O Grupo de Reflexão Estratégica Independente (GREI), que reúne vários antigos chefes militares, lançou esta quarta-feira um livro crítico da reforma na estrutura superior das Forças Armadas implementada pelo atual Governo, insistindo no debate sobre a mesma.

Durante a apresentação do livro “A Reforma na Estrutura Superior das Forças Armadas – Um processo apressado e sem propósito entendível”, que decorreu esta quarta-feira no Centro Cultural de Belém (CCB), em Lisboa, o presidente da direção do GREI, o general Pinto Ramalho, considerou que a obra “é suficientemente clara quanto às críticas” relativas à forma como o processo foi conduzido.

“O fator determinante deste processo foi sempre a pressa, desprezou-se a experiência do passado e as perceções institucionais, privilegiou-se a emergência desnecessária, o imediatismo, a superficialidade, o oportunismo e a ignorância, em detrimento da doutrina, da competência, da transparência e da procura responsável da eficácia e eficiência das organizações”, defendeu o general.

Na opinião do presidente da direção do GREI, abriu-se caminho “ao experimentalismo, e à possibilidade de consequências inesperadas indesejáveis, como o autoritarismo, o carreirismo, e mais grave de tudo isso, a governamentalização das Forças Armadas”.

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Insistindo que existem outros problemas graves por resolver nas Forças Armadas, como a carência de efetivos ou o desinvestimento “em equipamento e manutenção de equipamentos e infraestruturas e no apoio social”, Pinto Ramalho afirmou que “o GREI continuará a assumir uma participação cívica no âmbito daquele que é o legítimo direito de escrutínio democrático”.

Também o ex-Chefe do Estado-Maior da Armada, almirante Fernando Melo Gomes, insistiu também na ideia de um processo apressado que “não seguiu a regra democrática”.

Não foi por falta de oportunidades nem por falta de sugestões, nem pelo sentido de colaboração que todos tiveram em relação a encontrar as melhores soluções para os problemas que afligem as Forças Armadas e o país, que este processo se desenvolveu da maneira que se desenvolveu”, defendeu.

O almirante disse que o GREI lança a obra para reiniciar este debate, “que faz falta a Portugal, às Forças Armadas e aos portugueses”.

Na apresentação da obra o professor José Gil apontou que num balanço final do livro “fica-se efetivamente perplexo, compreende-se mal o objetivo deste ímpeto reformista, o seu conteúdo, o momento escolhido, o processo adotado para o impor, os atropelos à democracia que o pontuaram, a ignorância da tecnicidade militar, a falta de transparência e até um certo menosprezo displicente pelas próprias FA”.

“Para além de razões economicistas, ou mesmo políticas, a motivação do Governo parece ser a desconfiança que há muito nutre pela instituição militar”, considerou.

Segundo o académico, “é evidente que o poder político foi incapaz, desde o 25 de abril, de propor uma visão política coerente, justificada e sistemática que situe a instituição militar, lhe dê uma missão e um fim claro para todos os portugueses”, cabendo às Forças Armadas “procurar definir-se como instituição específica dentro do Estado”.

“A presente publicação do GREI representa um valioso e importantíssimo contributo para o debate alargado que, contrariamente às aparências, está longe de ter terminado”, concluiu.

Entre os presentes na apresentação do livro estiveram o ex-Presidente da República, general Ramalho Eanes, a ex-eurodeputada Ana Gomes, o presidente da Associação 25 de Abril, Vasco Lourenço, ou o presidente da comissão de Defesa Nacional e deputado do PS, Marcos Perestrello.

A obra, com mais de 600 páginas, conta com uma análise e caracterização detalhada da legislação em causa, posições do GREI, notícias veiculadas sobre o assunto, artigos de opinião também publicados, incluindo ainda uma troca de correspondência entre o GREI e o Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, bem como relatos de audiências com os partidos políticos.

As alterações à Lei de Defesa Nacional e à LOBOFA foram aprovadas na Assembleia da República, em votação final global, em 25 de junho, por PS, PSD e CDS-PP, com votos contra de BE, PCP, PEV e Chega e abstenções de PAN e Iniciativa Liberal.

As leis, promulgadas pelo Presidente da República em agosto, concentram, no essencial, mais poderes e competências na figura do CEMGFA, designadamente em termos de comando operacional conjunto dos três ramos das Forças Armadas (Marinha, Exército e Força Aérea), ficando os chefes militares na sua dependência hierárquica.

A reforma, que surge na sequência de tentativas similares por parte de outros Governos, em 2009 e 2014, gerou polémica durante meses, com trocas de acusações entre o ministro da Defesa e representantes de associações socioprofissionais como a Associação de Oficiais das Forças Armadas (AOFA) e do GREI – (Grupo de Reflexão Estratégica Independente).

Esta quarta-feira, o ministro da Defesa Nacional defendeu que se deve continuar a implementar a reforma da estrutura superior das Forças Armadas, porque a sua organização “deve corresponder aos desafios do futuro e não às saudades do passado”.