Nos primeiros quatro jogos da época, apenas uma vitória e oito golos sofridos (só contra cinco marcados). Nos quatro encontros seguintes, outros tantos triunfos, nenhum golo consentido e 11 na baliza adversária. Entre as muitas mudanças do Sporting depois de um mau arranque, o rendimento defensivo da equipa verde e branca mesmo com duas partidas de Liga dos Campeões pelo meio acabou por ser um espelho da melhoria coletiva nas últimas três semanas, que encontrou com isso expressões individuais em elementos como Ugarte, Morita, Francisco Trincão ou Marcus Edwards. No entanto, e da mesma maneira como fugiu a um potenciar da má fase, Rúben Amorim evitou qualquer tipo de deslumbramento pela fase atual.

“A vitória com o Tottenham num jogo desta dimensão, o segundo jogo da Champions, é uma espécie de confirmar que estamos preparados para estes momentos. Pela diferença de tempo na preparação, estes rapazes foram incríveis. Fico mesmo feliz por todo o clube mas fico mesmo feliz pelos mesmos jogadores. Não há que retirar o foco aquilo que é o futebol. Há três semanas havia uma crise no Sporting e tudo estava errado. O que temos de fazer é gozar esta vitória, o jogo até foi mais cedo e eles até se podem divertir um pouco. As crises estão sempre à porta. Os rapazes estão de parabéns. Deram tudo o que tinham e não são obrigados a mais”, comentara o técnico após o triunfo por 2-0 frente ao conjunto inglês.

“Viemos de uma série comprida de jogos, que termina agora, o que é sempre complicado, mas é melhor trabalhar sob vitórias. Sabemos da dificuldade que vamos encontrar, um adversário com os mesmos pontos e do ambiente que há no Bessa. São intensos sempre e temos de ser sempre humildes, que ainda não fizemos nada e que o normal é nós vencermos jogos. Será muito complicado”, destacara na antecâmara do encontros com os axadrezados, antes de falar também de um possível deslumbramento. “Eles são jovens, o jogo teve impacto. Foi falar com eles, mostrar-lhes a tabela classificativa. Têm de saber gerir e sabem que perdem o lugar na equipa se se distraírem”, acrescentara em relação à atitude esperada em campo.

Se antes tudo o que podia correr mal, corria ainda pior, agora tudo o que era trabalhado para sair bem, saía ainda melhor. A própria postura da equipa e dos jogadores em campo mudou, com muito maior confiança, segurança e capacidade de regressar ao ADN enraizado no Sporting desde a chegada de Rúben Amorim. Se a saída de Matheus Nunes acabou por provocar um visível abalo interno não pela venda em si (no plano financeiro foi inquestionável, ficando como a segunda maior venda de sempre do clube) mas pelo facto de terem saído jogadores importantes no plantel paras segurar o médio, a forma como o técnico foi conseguindo agarrar ainda mais o balneário depois dessa saída confirmou as valências de Amorim como número 1 de um grupo, algo manifestado mais uma vez perante a ausência de jogadores na Seleção.

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“Os selecionadores fazem as suas escolhas, eu as minhas e às vezes as minhas não são muito bem entendidas… Tem muito por onde escolher, há muita qualidade e eu entendo perfeitamente, os jogadores do Sporting têm de trabalhar mais e jogar melhor para ganhar o lugar. Ainda falta um pouco para o Mundial. Os nossos jogadores são jovens e têm de trabalhar bem. Temos muito talento na Academia. Se fosse eu o selecionador leva-os a todos, para mim são perfeitos. O selecionador tem muito por onde escolher. Se não escolheu o Trincão, escolheu o Jota. Se não escolheu o Pote, escolheu o João Félix. É difícil de gerir. Não belisca o meu trabalho, temos conquistado títulos e os jogadores não são de Seleção. Quer dizer que o treinador consegue resultados com jogadores que não são de Seleção. Fico lisonjeado até…”, atirara a esse propósito, ironizando sobre as ausências de jogadores em bom momento.

Até na entrada em campo para aquecimento e no início de jogo era percetível a confiança que a retoma de resultados tinha dado ao Sporting, tendo jogadores bem mais soltos do que no início da época e a perceber melhor o que fazer, quando fazer e como fazer em campo. No entanto, a fronteira até à quase sobranceria é uma linha muito ténue que em alguns momentos do jogo acabou por prejudicar os leões. O Boavista fez um jogo quase perfeito em termos táticos tendo a estrela no momento chave que decidiu o resultado mas os vice-campeões nacionais quase se deram à morte com uma grande penalidade nos últimos minutos que deu a Bruno Lourenço a possibilidade de bisar. Depois de um golo após um cruzamento de letra de Nuno Santos, Ricardo Esgaio entrou para chegar aos 192 minutos disputados no Campeonato ao longo de sete partidas e para voltar a estar ligado a uma derrota que pode deixar o Sporting a 11 pontos do que Benfica apenas à sétima jornada. E, perante isso, não há confiança alguma que possa resistir.

Os sorrisos no início do encontro entre os jogadores do Sporting não enganavam em relação ao momento de confiança que a equipa vive, incluindo o sempre-desligado-não-desligado Marcus Edwards que passou a jogador da moda via Champions depois daquela jogada maradoniana na primeira parte do jogo frente ao Tottenham e que era um dos que estava mais feliz de voltar aos relvados. É certo que, tirando um desvio de Abascal que por pouco não traiu César e entrou na própria baliza (8′), o lance mais vistoso até foi a jogada de Bozenik após ser lançado na profundidade para o remate  à figura de Adán (13′). No entanto, eram os leões que tinham o domínio da partida, que conseguiam abrir a defesa contrária e que chegavam ao último terço com relativa facilidade para lances que podiam não dar oportunidades mas eram perigosos.

Francisco Trincão, num livre direto que desviou ainda na barreira, deixou mais um sinal de perigo fazendo a bola passar perto da trave (17′) antes de ficar perto de encostar para a baliza deserta depois de mais uma jogada pela esquerda com cruzamento para o poste contrário (19′). O golo do Sporting acabaria mesmo por surgir por Pedro Gonçalves, num lance que começou com mais uma subida de Nuno Santos com centro rasteiro para Marcus Edwards intercetado por César antes da recarga do internacional português, mas a jogada foi anulada pelo VAR por fora de jogo do inglês (25′). Tudo na mesma. Ou melhor, resultado na mesma mas um aviso que despertou os axadrezados para uma outra face até ao intervalo.

Com Makouta mais no jogo para fazer a ligação entre setores e Gorré a ter mais bola nas transições que procuravam entrar nas costas de Pedro Porro, o Boavista cresceu no jogo, equilibrou as operações e teve mesmo a oportunidade mais flagrante até ao intervalo, com Bruno Lourenço a surgir de rompante para atirar com estrondo ao ferro (28′). Também por isso, o Sporting passou por um período de reencontro no plano coletivo depois de alguns erros posicionais sem bola antes de ter também a sua bola na trave neste caso por Trincão, a tentar fazer um chapéu num lance confuso que começou num canto (39′). E quando todos já pensavam no intervalo, os axadrezados adiantaram-se no marcador numa grande jogada de Gorré a deixar Coates no chão antes de um grande pontapé de Bruno Lourenço na segunda bola (45+2′).

Sem alterações de nenhum dos treinadores, a segunda parte começou com as características que iriam ser as principais dos últimos 45 minutos. Aliás, bastaram cinco minutos para se perceber ao que cada uma vinha: o Sporting a pressionar mais alto, a explorar sempre os corredores laterais para criar desequilíbrios e a ter duas ameaças iniciais num cruzamento de Nuno Santos ainda desviado com defesa de César para canto (49′) e num remate de Porro para nova intervenção do guarda-redes axadrezado (51′); o Boavista sempre a tentar explorar as transições tendo Gorré como referência na esquerda, como num grande passe de Bruno Lourenço que deu oportunidade ao avançado de rematar com perigo ao lado (54′). O golo do empate surgiria logo após essa ameaça, com Nuno Santos a não conseguir cruzar como queria, a recuar para fazer o centro de letra e Marcus Edwards, de cabeça, a desviar sozinho para o 1-1 (55′).

Voltava tudo ao mesmo com mais de meia hora ainda por jogar e algumas questões físicas já em jogadores como o desgaste que levou Gorré a sair mais cedo e um problema muscular que fez com que Coates fosse direto para o banco a 20 minutos do final. Entre isso, o Boavista perdia capacidade de esticar jogo apesar de ter em campo Salvador Agra e o Sporting ficara sem aquela possibilidade de continuar a mandar na partida no meio-campo contrário, perdendo os espaços que tinha descoberto logo a abrir. Foi aí que Rúben Amorim foi à procura de algo diferente, lançando em campo os heróis da vitória com o Tottenham, Arthur e Paulinho. Foi aí que Ricardo Esgaio, acabado de entrar, cometeu uma grande penalidade desnecessária que permitiu a Bruno Lourenço bisar para o 2-1 (83′). Foi aí que acabou a história do jogo.