Ignazio La Russa, fundador do partido Irmãos de Itália (FDI, sigla em italiano) foi, esta quinta-feira, eleito como novo presidente do Senado do país. Um total de 116 senadores votaram a favor da sua eleição, número suficiente para que fosse eleito para o cargo (o mínimo era 104). No seu discurso de inauguração, o político de 75 anos destacou, citado pela ANSA, que não se “deve ter medo” de alterar a Constituição, um projeto político que une a direita, que quer tornar Itália num regime presidencial, em vez de parlamentar.

Citada pela ANSA, Giorgia Meloni, a líder do FDI, congratulou Ignazio La Russa, estando “orgulhosa” pelos senadores terem “eleito um patriota, alguém que serve o Estado, um homem apaixonado por Itália e que sempre colocou o interesse nacional acima de qualquer coisa”. “Para os Irmãos de Itália, é um ponto de referência insubstituível, um amigo, um irmão e um exemplo para as gerações de militares e diretores.”

A eleição de Ignazio La Russa, que foi ex-ministro da Defesa de Silvio Berlusconi, colocou a nu, contudo, os primeiros desentendimentos entre os parceiros de coligação de direita. O ex-primeiro-ministro de Itália, que desejava ocupar o cargo mais elevado entre os senadores, chegou a envolver-se num bate-boca com o novo presidente do Senado.

“Vai levar no c*”, disse Silvio Berlusconi a Ignazio La Russa, depois de uma acesa troca de palavras entre os dois. Ainda assim, depois da votação, o ex-primeiro-ministro revelou estar “feliz” com a eleição do novo presidente do Senado.

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As polémicas de Ignazio La Russa

Ignazio La Russa começou o percurso político na ala jovem do Movimento Social Italiano, um partido com cariz neofascista e que foi formado, entre outros, por apoiantes de Benito Mussolini. Inicialmente, ocupou cargos regionais na região de Milão. Ao longo dos anos, foi crescendo até chegar à Câmara dos Deputados e depois ao Senado.

Em 2008, quando já estava noutro partido — o Povo da Liberdade —, Ignazio La Russa é escolhido por Silvio Berlusconi para o cargo de ministro da Defesa. Em 2011, sai do governo e, um ano depois, funda os Irmãos de Itália, juntamente com Giorgia Meloni.

Levou dez anos para a consolidação do projeto político, mas agora Ignazio La Russa chega ao cargo mais importante do Senado italiano. Pelo meio, foi protagonista de várias polémicas. Uma delas aconteceu há quatro anos, quando o novo presidente da câmara alta do parlamento italiano mostrou a sua casa, revelando que tem uma estátua e medalhas com a cara de Benito Mussolini, assim como posters neocoloniais.

Um ano antes, na Câmara dos Deputados, Ignazio La Russa fez, em jeito de protesto, a saudação romana, um gesto ligado ao fascismo. A antiga presidente da câmara baixa do parlamento, Laura Boldrini, deixou um forte aviso na altura: “Tenha cuidado quando levanta a mão. Lembra aquele monstro, Benito Mussolini. Pode ser condenado a dois anos de prisão”.

Na primeira fase da pandemia de Covid-19, Ignazio La Russa inflamou as redes sociais com uma sugestão do mesmo género. Por motivos sanitários, o agora presidente do Senado italiano aconselhou a que se substituísse o cumprimento de mão por uma saudação romana. “Não aperte a mão de ninguém, a infeção é letal. Use a saudação romana, é antivírus e é antimicrobiano”, recomendou. A publicação foi depois apagada.

Durante a campanha para estas eleições, o agora presidente do Senado foi criticado por umas declarações durante um debate, tendo afirmado que todos os italianos eram “herdeiros do Duce, no sentido de que somos herdeiros dos nossos pais e avós”.

Sobrevivente do Holocausto abre Senado

Durante a sessão solene da abertura do Senado, o destaque foi para a senadora vitalícia, Liliana Segre, uma sobrevivente do campo de concentração de Auschwitz. “Particularmente emocionada”, a política de 92 anos lembrou, no seu discurso, a Marcha sobre Roma, que levou Benito Mussolini ao poder “que deu início à ditadura fascista”.

Frisando o “valor simbólico” do momento, Liliana Segre traçou um paralelismo com o início de um novo mandato para os senadores. “Nos meus tempos, as aulas começavam em outubro. E é impossível não ter uma espécie de vertigem ao lembrar que essa mesma menina, num dia de 1938, desolada e perdida, foi obrigada por leis racistas a deixar vazio o seu banco na escola. Agora, por um estranho destino, ocupo uma posição no lugar mais prestigiado do Senado.”

Aplaudida por todos os presentes, Liliana Segre defendeu também a Constituição, que “deixa o país mais justo e mais feliz”. Apontando para o artigo 3.º — que incide sobre o fim das discriminações sexuais, raciais, religiosas e políticas —, a senadora vitalícia disse que era uma “missão perpétua” para a República Italiana. “Isso não é poesia, nem utopia. É a estrela polar que nos deve guiar a todos, mesmo com programas diferentes.”

Liliana Segre sublinhou que a “maioria decidiu” e que é essa “a essência da democracia”. Mas também frisou que “a minoria tem a obrigação fundamental de estar na oposição”, apelando a um debate civilizado e pediu que não se transforme em discurso de ódio.