A defesa do antigo padre madeirense José Anastácio Alves já entregou ao tribunal do Funchal um requerimento a pedir que este seja notificado da acusação de cinco crimes de abuso sexual de uma criança na comarca onde agora se encontra a residir. Anastácio Alves vive há cerca de um ano em Portugal continental e estará agora na zona de Lisboa, depois de na última quinta-feira ter tentado ser formalmente constituído arguido e notificado da acusação, contra ele deduzida em março de 2022, na Procuradoria-Geral da República, em Lisboa, como o Observador noticiou em exclusivo.

O padre madeirense entregou uma carta à diocese do Funchal em 2019 a pedir para ser dispensado do sacerdócio, um ano depois de ter desaparecido da paróquia francesa onde fora colocado e informado de que havia uma queixa de abuso sexual de menor contra ele e que teria que ser afastado de funções. Antes de ter sido colocado no estrangeiro, o padre já tinha sido alvo de dois inquéritos semelhantes abertos no Ministério Público, por suspeitas de abusos de duas vítimas diferentes, que foram arquivados.

Padre Anastácio confessa abuso sexual de menores, tenta entregar-se à PGR, mas não consegue

PUB • CONTINUE A LER A SEGUIR

Sem conseguir localizar o suspeito dos crimes, e sem nunca emitir qualquer mandado de detenção, o Ministério Público do Funchal acabaria por constituir arguido à revelia Anastácio Alves e acusá-lo de cinco crimes. No despacho de acusação, apesar de reconhecer a gravidade dos crimes e defender uma condenação, o Ministério Público determinava que ao ser localizado fosse formalmente constituído arguido e sujeito a termo de identidade e residência, a medida de coação menos grave.

O advogado Miguel Santos Pereira e o seu consultor forense, João Sousa – um antigo PJ ligado ao caso da Rosa Grilo, que está a ser investigado por manipulação de provas e que já apresentou queixa contra a própria PJ a alegar que foram eles, investigadores, que as forjaram –, terão sido contactados pela família do antigo padre para este ato concreto: a entrega de Anastácio Alves à Justiça. Esta entrega, porém, não passa por uma detenção, uma vez que o Ministério Público nunca emitiu qualquer mandado de detenção nacional ou internacional, determinando apenas que, ao ser localizado José Anastácio Alves, este fosse formalmente constituído arguido, e consequentemente aplicado o termo de identidade e residência, e que fosse notificado do despacho de acusação de que foi alvo. A ideia era ter uma morada do arguido, desaparecido há quase cinco anos.

Abusos na Igreja. Os cinco erros da Justiça no caso do padre que se tentou entregar

Foi isso que a equipa de defesa tentou fazer na Procuradoria-Geral da República — uma decisão que dividiu opiniões: podia ou não fazê-lo ali? A própria PGR começou por enviar o arguido para um outro departamento a 500 metros daquele local. Impedido de o fazer ali, uma vez que a procuradora se declarou incompetente e disse que Anastácio Alves só poderia ser notificado em França, o arguido voltou à PGR. Depois de vários telefonemas para os serviços, a resposta já foi outra: teria que se deslocar ao Funchal. Uma resposta criticada por muitos, que consideram que a PGR podia ter agilizado o ato e ter contactado o tribunal do Funchal, correndo assim o risco de o arguido voltar a desaparecer. E apoiada por outros, que consideram que o ato teria que ser feito no Tribunal do Funchal, onde corre o processo.

“Neste momento estamos, mais uma vez, a observar o espírito e a letra da Lei, continuando o Padre Alves disponível, conforme declarou ao Observador, para assumir as suas responsabilidades e auxiliar a Justiça”, disse ao Observador João de Sousa.