Um novo relatório militar dos serviços de inteligência ucranianos revela informações detalhadas sobre as capacidades do grupo Wagner, organização mercenária comandada pelo oligarca Yevgeny Prigozhin cuja ação tem sido decisiva nos recentes avanços militares russos na Ucrânia. O documento, datado de dezembro de 2022, explica que a maior ameaça do grupo assenta na sua eficácia em situações de combate em proximidade e, segundo o documento, na disponibilidade para suster baixas significativas.

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“As morte de milhares de soldados Wagner não interessam à sociedade russa. As unidades de assalto não batem em retirada sem ordens superiores (…) a retirada não autorizada de uma equipa, a menos que estejam feridos, é punida com execução sumária imediata”, diz o relatório, citado pela CNN Internacional.

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No caso dos militares feridos, estes são por vezes deixados no campo de batalha durante horas. “As unidades de infantaria estão proibidas de carregar os feridos para fora de perigo, já que a sua principal tarefa é a de continuar o ataque até que o objetivo seja alcançado. Em caso de falhanço, a retirada só é permitida durante a noite”.

A resiliência do grupo Wagner no terreno tem sido um dos maiores trunfos de Prigozhin na sua guerra interna com o establishment do Kremlin — em particular com a ação do Ministério da Defesa que tem criticado em várias ocasiões.

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As táticas brutais da organização parecem estar a colher frutos, com o relatório ucraniano a considerar mesmo que são “as únicas que têm sido eficazes para os mobilizados russos com pouco treino que compreendem a maior parte das forças no terreno”. Com efeito, sugere-se mesmo que o Kremlin pode estar a adaptar as unidades móveis e ágeis dos Wagner ao seu próprio exército, o que, a confirmar-se, representaria uma mudança significativa na tradicional estratégia russa de utilizar batalhões mais lentos e mecanizados.

A predominância do grupo Wagner não tem passado despercebida aos próprios soldados no terreno. Uma comunicação intercetada pelo lado ucraniano revela o contraste aos olhos dos russos: “É como da noite para o dia. Se vou lutar, mais vale lutar com eles”.

De acordo com o relatório, as unidades móveis do grupo mercenário são munidas de informações recolhidas por drone para atacar. Com menos de 12 elementos, recorrem sobretudo a RPGs (lança-granadas) para causar estragos. O grupo utiliza também equipamento de comunicação construído pela Motorola — isto apesar de a empresa norte-americana ter confirmado que suspendeu a sua atividade na Rússia.

A primeira linha de ataque é maioritariamente composta por reclusos condenados, recrutados para o terreno. É esta primeira linha que sustem as maiores perdas (até 80%, de acordo com oficiais ucranianos). A segunda linha é normalmente composta por combatentes mais experientes, equipados com aparelhos de visão térmica ou noturna.

Quando conquistam uma posição, os mercenários procuram mantê-la com recurso a artilharia de apoio e a pequenas trincheiras individuais que escavam no solo.

As ações do grupo Wagner têm sido preponderantes no teatro de guerra ucraniano e é o próprio Yevgeny Prigozhin quem tem reclamado os louros de conquistas recentes como, por exemplo, a de Soledar. “Nenhuma outra unidade além do grupo Wagner esteve envolvido no assalto a Soledar”, referiu o chefe dos mercenários.

As características de Prigozhin, que tem vindo a ganhar preponderância na cúpula de poder do Kremlin, já lhe valeram comparações a figuras históricas como Rasputin. Recentemente, deixou clara a ideologia que rege o grupo mercenário: “Infelizmente, não estanco o sangue — sangro os inimigos da pátria”.