Apesar de já anunciada, a criação de dois novos escalões no IRS é a medida mais sonora desta proposta orçamental, para já. O Governo prevê que permita transferir 150 milhões de euros por ano às famílias, mas os fiscalistas apontam que esse montante será pouco mais de 1% da receita total deste imposto. Nas empresas há incentivos fiscais ao investimento para puxar pela retoma e há um acelerar do caminho já iniciado de penalizar fiscalmente os combustíveis fósseis e o plástico de uso único na alimentação.

1 Com nove escalões, Governo diz que concluiu revisão do IRS

O IRS  vai passar de 7 para 9 escalões. O desdobramento do terceiro escalão vai introduzir uma taxa de 26,5% para o intervalo de rendimentos entre os 10.736 euros e os 15.216 euros por ano.

O escalão a seguir — entre 15.216 euros e os 19.696 euros — vai ter uma taxa de 28,5%. A partir deste valor e até aos 25.0776 euros a taxa marginal salta para os 35%. No escalão seguinte até aos 36.757 euros a taxa será de 37%. Deste patamar, onde começava o sexto escalão, o Governo cria um novo intervalo até aos 48.033 euros, cuja taxa marginal será de 43,5%. Entre os 48.033 euros e os 75.009 euros, a taxa fica nos 45%. O último escalão, no qual se mantém a taxa de 48%, passa a apanhar mais contribuintes ao aplicar-se a rendimentos a partir dos 75.009 euros.

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Evolução das escalões do IRS desde que os socialistas estão no Governo

As mexidas vão abranger 47% dos contribuintes que pagam IRS e que estão a partir do terceiro escalão e que correspondem, segundo a proposta orçamental, a cerca de 1,5 milhões de agregados. O documento acrescenta que o desdobramento dos 3.º e 6.º escalões de IRS permitirá uma redução da tributação nos rendimentos a partir dos 15 mil euros anuais (cerca de 10.000 euros de rendimento coletável).

Com mais escalões e redução de taxas médias associadas (a partir do primeiro escalão com uma taxa mais reduzida, todos os rendimentos acabam por beneficiar), o Governo diz que se reforça a progressividade dos impostos, ficando ainda concluída a revisão dos escalões de IRS que nas duas legislaturas passando de 5 para nove. Nas contas do Executivo, as alterações feitas em 2018 e 2022, trazem um alívio fiscal de mais de 500 milhões de euros para as famílias.

Esta será a medida central no imposto sobre os rendimentos que terá ainda outras novidades de impacto mais cirúrgico. Positivo para os jovens a estudar, os emigrantes que queiram regressar e pais com mais de um filho. E negativo para os contribuintes que realizam compras e vendas de ativos mobiliários a um prazo inferior a um ano e que tenham mais-valias.

2 IRS jovem alargado pode ir até aos 35 anos, caso haja interrupção do rendimento do trabalho

O IRS Jovem vai ser alargado para cinco anos e passar a incluir os rendimentos de trabalho independente (categoria B) e terá aplicação automática. Quem tenha entre 18 e 26 anos (ou 28, no caso de doutoramento) e qualificações de nível 4 (curso profissional) ou superior ficará parcialmente isento de IRS em 30%, 30%, 20%, 20% e 10% nos cinco primeiros anos de rendimentos imediatamente após a conclusão dos seus estudos.

A isenção aplica-se no primeiro ano da obtenção de rendimentos após a conclusão do ciclo de estudos e nos quatro anos seguintes, desde que a opção seja exercida até à idade máxima referida nos números anteriores;
Em anos seguidos ou interpolados, desde que a idade máxima do sujeito passivo não ultrapasse os 35 anos, inclusive. No conjunto esta medida permitirá poupar até dois salários completos.

No caso das famílias, a dedução fiscal a partir do segundo filho, que em 2020 já tinha sido majorada para 900 euros relativamente a crianças até aos 3 anos. Esta majoração é alargada de forma faseada até aos 6 anos.

O programa Regressar vai ser prolongado até ao final da legislatura, permitindo a todos os que emigraram  e regressem a Portugal até 2023 beneficiar de uma isenção de 50% no IRS.

3 Ganhos “especulativos”. Englobamento obrigatório para rendimentos acima dos 75 mil euros

Os rendimentos de capitais especulativos (mais-valias obtidas com valores mobiliários detidos menos de um ano) vão ser obrigatoriamente englobados para quem está no último escalão de IRS, sendo que o último escalão vai apanhar mais contribuintes, porque a taxa de 48% passa a aplicar-se a rendimentos que ultrapassem os 75 mil euros por ano. Serão as entidades financeiras depositárias dos títulos a calcular o saldo a tributar e a comunicá-lo aos contribuintes. As receitas fiscais obtidas terão como destino a sustentabilidade do sistema de Segurança Social.

Entre as boas e as más notícias, o Governo espera que o pacote IRS tenha um impacto de 205 milhões de euros em perda da receita.

 4 IRC. Incentivos ao investimento e fim do Pagamento por Conta

Nas empresas, a medida com mais sumo — e um impacto orçamental previsto de 150 milhões de euros — é o sucessor do crédito fiscal ao investimento. O Incentivo Fiscal à Recuperação (IFR) visa estimular o investimento privado no 1.º semestre de 2022, permitindo às empresas deduzir à coleta de IRC o montante do investimento realizado até ao limite de cinco milhões de euros nestes termos: dedução de 10% das despesas de investimento habituais; e dedução de 25% do valor do investimento adicional (ie, que supere a média dos últimos 3 anos).

Para as micro e pequenas empresas, confirma-se a eliminação do Pagamento Especial por Conta (PEC). Tendo por base as declarações de rendimentos entregues pelas empresas em 2019, os pagamentos especiais por conta totalizaram 79 milhões de euros. Para a consultora EY, esta medida terá sobretudo um impacto financeiro que resulta da dispensa de obrigação de antecipar o pagamento ao Estado. Não é uma medida efetiva de desagravamento fiscal.

5 Taxas ambientais aceleram

O Governo vai prosseguir com a eliminação faseada dos benefícios fiscais “prejudiciais ao ambiente”, como a isenção de ISP (imposto sobre produtos petrolíferos) na produção de eletricidade a partir de combustíveis fósseis, nomeadamente o gás natural e a cogeração.

Vai entrar em vigor a contribuição sobre as embalagens de plástico ou alumínio de utilização única em refeições prontas. Esta taxa de 30 cêntimos foi aprovada no Orçamento de 2021, mas para ser aplicada em 2022. As receitas revertem em parte para o Fundo Ambiental. O Governo refere também a taxa de carbono sobre as viagens aéreas, marítimas e fluviais que já entrou em vigor em meados deste ano.

Para o próximo ano, será criada uma isenção fiscal ao nível impostos especiais sobre o consumo (IEC), relativa à produção de energia para autoconsumo.