocado numa cela com seis camas e com 40 pessoas. Durante 24 horas, não teve acesso a água nem a comida. Foi condenado a 11 dias de prisão e, depois, viria a ser acusado de promover a rebelião — foi nessa altura que fugiu para a Lituânia, para fugir a uma nova prisão.

Krasulin vive agora em Vilnius, a capital da Lituânia, que se tornou numa espécie de quartel-general da oposição bielorrussa — e que era, aliás, a cidade para a qual Roman Protasevich se dirigia quando o seu avião foi desviado.

“A prisão de Protasevich teve como objetivo lembrar aos jornalistas e bloggers que fugiram do país que o KGB tem mãos longas e é muito cedo para eles relaxarem”, disse à agência o advogado Siarhej Zikratski, que tem defendido vários jornalistas bielorrussos na mira das autoridades do país. “O que se passa na Bielorrússia pode ser considerado uma capitulação legal. As leis já não funcionam lá. Hoje, um advogado corre o risco de acabar na mesma cela que os seus clientes apenas por levar a cabo os seus deveres profissionais.