Um parecer do Conselho Superior do Ministério Público (CSMP) considera que o diploma do Governo sobre metadados “é uma iniciativa legislativa importante” e que “merece apoio”.

De acordo com o parecer a que a agência Lusa teve esta quinta-feira acesso, o CSMP assinala que, ao contrário do que sucede com os projetos de lei apresentados pelo PSD, Chega e PCP, a proposta de lei do Governo opta expressamente pela revogação da lei [dos metadados], cujas algumas normas foram consideradas inconstitucionais pelo Tribunal Constitucional (TC) a 19 de abril passado.

Esta proposta assume que dados já anteriormente recolhidos pelos operadores de comunicações, noutra sede, podem vir a ser utilizados para fins de investigação criminal”, refere o parecer do CSMP, sublinhando que “sem o acesso a tais dados, muitos dos crimes cometidos online não podem ser investigados”.

O parecer analisa, entre vários outros aspetos da proposta do Governo, “a finalidade do tratamento dos dados” e a “transmissão e destruição doa dados”.

Quanto à finalidade do tratamento dos dados contido na proposta de lei, o CSMP entende que o diploma apenas visa regular a utilização em Processo Penal de certos dados, “guardado por motivos diversos”, pelo que considera ser positiva esta vertente, “por conferir uma regulação de base legal a uma prática de décadas”.

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Um dos benefícios positivos da criação deste quadro normativo é o da consagração expressamente feita (…) na proposta de lei de que os dados tratados pelos operadores de comunicações podem ser acedidos para fins de investigação criminal”, lê-se no documento.

Contudo, em relação à transmissão de dados, o parecer critica que a proposta do Governo relegue para uma posterior portaria “as condições técnicas para a transmissão deste tipo de dados dos operadores às autoridades judiciárias”.

“Afigura-se que essa será uma opção deveras inadequada, no momento em que, por colapso do sistema anterior, existe uma emergência de criação de um modelo alternativo de acesso a dados”, diz o parecer, sublinhando que relegar para uma portaria as condições técnicas para a transmissão de dados significa igualmente relegar para mais tarde a entrada em vigor da iniciativa legislativa do Governo.

Quanto aos projetos de lei, PSD, Chega e PCP, o parecer refere que tais iniciativas optaram por introduzir “pequenas alterações” à lei [dos metadados], considerando que esta opção de operar pequenas alterações “consubstancie a alternativa legislativa mais adequada”.

Salientando que a jurisprudência do Tribunal de Justiça da União Europeia e também do Tribunal Constitucional apontam para a necessidade de se rever de “forma profunda” a lei dos metadados, o parecer alerta que se estes projetos forem aprovados a lei “continuará a manter fragilidades e inconsistências, as quais os projetos legislativos apresentados não vêm sanar”.

“Todas elas propõem mudanças pontuais e circunscritas que procuram responder ao vazio criado pela jurisprudência constitucional, não solucionado muitas outras questões que permanecem”, assinala.

O CSMP critica ainda que “nenhum dos projetos de lei esclareça o motivo ou o critério” pelo qual escolhem um determinado prazo (90 dias, seis meses e outro um ano) como definição da conservação de dados retidos.

Anteriormente, a Ordem dos Advogados emitiu um parecer em que colocava reservas à proposta de lei do Governo, considerando que se deveria elencar os crimes cuja investigação garante o acesso aos dados, em vez de se remeter para crimes previstos no Código de Processo Penal e lamentou omissões no texto relativamente ao tempo e forma como esses dados devem ser destruídos e na definição de critérios de segurança para a transmissão dos dados.

Por seu turno, a Comissão Nacional de Proteção de Dados considerou que algumas das soluções propostas pelo Governo para regular o acesso dos metadados referentes a comunicações eletrónicas para fins de investigação criminal diminuem as garantias dos direitos fundamentais dos cidadãos.

Entretanto, o Conselho Superior da Magistratura escusou-se a dar parecer sobre as propostas de alteração à lei dos metadados para ultrapassar as inconstitucionalidades, alegando não ser “curial” fazê-lo sobre matéria que será provavelmente decidida TC.

O TC declarou inconstitucionais normas da chamada lei dos metadados que determinam que os fornecedores de serviços telefónicos e de internet devem conservar os dados relativos às comunicações dos clientes — entre os quais origem, destino, data e hora, tipo de equipamento e localização — pelo período de um ano, para eventual utilização em investigação criminal.