Título: A minha irmã é uma serial killer
Autora: Oyinkan Braithwaite
Editora: Quetzal
Páginas: 290
Preço: 14,94

A minha irmã é uma serial killer é o romance de estreia da autora nigeriana Oyinkan Braithwaite, nascida em 1988. O título, claro, já agarra, e a premissa, que não lhe foge, também: Korede, a narradora, é a irmã mais velha de Ayoola, que é uma assassina em série.

O livro é permanentemente pontuado por drama e humor. Korede é pragmática e bem intencionada, acabando sempre por cair nos problemas da irmã, pelos quais se vê sempre culpada. Para além de filha favorita, Ayoola é muito bonita, conseguindo a atenção dos homens e tendo facilidade de endrominar, colher simpatia, ganhar apoio. Os seus três últimos namorados apareceram mortos, mas Ayoola tem sempre uma justificação e ainda se diz a vítima. As contradições não passam ao lado dos olhos da irmã, que, ainda assim, cumpre o seu papel, ao mesmo tempo que se questiona: se ele estava a atacar, como é que ela o esfaqueou por trás? Ayoola não só não dá muitos detalhes como parece esquecer tudo logo a seguir. Livre de remorsos, vive para a imagem, e a persona online tem de ser controlada pela irmã para que o desfasamento entre as circunstâncias (o desaparecimento de um namorado) e o seu estado de espírito (a displicência) não fiquem escancarados na Internet. É Korede que lhe diz que não deve publicar uma fotografia de uma coisa qualquer logo depois de publicar uma sobre o desaparecimento do namorado ou ainda que não deve fazer alarido das flores dadas por outro semanas após o sucedido, e isto ao mesmo tempo em que se vai perguntando porque é que a irmã tinha uma faca. Para além disso, choca-se com o desinteresse de Ayoola, com a falta de impacto emocional:

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“Os movimentos dela são tudo menos rítmicos; são os movimentos de uma pessoa sem público, nem constrangimento a agrilhoá-la. Há dias, entregámos um homem ao mar, mas ei-la, a dançar.” (p. 42)

Apesar de todas as dúvidas e suposições, Korede é pragmática e ajuda a safar a irmã. Fá-lo apesar da permanente sensação de injustiça, e vemos Ayoola como menina bonita e desmiolada ao mesmo tempo que sociopata. Korede tenta compreendê-la, mas não tem como, e não pode sequer discutir o assunto com a mãe, porque sabe que não só não será levada a sério como a mãe ainda irá julgar que Korede difama Ayoola por inveja. Assim, Braithwaite conseguiu adicionar carga psicológica à tensão do crime cometido, ao mesmo tempo que pôr Korede perante o leitor numa situação que não parece ter saída, não só porque ajudou a encobrir cadáveres, tornando-se cúmplice dos crimes da irmã, mas também porque a verdade seria apenas vista como uma narrativa face a outras.

A aparente simplicidade da mente de uma sociopata é um dos pontos altos do romance, já que, apesar de parecer não entender a dimensão dos atos, no sentido em que não lhes confere grande importância, Ayoola tem noção das suas implicações legais. Ao mesmo tempo, acredita ser fácil ludibriar um tribunal, escudando-se no seu estatuto de menina bonita e indefesa de cujas palavra e inocência ninguém duvidaria. Aliás, esse é o seu trunfo perante os homens, que, cegos pela sua beleza, têm dificuldade em ver nela uma coisa além do objeto belo a preservar.

A sua confiança é tal que não só não duvida de que ninguém fosse duvidar de si como não consegue, sem a irmã, controlar a imagem que mostra em público. Cumprindo este papel, Korede enreda-se mais enquanto cúmplice, garantindo que Ayoola não dá um passo em falso para ser apanhada, ao mesmo tempo que lhe permite dar os passos em falso chamados assassinatos. Ao mesmo tempo, Braithwaite faz um relato da relação entre a geração millennial e as redes sociais, com a vida à parte ali construída através da presença permanente.

Num romance que se lê como quem vê uma série para descomprimir, ainda sobra espaço para se efabular o papel da beleza nas relações sociais. Assim, salienta-se a eficácia na construção da narrativa, que cumpre o propósito de surpreender e divertir, com frases funcionais e cenas pertinentes, ao serviço do suspense psicológico, que parece apenas esmorecer nas últimas páginas, impedindo o livro de ter um grand finale.