Henrique Barros, presidente do Conselho Nacional de Saúde, considera que “não há razão nenhuma” para “mudar o nosso cuidado com a infeção” da Covid-19. Em declarações à Rádio Observador, o epidemiologista admite, no entanto, uma revisão do período de quarentena, que o especialista considera que “tem sido errática na forma de ser aplicada”.

Questionado sobre se é hora de repensar a estratégia do país, e aliviar medidas, uma opção defendida pelo epidemiologista Manuel Carmo Gomes, na terça-feira, à Lusa, o também presidente do Instituto de Saúde Pública da Universidade do Porto diz que “não há nada que tenha especialmente mudado” na evolução da pandemia. O que se alterou foi a capacidade de fazer testes, que aumentou, com mais casos a serem diagnosticados (mais de 17 mil na terça-feira, um máximo diário). Mas os dados parecem indicar que a infeção com a nova variante Ómicron não causa doença mais grave, frisa.

“Continuando assim, não teremos um janeiro difícil”, diz epidemiologista Henrique Barros

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Henrique Barros sublinha, aliás, que a 23 de dezembro de 2020, a média a sete dias de testes realizados era de 4 por mil pessoas, enquanto no mesmo período deste ano é “400% superior”, e está nos 20 testes por mil pessoas.

O epidemiologista nota um “cansaço” que faz com que as pessoas esqueçam que a infeção continua “em muitos casos a ser grave, gravíssima até nas pessoas não vacinadas” e sublinha que as variantes são uma evolução esperada da replicação do vírus. “Não há razão nenhuma para mudar o nosso cuidado com a infeção“, diz, defendendo a testagem em massa e a vacinação.

Se a variante pode tender a ser menos agressiva do ponto de vista da gravidade da doença, “não podemos esquecer-nos se aqui não vamos encontrar as formas longas de infeção”, lembra.

O especialista admite, no entanto, uma revisão das regras de isolamento, mas não diz se à semelhança do que tem acontecido noutros países. Por exemplo, nos EUA, os casos positivos assintomáticos deixam de ter de fazer isolamento de dez dias e ficam obrigados a apenas cinco. Já os contactos que tenham a vacinação completa não precisam de autoisolar-se.

O período de quarentena para as pessoas que contactaram com outros positivos “sempre foi excessiva na maior parte das circunstâncias e, sobretudo, tem sido errática na forma de ser aplicada”, defende. “Muito provavelmente exageramos sempre no número de dias. No início era preciso esperar por um teste por negativo [para ter alta], o que demorava às vezes meses a acontecer”, lembra. O país pode “naturalmente rever” essas regras, admite.

Mas lembra que, quanto às estimativas anunciadas por Marta Temido de que Portugal vai chegar aos 37 mil casos em janeiro, esses números não vão ser repetidos ao longo de dias, mas serão pontuais. “Daqui a uma semana haverá, em média, 20 mil casos por dia num cenário mau”, estima. Medidas como o teletrabalho obrigatório, o fim das aulas e o aumento da vacinação vão “começar a ter efeito”.

Se Ómicron causar menos doença grave, “talvez faça sentido deixar que as pessoas se imunizem naturalmente”, defende Carmo Gomes

Janeiro vai ser particularmente difícil? “Se as coisas estiverem como estão, não, mas há uma relação clara entre a temperatura e as condições meteorológicas. Se o inverno for mais suave haverá menos efeito na carga de infeções, se for mais rigoroso tenderemos a ter mais casos. Temos de adaptar aquilo que fazemos a dois factos: a vacina é extraordinariamente protetora e se não queremos correr riscos devemos usar testes como forma adicional de saber se estamos ou não a transmitir o vírus.”

O epidemiologista Manuel Carmo Gomes admitiu, na terça-feira, à Lusa, que Portugal pode ter de mudar de estratégia na contenção da pandemia dada a elevada transmissibilidade da Ómicron, mas só se se comprovar que não provoca formas de doença mais graves do que as variantes anteriores.

“Não vejo que haja recursos humanos para conseguir acompanhar em termos de rastreadores, isolamentos de casos, vigilância, etc. Temos já uma quantidade imensa de pessoas empenhadas nisto e os cuidados de saúde primários podem ser postos em causa”, disse, acrescentando que “se isso se confirmar, talvez faça sentido deixar que imunize as pessoas naturalmente do que empenhar toda a nossa saúde pública e os cuidados de saúde primários”. Medidas mais restritivas, como confinamentos, poderão não se justificar, considera.